Folha de S. Paulo
Abrir mão do petróleo e outras medidas para
inglês ver não resolvem nossos problemas
Luiz Inácio Lula da Silva discursa na
Assembleia Geral da ONU, na terça-feira (24). Deve falar de clima e cobrar as
responsabilidades dos países ricos pelo desastre.
Está certo. Em outras falações diplomáticas
em Nova York, vai se ouvir também a conversa sobre o lugar do Brasil nas
relações internacionais. Por exemplo: o país quer ser um líder do clima ou
explorar mais petróleo?
Essa conversa mole é frequente também no
Brasil, até porque neste ano ou em 2025 se deve tomar decisão a respeito da
exploração de petróleo no mar ao norte do país. Também se vai discutir
a tal Autoridade Climática, que pode vir a ser apenas uma repartição
inócua.
Em um país razoável, estaríamos discutindo como frear de modo radical o desmatamento —não vai acontecer, em parte porque o Congresso é dominado por broncos e negocistas.
O que significa "Brasil líder mundial no
ambiente", se é possível dizer algo de objetivo sobre essa posição de
ponta? Um país líder influencia, guia, propõe soluções para problemas
coletivos, com seguidores e apoiadores práticos de tais ideias. País com poder
obtém resultados por coerção, aberta ou latente.
É difícil entender como largar mão de
petróleo levaria o Brasil a uma posição efetiva e benéfica de
"líder". De resto, uma decisão unilateral teria efeito escasso no
planeta.
O Brasil produz pouco mais de
4% do total mundial de óleo e gás. Se a produção mundial ficasse
estagnada, chegaria a 6% em 2030. A partir de então, a produção brasileira
absoluta tende a cair, caso não se fure mais poço.
Enquanto houver demanda, haverá oferta, de
americanos (16% da produção mundial), sauditas e russos (11% cada) ou
canadenses (6%). O milhão extra de barris que o Brasil deixasse de oferecer a
partir de 2030 seria suprido talvez pela Argentina. Para sair do brejo,
os hermanos
precisam do petróleo de Vaca Muerta.
Países ricos vão abrir mão de sua produção
para que os pobres ofertem o resto de uma demanda de petróleo hipoteticamente
cadente? Hum. Aliás, o consumo vai cair? Perguntem aos americanos, devoradores
de energia.
Pode ser que o Brasil deva abrir mão de
petróleo por outros motivos, se bem calculados. Mas "liderança" é
ingenuidade, dado o padrão mundial de produção e consumo de energia que
persistirá por muitos anos e dada a incapacidade de o país influenciar até a
política da América do Sul. Da Venezuela ao Chile, nos ignoram de um modo ou
outro.
Por falar em poder, a União Europeia vai
impor sanções ambientais a exportações brasileiras de certos produtos.
Sem petróleo, as contas do governo estariam
em situação mais crítica e o país estaria crescendo menos. Não temos planos e
cálculos de como atenuar nossos problemas fiscais e econômicos abrindo mão do
petróleo. Podemos até dispor de alternativas. Mas não sabemos.
Pelos dados do Observatório do Clima, 48% das
emissões de gases de efeito estufa no país vêm do que se chama, grosso modo,
de desmatamento;
26,5%, da agropecuária.
O Brasil pode atenuar seus problemas e ganhar
medalha de honra ao mérito ambiental se der cabo do desmatamento e aumentar a
eficiência ecológica da agropecuária. Se vai virar "líder global",
quase tanto faz. É interesse nacional elementar. Se não evitarmos o colapso
da Amazônia e
a devastação final do Cerrado, ficaremos também sem água e energia elétrica.
A gente precisa acordar.
4 comentários:
" O Brasil pode atenuar seus problemas e ganhar medalha de honra ao mérito ambiental se der cabo do desmatamento e aumentar a eficiência ecológica da agropecuária. Se vai virar "líder global", quase tanto faz. É interesse nacional elementar. Se não evitarmos o colapso da Amazônia e a devastação final do Cerrado, ficaremos também sem água e energia elétrica. "
Perfeito !
( Outro dia, disse que parte da nossa elite é xucra. O colunista a chama de " broncos ".
Lembrei-me do Denver Broncos, da NFL, cujo símbolo, salvo engano, é um cavalo, bronco, portanto, xucro.
Tudo a ver.
😏😏😏 )
O congresso é dominado pela frente parlamentar do agronegócio! Entre 2/3 e mais da metade de cada casa (Senado e Câmara federal) são políticos da frente agropecuária.
Nossa elite econômica é xucra,bronca e tosca.Nem sei se existe o adjetivo feminino ''bronca'',rs.
Nossa elite política também é bronca.
Postar um comentário