Folha de S. Paulo
Incorporação da fé é uma transformação
peculiar desse estilo que domina a direita
"Um espectro assombra a política
partidária contemporânea." Era 1996, e o cientista político Andreas Schedler dissecava um fenômeno:
os candidatos e partidos anti-establishment.
Ao longo de três décadas, eles se tornaram protagonistas da vida política de
vários países. Sofreram mutações e provaram que não devem desaparecer tão cedo.
O DNA da espécie é inconfundível. A principal característica é sua maneira peculiar de manifestar oposição às elites políticas. Candidatos anti-establishment tratam essa classe como um cartel exclusivista que tem como interesse a manutenção do poder. Quando ela governa, não têm desejo ou capacidade de atender às necessidades dos cidadãos.
Políticos anti-establishment representam uma
negação agressiva desse estilo. Assumem a imagem de forasteiros e vendem a
ideia de que são as únicas alternativas genuínas, tentando convencer o eleitor
de que não há diferença real entre governistas e oposicionistas. A alternância
de poder seria irrelevante sem uma ruptura liderada por esse campo.
A linhagem anti-establishment passa por
transformações, com nuances
particulares em cada país, incluindo o Brasil. A mais consolidada é
a digitalização que permitiu que esses personagens furassem bolhas do diálogo
político e manipulassem a ideia de uma conexão direta com o eleitor, driblando
o controle daquelas elites.
Uma segunda mudança está relacionada à
ocupação de espaços na direita. Há quase 30 anos, Schedler dizia que, após a
queda do socialismo, a política anti-establishment começava a se cristalizar
como a nova ideologia desse campo. O processo avançou e chegou a seu auge em
lugares como EUA, Brasil, Argentina e diversos países da Europa onde esses
grupos se tornaram dominantes na direita.
Uma terceira transformação aparece de maneira
acentuada no Brasil. Na origem, a turma anti-establishment até assumia um viés
conservador, mas não chegava a oferecer soluções religiosas para os problemas
típicos do mundo político. Agora, aqui e ali, a fé se tornou um fator
determinante para esses candidatos, que se apresentem como agentes de mudança a
partir de uma intervenção quase milagrosa.
Um comentário:
Sei.
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