domingo, 22 de setembro de 2024

Manoel Galdino - Os atalhos cognitivos do eleitorado

Folha de S. Paulo

Em tese, ao eleitor cabe analisar propostas e agregar múltiplas dimensões, como biografia do candidato e cenários futuros

processo de escolha do voto é cognitivamente exigente. Em tese, ao eleitor cabe analisar cada proposta, ponderá-las, prever seus impactos e agregar entre múltiplas dimensões, como biografia do candidato e cenários futuros. A solução para nossas limitações cognitivas é a utilização de uma série de "atalhos" para tomada de decisões.

O apelo de Pablo Marçal (PRTB) junto à parcela do eleitorado, que causou surpresa inicial devido a sua inexperiência política e inconsistência de propostas, precisa ser entendido sob esse prisma.

Um atalho comum é a comparação com uma figura conhecida. Para eleitores de extrema direita, Bolsonaro (PL) seria o padrão-ouro. Na comparação direta com Bolsonaro, se Marçal for percebido como igualmente autêntico e mais competente que o ex-presidente, pode ser preferido ao rival Ricardo Nunes (MDB) —visto apenas como mais competente.

Outro atalho útil é substituir questões complexas —como avaliação de propostas— por outras mais simples, próximas do problema. A repetição de que Marçal é um excelente comunicador nas redes sociais, e que ganhou muito dinheiro sendo um "self-made man", pode levar à conclusão de que suas propostas devem ser boas. Afinal, quem fez tudo isso deve ter boas propostas. Por outro lado, o incidente da cadeirada pode criar rachaduras nessa imagem de infalibilidade.

Um terceiro atalho previsível é a negligência da fonte comum. Tendemos a tratar conteúdos da mesma origem como independentes, superestimando sua credibilidade. Os "cortes" (vídeos curtos) divulgados pelos seguidores de Marçal e recompensados financeiramente por ele produzem esse efeito, distorcendo a percepção sobre o candidato. Ele tende a parecer mais apreciado, e sob luz mais favorável, do que de fato o é.

Se imprensa, candidatos e formadores de opinião não entenderem as heurísticas empregadas pelo eleitorado, que nem sempre são processos conscientes, não informaremos o eleitor adequadamente para que este tome as melhores decisões. Um equívoco que já fizemos no passado.

 

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