Folha de S. Paulo
Livro compõe um retrato do país buscando
entender argumentos dos dois lados do espectro ideológico
"Brasil Acima da Lucidez", de Fabiano Lana, é um livro interessante e oportuno, considerando que nos encaminhamos para mais uma eleição presidencial polarizada em 2026. Não é que a obra de Lana resolverá o problema, mas sua leitura pode ajudar aqueles que lamentam essa situação a entender melhor o que está acontecendo e quem sabe mudar suas atitudes para ao menos não piorar o clima de intolerância.
Lana, colunista de "O Estado de S.
Paulo", é um autor que muitos classificariam como "isentão". Sei que o termo foi cunhado
com propósitos pejorativos, mas o vejo de forma bastante
positiva. O "isentão", afinal, é o sujeito que aceita a ideia liberal
de que as pessoas variam enormemente em gostos, visões de mundo e até
apreciações morais e se esforça para entender posições que não se coadunem com
as suas. Não há em princípio um conjunto de preferências que seja superior aos
demais.
Especialmente em jornalismo precisamos
de "isentões". Não porque a objetividade e a imparcialidade sejam
metas humanamente factíveis, mas porque o repórter que se preocupa em buscar o
equilíbrio e considera perspectivas diferentes da sua provavelmente fará um
trabalho melhor que aquele que veste o chapéu do militante e já têm todas as
conclusões prontas antes mesmo de começar a apuração.
"Brasil Acima da Lucidez" é um
livro em camadas. São 28 ensaios independentes, mas que formam um todo. Lana
discute questões filosóficas como as que eu tangenciei, mas sem deixar de
abordar também temas concretos, como religião, racismo, música e até a
ginástica mental feita por petistas e bolsonaristas para tentar conciliar suas
preferências ideológicas com o reino dos fatos.
Um dos corolários da obra é que precisamos
revisitar o princípio da caridade, segundo o qual devemos entender —e
eventualmente até melhorar— os argumentos de nossos oponentes. Sem esse esforço
de não demonizar de cara o adversário, diálogos produtivos ficam, se não
interditados, ao menos muito difíceis —e a polarização irá se perpetuando.
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