domingo, 29 de junho de 2025

Fragilidade no contra-ataque - Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Indo ao Supremo, governo pode até ganhar na Justiça, mas perderá de novo na política

No cardápio de providências cogitadas para reagir à pesada ofensiva do Congresso, o governo inscreve soluções gastas para dar conta de um problema relativamente novo. Na mais contundente delas, recorre ao Supremo Tribunal Federal. Pode até ganhar na Justiça, mas perderá de novo na política.

A escalada de derrotas só não é inteiramente inédita na cena da política brasileira porque, em termos de erosão do capital de influência no Parlamento, já vimos algo parecido nos estertores dos governos Fernando Collor e Dilma Rousseff.

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda não tinha convivido com um grau tão agressivo de confronto, embora adotasse o método quando na oposição. Em seus dois períodos anteriores na Presidência sofrera apenas um revés de monta ao não conseguir a reedição do imposto (olha ele aí) do cheque, a CPMF.

Do restante dos obstáculos —sendo o mais grave o escândalo do mensalão— pôde se safar com habilidade e a ajuda de um centrão também enredado nas denúncias, de uma oposição frágil e de um Legislativo referido só no fisiologismo.

Aquele mundo não existe mais, mas o presidente ainda parece viver nele. Outro dia mesmo, numa cerimônia oficial para defender o ministro Fernando Haddad (PT), lançava ataques ao FMI, um inimigo do passado.

Agora Lula vem de tentar reeditar o dístico "nós contra eles", marco inaugural da divisão radicalizada do país. Antes punha de um lado os apoiadores do governo e do outro os críticos. Na versão revisada, são os ricos para lá e os pobres para cá. Aos nem tão pobres nem tão ricos, pelo jeito reservam-se as batatas.

Pois é justamente esse meio de campo que o presidente precisa atrair para, antes de pensar em ganhar a eleição, subir muitos degraus na escala daquilo que os cidadãos consideram um bom governo.

Essa possibilidade ele interdita na opção preferencial por um estrato da população, excluindo os demais que lhe garantiram em 2022 o poder conquistado sob a promessa de amplitude e união.

Nenhum comentário: