Suely Caldas
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
A recente edição da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) apresenta um dado aparentemente contraditório: enquanto o trabalho com carteira assinada e a renda salarial crescem, cai o número de trabalhadores sindicalizados. Veja, leitor, o que aconteceu entre 2006 e 2007: 1) O emprego com carteira assinada cresceu 6,1% e o rendimento salarial, 3,2%; e 2) os sindicatos perderam 555 mil trabalhadores filiados, o que fez a taxa de sindicalização cair de 18,6% para 17,7% da população ocupada. A lógica seria a filiação sindical acompanhar a expansão do emprego formal. Mas os trabalhadores não seguem a lógica. Por que será?
O especialista em economia do trabalho José Márcio Camargo atribui isso a um certo desencanto dos trabalhadores com seus sindicatos, descrédito na forma de representá-los e enfrentar novos desafios da modernização dos meios de trabalho. A luta sindical moderna exige preparo das lideranças para diversificar o foco, ir além do tradicional aumento salarial. Mas a prática continua presa ao modelo das décadas de 70/80, quando o sindicalismo desafiou a ditadura militar e viveu seu auge nas famosas greves do ABC paulista lideradas por Luiz Inácio Lula da Silva.
“Hoje, só 10% dos trabalhadores estão sob a proteção dos sindicatos; os 90% restantes são lei de mercado. Desviar a luta sindical para outras reivindicações dá trabalho e os sindicatos não estão dispostos ou não sabem fazê-lo”, analisa Camargo.
Outro dado da Pnad confirma o que diz o especialista. O recente crescimento do emprego tem amortecido as tensões e propiciado entendimento na relação capital x trabalho. Tanto que 80% das categorias profissionais fecharam acordos com ganhos salariais acima da inflação. São os 90% mencionados por Camargo com reajustes de salários regidos pelo mercado, em que empregados e empregadores se acertam sem interferência dos sindicatos, que só comparecem depois, para formalizar legalmente o acordo.
Há quem considere essa situação transitória, fruto de uma conjuntura de crescimento do emprego e ganhos salariais, que leva os trabalhadores a dispensarem os sindicatos em defesa de seus interesses. Tão logo mude a realidade e aumentos salariais só sejam conquistados com enfrentamento político, eles voltariam a se filiar.
Essa avaliação pode até ser válida para as grandes indústrias, mas desconsidera mudanças estruturais ocorridas no mercado de trabalho: na década de 90 a introdução da automação enfraqueceu o emprego nas grandes indústrias e o fortaleceu no setor de serviços (informática, bancos, telecomunicações, etc.). E é nesse setor, sem tradição de luta e com desempenho sindical extremamente tímido e por vezes ausente, que acontece um fenômeno que precisa ser mais bem pesquisado: o desinteresse dos jovens que ingressam no mercado de trabalho pelos sindicatos e a descrença de que suas lideranças saberão mapear e conduzir seus problemas e carências. É o que Camargo chama de novo desafio para as lideranças sindicais de ampliarem seu foco de atuação além da reivindicação salarial.
Há ainda outras razões que explicam o enfraquecimento dos sindicatos captado pela Pnad. Arrefeceu o estilo aguerrido do ABC paulista, que contaminou o movimento sindical nos anos 70/80. Foi substituído por lideranças acomodadas, que se fecham nas suas sedes, discutindo como obter verbas do Ministério do Trabalho e do imposto sindical, e que descuidam da relação direta com seus representados. Esse fenômeno piorou nos últimos anos em razão da liderança política do presidente Lula, que deixou dirigentes sindicais confusos, tontos, preocupados em ocupar cargos no governo e agir com moderação para não atrapalhar o amigo presidente.
As reformas sindical e trabalhista, defendidas com tanto fervor nos tempos do Lula metalúrgico, foram enterradas; o governo delas desistiu. A sindical andou só um pouquinho, mas em marcha à ré, contra o que o ABC paulista pregava em 70/80. E, pior, com aprovação entusiasmada do ex-líder, hoje presidente. Trata-se do rateio do dinheiro do imposto sindical entre seis centrais sindicais. Aliás, eram três e multiplicaram-se depois que o presidente amigo acenou com a idéia de receberem dinheiro público. Agora querem criar a “contribuição negocial”, que o trabalhador vai pagar sem ser consultado.
Muito diferente dos tempos em que Lula gritava em assembléias em São Bernardo que o imposto sindical só produzia sindicalistas pelegos.
*Suely Caldas, jornalista, é professora da PUC-RJ
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
A recente edição da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) apresenta um dado aparentemente contraditório: enquanto o trabalho com carteira assinada e a renda salarial crescem, cai o número de trabalhadores sindicalizados. Veja, leitor, o que aconteceu entre 2006 e 2007: 1) O emprego com carteira assinada cresceu 6,1% e o rendimento salarial, 3,2%; e 2) os sindicatos perderam 555 mil trabalhadores filiados, o que fez a taxa de sindicalização cair de 18,6% para 17,7% da população ocupada. A lógica seria a filiação sindical acompanhar a expansão do emprego formal. Mas os trabalhadores não seguem a lógica. Por que será?
O especialista em economia do trabalho José Márcio Camargo atribui isso a um certo desencanto dos trabalhadores com seus sindicatos, descrédito na forma de representá-los e enfrentar novos desafios da modernização dos meios de trabalho. A luta sindical moderna exige preparo das lideranças para diversificar o foco, ir além do tradicional aumento salarial. Mas a prática continua presa ao modelo das décadas de 70/80, quando o sindicalismo desafiou a ditadura militar e viveu seu auge nas famosas greves do ABC paulista lideradas por Luiz Inácio Lula da Silva.
“Hoje, só 10% dos trabalhadores estão sob a proteção dos sindicatos; os 90% restantes são lei de mercado. Desviar a luta sindical para outras reivindicações dá trabalho e os sindicatos não estão dispostos ou não sabem fazê-lo”, analisa Camargo.
Outro dado da Pnad confirma o que diz o especialista. O recente crescimento do emprego tem amortecido as tensões e propiciado entendimento na relação capital x trabalho. Tanto que 80% das categorias profissionais fecharam acordos com ganhos salariais acima da inflação. São os 90% mencionados por Camargo com reajustes de salários regidos pelo mercado, em que empregados e empregadores se acertam sem interferência dos sindicatos, que só comparecem depois, para formalizar legalmente o acordo.
Há quem considere essa situação transitória, fruto de uma conjuntura de crescimento do emprego e ganhos salariais, que leva os trabalhadores a dispensarem os sindicatos em defesa de seus interesses. Tão logo mude a realidade e aumentos salariais só sejam conquistados com enfrentamento político, eles voltariam a se filiar.
Essa avaliação pode até ser válida para as grandes indústrias, mas desconsidera mudanças estruturais ocorridas no mercado de trabalho: na década de 90 a introdução da automação enfraqueceu o emprego nas grandes indústrias e o fortaleceu no setor de serviços (informática, bancos, telecomunicações, etc.). E é nesse setor, sem tradição de luta e com desempenho sindical extremamente tímido e por vezes ausente, que acontece um fenômeno que precisa ser mais bem pesquisado: o desinteresse dos jovens que ingressam no mercado de trabalho pelos sindicatos e a descrença de que suas lideranças saberão mapear e conduzir seus problemas e carências. É o que Camargo chama de novo desafio para as lideranças sindicais de ampliarem seu foco de atuação além da reivindicação salarial.
Há ainda outras razões que explicam o enfraquecimento dos sindicatos captado pela Pnad. Arrefeceu o estilo aguerrido do ABC paulista, que contaminou o movimento sindical nos anos 70/80. Foi substituído por lideranças acomodadas, que se fecham nas suas sedes, discutindo como obter verbas do Ministério do Trabalho e do imposto sindical, e que descuidam da relação direta com seus representados. Esse fenômeno piorou nos últimos anos em razão da liderança política do presidente Lula, que deixou dirigentes sindicais confusos, tontos, preocupados em ocupar cargos no governo e agir com moderação para não atrapalhar o amigo presidente.
As reformas sindical e trabalhista, defendidas com tanto fervor nos tempos do Lula metalúrgico, foram enterradas; o governo delas desistiu. A sindical andou só um pouquinho, mas em marcha à ré, contra o que o ABC paulista pregava em 70/80. E, pior, com aprovação entusiasmada do ex-líder, hoje presidente. Trata-se do rateio do dinheiro do imposto sindical entre seis centrais sindicais. Aliás, eram três e multiplicaram-se depois que o presidente amigo acenou com a idéia de receberem dinheiro público. Agora querem criar a “contribuição negocial”, que o trabalhador vai pagar sem ser consultado.
Muito diferente dos tempos em que Lula gritava em assembléias em São Bernardo que o imposto sindical só produzia sindicalistas pelegos.
*Suely Caldas, jornalista, é professora da PUC-RJ
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