Os parasitas do Estado brasileiro já têm programa para o Sete de Setembro: ligar a TV, acender um charuto e se divertir com as passeatas contra a corrupção.
Corruptos e parasitas adoram as ondas de indignação contra "tudo isso que aí está". Sabem que tudo é igual a nada. E que suas negociatas estarão protegidas na vala comum da "roubalheira", dos "malfeitos" e demais brados genéricos da cidadania ultrajada. A turma que fez a farra no Dnit talvez até desfile também contra a corrupção. Por que não? Estão soltos, esquecidos, sem nada para fazer. E farra é com eles mesmos.
Essa Frente Contra a Corrupção é uma pérola dos "bastas" brasileiros. Nasceu como um "movimento suprapartidário" de apoio à "faxina da presidente Dilma", no exato momento em que a presidente Dilma gritou seu basta contra a faxina. Preocupada com o número crescente de companheiros desalojados, a gerente da limpeza declarou: "A verdadeira faxina é contra a miséria." Ponto final. Uma guinada que certamente comoveu as máfias do turismo, da agricultura e dos transportes, plenas de espírito solidário.
Ficou então combinado assim: enquanto Dilma refresca a vida dos fisiológicos, os éticos apoiam Dilma contra o fisiologismo.
Mas, por favor, nada de escândalos. A presidente já deixou claro: "Não serei pautada pela mídia!" Ou seja: essas manchetes escandalosas sobre superfaturamento em série de obras viárias, convênios piratas para o turismo milionário do Amapá, favorecimento a empresas de agronegócios, caronas de ministros em jatinhos de empresários - esse barulho todo, enfim, não guiará o governo.
Pelo visto, nem a Frente Contra a Corrupção. Os senadores que a criaram deixaram escapar a CPI do Dnit, preferindo um movimento "liderado pela sociedade civil". É isso aí. Nada de detalhismo. Melhor convidar os indignados para gritar contra tudo, contra a impunidade, contra a podridão. De preferência de branco, num domingo de sol à beira-mar.
Enquanto os cidadãos de bem se orgulham de si apoiando a faxina, as manchetes escandalosas esfriam e a vida continua. Dilma, a nova esperança do Brasil ético, segue regendo seus cavaleiros do povo. E eles estão mais ativos do que nunca. O mensaleiro João Paulo Cunha, por exemplo, colocado pela gerente da limpeza na presidência da comissão mais importante da Câmara, ganhou mais uma: ajudou a inocentar a deputada Jaqueline Roriz, perseguida só porque foi filmada embolsando uma propina de 50 mil reais.
Mentor e conselheiro da líder da faxina, Lula voa cada vez mais alto. Agora, em aviões de empreiteiras que o convidam para palestras, enquanto ele as ajuda a fechar negócios em países vizinhos. Já José Dirceu, o companheiro de armas e fiador de Dilma no PT, abre as portas do governo para seus clientes privados. É a notável vocação para a consultoria, formal ou informal, que também fez a fama de Palocci e Erenice - ambos diretamente ligados à presidente. Com tantos consultores à sua volta, todos doutores em parasitismo estatal, Dilma haverá de saber como limpar o Brasil.
O senador Aécio Neves, um dos líderes da oposição, fez um gesto cívico. Propôs um pacto contra a ala fisiológica do Congresso, para permitir que Dilma realize seus projetos relevantes para o país. O tucano ficou bem na foto, mas deixou uma dúvida no ar: que projetos relevantes são esses? Que plano, que reforma, que medida importante para o país o atual governo tem na manga, que não contou para ninguém? Pelo visto, Aécio vai aderir às passeatas pró-Dilma no mundo da Lua.
Aqui na Terra, o grande projeto da sucessora de Lula está em plena marcha, sem obstrução. Trata-se de manter e ampliar a ocupação feroz da máquina pública pelos amigos dos amigos, liberados para fazer política e negócios nos balcões espalhados por quatro dezenas de ministérios. É dessa ordenha geral que brotam as tais manchetes escandalosas - que forçaram Dilma a apresentar-se como uma combatente surrealista de si mesma.
A sangria não é abstrata, está nos números: aumento brutal de quase 5% dos gastos públicos em relação a 2010, que por sua vez já foi ano de gastança eleitoral. Mas fisiologismo populista inflacionário é um palavrão que não soa bem em passeata. E o basta inútil contra tudo engole todos os sapos: o da CPI natimorta do Dnit; o do julgamento congelado do mensalão; o da evaporação dos processos contra Palocci e Erenice; o da fabricação de superávits e, agora, da taxa de juros; o da prostituição do BNDES para bancar a orgia da Copa de 2014; e grande elenco do brejo.
Qualquer um desses casos, se merecesse a devida mobilização da opinião pública, seria suficiente para puxar o fio da corrupção. Mas o basta genérico desfoca todos eles. E ainda dá moral à gerente da limpeza para reforçar o caixa da festa, com a inacreditável ressurreição da CPMF. É a apoteose do malfeito. Bem feito.
Guilherme Fiúza é escritor.
FONTE: O GLOBO
Um comentário:
Pelo andar carruagem só nos resta (os brasileiros honestos e cumpridores dos seus deveres) fazer uma fila para se jogar da ponte ...........
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