Eremildo não entende por que a oposição insiste em contestar a versão
oficial do assassinato de Celso Daniel, o prefeito de Santo André que em 2002
chefiava a coordenação da campanha de Lula. Ele acha que ocorreu um sequestro
de bandidos e ponto final. É verdade que o irmão do morto contou ao Ministério
Público que o ex-secretário de governo do município, Gilberto Carvalho,
confidenciou-lhe que levava ao comissariado petista propinas arrecadadas na
cidade.
Há dez anos, o médico João Francisco Daniel dizia que "o PT tem caixa
dois, como qualquer outra legenda". Mesmo sendo um idiota confesso,
Eremildo reconhece que, em relação à caixinha, o irmão de prefeito estava
certo. Afinal, esse trambique tornou-se a espinha dorsal da defesa dos
companheiros no Supremo Tribunal Federal.
À época, o irmão do morto foi desqualificado pela viúva e por Gilberto
Carvalho. Atribuiram suas acusações a "um desequilíbrio emocional
visível". Eremildo entendeu.
São Paulo é uma cidade violenta e, talvez por isso, cinco pessoas
relacionadas com a morte de Celso Daniel foram assassinadas. Uma num presídio.
Outras duas, a tiros.
O garçom que serviu o jantar do prefeito antes do sequestro acabou-se numa
moto, fugindo de uma perseguição. A testemunha desse acidente morreu a bala.
Considerando-se que os conspiromaníacos já contaram 103 mortes estranhas de
pessoas ligadas ao presidente John Kennedy e ao seu assassinato entre 1963 e
1976, o número de Santo André é miserável.
O que incomodou Eremildo foi a resposta que Gilberto Carvalho, atual
secretário-geral da Presidência, deu à acusação de Valério, de que o comissariado
teria pedido ajuda financeira para calar chantagistas de Santo André. Carvalho
repetiu que nunca viu o companheiro financista e acrescentou: "Tenho até
que respeitar o desespero dessa pessoa."
Essa foi forte para o idiota. Seria razoável poupar o irmão de Celso Daniel
em nome de um hipotético "desequilíbrio emocional visível".
"Respeitar o desespero" de um réu confesso a quem nunca viu é um
exagerado exercício de caridade.
Uma coisa seria dizer que Valério está desesperado porque delinquiu e viu-se
condenado pelo Supremo Tribunal Federal. Respeitá-lo por isso é cortesia que
escapa à percepção do idiota. Talvez Carvalho pudesse falar, no máximo, em
piedade. Afinal, a acusação feita por Valério é mais grave do que quaisquer
malfeitorias citadas nas 50 mil páginas do processo do mensalão, pois envolve
um homicídio. Eremildo é um idiota, mas conhece diversas pessoas que não o são.
Algumas dão a Valério o benefício da dúvida, nenhuma respeita-o.
O procurador-geral da República informa que, até agora, Marcos Valério não é
um réu colaborador. Pelo conhecimento do idiota, Roberto Gurgel leu tudo o que
Valério contou ao Ministério Público. A acusação deveria levar o PT e Gilberto
Carvalho a pedir a abertura de um novo processo. Se o caixa do mensalão tiver
provas de que botou dinheiro na conta de companheiros ligados ao esquema de
Santo André, os comissários deverão se explicar à Justiça. Por enquanto, a bola
de ferro continua presa ao tornozelo de Valério. Eremildo não entende por que o
secretário-geral da Presidência respeita um condenado desesperado.
Fonte: Folha de S. Paulo
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