A sensação no Congresso é a de que a presidente Dilma está compreendendo melhor a dinâmica de relacionamento com os parlamentares depois de o governo ter tido que suar a camisa para aprovar a MP dos Portos e visto caducar outras com medidas importantes para seu projeto, como a redução das tarifas de energia elétrica e diversas isenções fiscais.
A reunião que teve com os presidentes da Câmara e do Senado demonstraria uma disposição de dialogar que até o momento não fora detectada pelos políticos. Mais da metade do mandato passada, a presidente Dilma ainda não encontrou um ponto de equilíbrio entre sua maneira autoritária de comandar e a maneira de fazer política, que exige uma flexibilidade que ela não tem.
Premida pelos problemas econômicos e pela campanha de reeleição - antecipada por sua vontade de cortar pela raiz um movimento "queremista" que ainda persiste no PT e nos partidos aliados, que preferem Lula a ela em 2014 -, a presidente está tendo que rever conceitos para conseguir consolidar seus apoios políticos.
A síntese dessa relação conturbada pode ser feita na simplificação: Dilma não gosta de políticos, e estes não confiam na presidente. Mas ambos dependem uns dos outros para continuarem no poder. Dilma não tem alternativa, precisa manter sua base aliada unida, mas os partidos têm opções mais palatáveis, como o senador Aécio Neves, do PSDB, ou o governador de Pernambuco, Eduardo Campos. Os dois são políticos longamente conhecidos por seus pares e que já deram mostras de conhecer bem os desvãos das negociações políticas.
O que as pesquisas de opinião mostram, no momento, é que a popularidade da presidente continua alta, mas é vulnerável aos efeitos da inflação, por exemplo. Por isso, com um ano antes do previsto, nenhum dos partidos pretende se comprometer em definitivo com a reeleição, mas também não abre mão da aliança que é vencedora.
A atitude do governador do Rio, Sérgio Cabral, é um exemplo desse comportamento. Em privado, ele deixou claro que, se o governo não apoiar seu vice Pezão para o governo do Rio, ele não terá dificuldades em apoiar Aécio Neves, de quem é amigo, além de ter laços de parentesco, pois sua primeira mulher era uma Neves: "Meu filho tem Neves no nome", lembrou como que por acaso durante a discussão. Mas de casual esse comentário não teve nada, foi o governador quem levou seu filho ao encontro.
Em público, porém, Cabral nega qualquer desavença e afirma que está 100% ao lado da reeleição de Dilma. Outro bom exemplo de como o palanque e as negociações de bastidores diferem entre si foi a posição do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves. Em sua terra natal, ele comandou uma série de elogios a Dilma, presente no palanque. À noite, na reunião com Renan Calheiros e o vice Michel Temer, foi outra pessoa, sob o pretexto de representar a Câmara, e não setores políticos.
Quem conhece os bastidores das negociações políticas no Congresso e, sobretudo, as manobras do PMDB garante que a medida provisória que desonera produtos da cesta básica será aprovada ainda esta semana no plenário da Câmara sem maiores problemas. O relator da medida, o deputado Edinho Araújo (PMDB-SP), incluiu em seu parecer o texto da MP 605/2013, que reduzia a tarifa de energia elétrica em até 20%, e que caducou por não ter sido votada a tempo pelo Congresso.
Esse penduricalho foi colocado na MP como maneira de não impedir o desconto na energia, e foi o próprio Congresso quem se encarregou de fazê-lo, desmoralizando-se um pouquinho mais nessa questão, mas fazendo um agrado ao Planalto. A legislação proíbe que assuntos diferentes sejam tratados na mesma medida provisória, e já houve tempo em que o Congresso se insurgia contra esse hábito do Planalto.
Depois, passou ele mesmo a incluir penduricalhos por conta própria. Essa é uma demonstração clara de que a base aliada, sobretudo o PMDB, está disposta a manter o apoio a Dilma, mas quer contrapartidas que serão cobradas cada vez mais até que a situação econômica fique clara.
Fonte: O Globo
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