A histórica crise fiscal em que o país se encontra, causa do rebaixamento da sua nota de risco, deve, merecidamente, ser creditada aos governos do PT — a partir do final do primeiro governo Lula e abarcando a gestão inicial de Dilma. Mas é preciso reconhecer o papel exercido pela Constituição de 1988 na quebra do país. Não se põe em questão a importância da Carta no restabelecimento dos direitos civis, próprios da democracia, surrupiados pela ditadura militar. O aspecto negativo da Carta deriva de uma visão ideológica de mundo por meio da qual ela foi redigida, com o Estado sendo colocado sobre a sociedade, no papel de uma espécie de tutor que concentraria o máximo das rendas da sociedade, extraídas por elevados impostos, com a finalidade de distribuí-las para mitigar a pobreza. O Estado seria o agente do “bem”.
Já naquela época se tratava de uma percepção míope da realidade. A prova veio em 1989, logo no ano seguinte ao da promulgação da Carta, quando caiu o Muro de Berlim, símbolo do modelo da centralização extrema de tudo pelo Estado, sistema testado na União Soviética, e reprovado.
A Constituição seguiu essa tendência nos gastos sociais. Caberia unicamente ao Estado eliminar a pobreza. Foi assim que, em mais ou menos uma década, entre governos tucanos e petistas, a carga tributária deu um salto de dez pontos percentuais, de 25% para 35% do PIB. Estima-se que esteja hoje na faixa de 37%, uma enormidade, se comparada com outras economias emergentes. Chega mesmo a rivalizar com a soma dos tributos de sociedades desenvolvidas —, mas estas dão em troca ao contribuintes serviços básicos de boa qualidade. Não é o caso do Brasil.
A obsessão pelo Estado-tutor e o pressuposto de que as fontes de financiamento público são infinitas levaram a que a vinculação do Orçamento chegasse ao paroxismo. Consolidou-se a errônea ideia de que, para se resolver uma carência pública, bastaria estabelecer que determinada parcela do Orçamento seria destinada ao setor carente. Sem qualquer outra preocupação.
Chegou-se à atual situação em que cerca de 90% do Orçamento — uma conta que para o ano que vem está estimada em R$ 1,2 trilhão — são “dinheiro carimbado”. Ou seja, têm destino certo: Previdência, programas especificamente sociais, folha dos servidores.
A quebra do Estado força Dilma a mexer, afinal, nesta construção. Deve-se alterar regras para que gastos possam ser racionalizados. Não faz sentido, também, manter o salário mínimo como indexador desta enorme massa de gastos colocados sob o guarda-chuva do “social”. Pois foi a correta política de valorização do salário-base que, de forma indireta, também ajudou a estrangular as finanças públicas.
Outra insensatez será insistir na velha fórmula de pressionar o já sobrecarregado contribuinte. Disso resultará menos investimentos e menos consumo. E mais: aplicar fórmulas já abandonadas em outros países, como o gravame sobre “grande fortunas", apenas incentivará a migração de patrimônios. É preciso encarar a realidade do esgotamento do Estado-tutor.
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