O Brasil caminha em linha reta rumo à perda de grau de investimento pela Fitch. O rebaixamento do país pela empresa de classificação de risco ontem, para o último degrau antes do grau de "especulativo" ou "junk" veio acompanhado de perspectiva negativa e condicionantes cuja reversão nos próximos 12 meses são muito difíceis, em especial o sucesso na consolidação fiscal, que detenha o rápido crescimento da dívida pública e a redução dos "riscos políticos e de governabilidade", que estão minando a confiança e as expectativas de recuperação. Apenas para voltar à perspectiva estável, a Fitch lista como fatores objetivos a estabilização da dívida; de novo a consolidação fiscal; redução nos desequilíbrios macroeconômicos; melhoria do ambiente para investimentos; crescimento e reformas. As chances de novo rebaixamento são superiores a 50%.
Ainda que seja possível ao governo romper a paralisia em que se encontra, não se vislumbram movimentos decisivos que levem à restauração da confiança e à recomposição de uma base política mais ou menos sólida no horizonte de tempo em que operam as avaliações das empresas de rating, ou seja, em 12 meses. A inação oficial, antes provocada pela falta de convicção na necessidade de rigoroso ajuste fiscal, logo sobre sua magnitude, foi em seguida reforçada pela crise política, que chegou agora às primeiras tentativas de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Pelo lado do ajuste, não há sinais positivos. Suas etapas seguintes - três Propostas de Emenda Constitucional, dois projetos de lei e três MPs - estão empacadas no Congresso, onde sequer têm parecer o início do processo (Valor, 15 de outubro). Duas PECs são vitais: a que desvincula o destino de 30% da arrecadação federal e a que cria a CPMF, com receita estimada de R$ 42 bilhões, capaz de virar o jogo fiscal a favor do equilíbrio. Essas ações buscam tornar viável um superávit primário de 0,7% do PIB em 2016, embora o esforço possa ser maior, pois a meta de R$ 5,8 bilhões, ou 0,15% do PIB, para este ano está ameaçada de frustração.
A Fitch prevê superávit nulo em 2016 (meta de 0,7%) e 0,5% no ano seguinte (meta de 1,2%). Para estabilizar a dívida, calcula que o esforço fiscal tenha de ser de 2% do PIB ao ano e, por isso, a dívida bruta - "alta e de custo maior" que em países com a mesma classificação do Brasil - deverá subir para 66% do PIB este ano, 69% em 2016 e 71% em 2017. O déficit nominal, em sua previsão, fechará 2015 em 9% do PIB e acima de 6% nos dois anos seguintes. É fácil supor que a simples manutenção da trajetória atual levará à perda do grau de investimento.
Um dos argumentos principais para a perspectiva negativa é o dos efeitos nefastos da crise política. O mau desempenho da economia e das contas públicas persistirá, para a Fitch, enquanto ela não for debelada. Não há novidade nisso. Se o governo seguir com sua continuidade ameaçada pelo fantasma do impeachment ou não reconstituir dos escombros sua base de apoio no Congresso até o fim do ano, a extensão dos estragos será bem maior até mesmo que a perda do grau de investimento por duas empresas de rating.
A situação é mais complicada, porque um governo fraco que luta pela sobrevivência e paga qualquer preço por ela, está ameaçado de não só ter suas medidas desfiguradas no Congresso, como também de engolir retrocessos, como projetos que atendem interesses clientelistas, que custam dinheiro.
Um exemplo premonitório ocorreu quando, pressionado por líderes partidários e carente de apoio, o governo deu sinal verde para a aprovação dos "jabutis" da MP 678 e mudança do escopo de seu objeto, a permissão do Regime Diferenciado de Contratação para construção de presídios e obras de segurança pública. O polêmico RDC, cuja extensão a todas as obras públicas havia sido barrada antes, foi estendido a obras e serviços de mobilidade urbana, logística (metrô, estradas, portos) e contratos de ciência, pesquisa e tecnologia. Junto vieram a renegociação da dívida do Proálcool em termos camaradas (15 anos de prazo, 3 de carência e juros de 3% ao ano) e a extensão do prazo para acabar com os lixões até agosto de 2018 (ele findou em agosto de 2014).
Se, acossado no campo político, o governo ao menos mostrasse determinação na defesa do ajuste econômico, teria alguma chance de sair do córner em que está. Mas, à primeira vitória contra o impeachment ressurge na corte governista o movimento pela saída do ministro da Fazenda. É desalentador.
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