Por Raymundo Costa - Valor Econômico
BRASÍLIA - As propostas de reformas da equipe econômica do presidente interino, Michel Temer, devem encontrar um ambiente mais favorável que Dilma Rousseff enfrentou no Congresso quando apoiou o ajuste fiscal do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy. A diferença é a maior identidade programática entre a atual base de apoio e o governo do PMDB, ao contrário do que acontecia quando o PT dava as cartas no Palácio do Planalto.
A oposição declarada a Temer é mais ou menos do mesmo tamanho da oposição a Dilma, algo em torno de 100 deputados na Câmara. Para ser exato, 99 deputados, resultado da soma de PT (58), PDT (20), PCdoB (11), P-SOL (6) e Rede Sustentabilidade (4). Número insuficiente para a esquerda requerer sozinha a abertura de CPIs ou lançar frentes parlamentares. Diz a lógica que esse espectro deveria tentar sair do isolamento buscando alianças ao centro ou ao menos num grupo de cerca de 70 deputados que podem vir a discordar do novo governo.
Feitas as contas, sobra numericamente para o governo Temer uma base monumental, algo em torno de 370 deputados (o impeachment teve 367 votos na Câmara). A presidente afastada tinha praticamente o mesmo número de deputados ao seu lado, supostamente, mas perdeu sustentação política. "O governo Temer tem agora uma base com unidade programática e expectativa de poder", diz Antonio Augusto Queiroz, diretor de documentação do Diap, entidade que presta assessoria legislativa às centrais sindicais.
Com a experiência de quem há 30 anos acompanha o dia a dia congressual, Toninho, como Queiróz é chamado, não vai ficar surpreso se a coalizão governista apoiar as propostas de reformas feitas pela equipe econômica, por mais duras que elas sejam. "Ela vai votar contra por quê?", pergunta ele. "Antes votavam contra o PT, agora têm a expectativa de eleger um dos seus para Presidência da República".
Na opinião do diretor do Diap, "o PT erra ao não procurar o diálogo". Toninho vê o PT ainda "muito ressentido". Mergulhado nesse ressentimento, "perdeu a racionalidade". Como não conversa, "não agrega ninguém, não consegue trazer um apoio de centro". Restam os movimentos sociais, mas esses- acredita - "estão sendo asfixiados financeiramente pelo governo Temer". O Minha Casa Minha Vida Entidades, por exemplo, ajudava grupos como o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).
Segundo apurou o Valor, entidades sindicais mais ligadas ao PT estão apreensivas, por considerar que vão ter que bancar as manifestações (inclusive aquelas contra o impeachment) e acolher o pessoal desempregado do governo, que não é pequeno. Não dá para abrigar todos nos governos estaduais, como o de Minas Gerais, o maior na mão do PT.
O PT, as esquerdas em geral e o movimento sindical entram enfraquecidos na guerra das reformas. Hoje apenas 51 deputados têm origem no movimento sindical. Em 2006, eram 91 os sindicalistas. A razão da queda, na opinião de Toninho: a prioridade que o governo e partidos à esquerda deram à eleição de candidatos das máquinas governamental e partidária. O que levou à desmobilização da aliança e a formação de quadros nos movimentos sociais.
"A nova base não tem divergência ideológica", como acontecia quando o PT e não o PMDB eram o partido líder da coalizão, "e os conflitos no seu interior não são suficientes para levar os deputados a votar contra as reformas", acredita Toninho. "Ela só precisa de um presidente com pulso para aprovar as matérias. A oposição está isolada, raivosa e muitas vezes envergonhada por ter apoiado projetos como a renegociação da dívida dos Estados, que esfola com os servidores". Antes da saída de Dilma, esse era um dilema vivido por PSDB e DEM, quando decidiam votar contra o que apoiavam quando eram governo.
A identidade ideológica da base parlamentar, evidentemente, não é garantia para a aprovação das propostas de reforma como foram apresentadas, mas Toninho acredita que facilita a negociação e a composição dos interesses no interior da coalizão.
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