A situação precária e a tendência de expansão dos gastos com benefícios previdenciários não dão ao governo a alternativa de aprovar apenas parte do projeto
Superada pelo governo na Câmara a questão da licença para que o Supremo examinasse se processaria o presidente Michel Temer pela acusação de corrupção passiva, o Planalto retoma a agenda de reformas.
E recomeça mal, se mantida a posição defendida por Temer em entrevista a “O Estado de S.Paulo”, em que substituiu o termo reforma por “atualização”, restringindo-a à fixação das idades mínimas para efeito de requisição da aposentadoria de 62 anos para mulheres e 65 no caso dos homens.
O presidente incluiu, ainda, nesta minipauta, o fim das diferenças entre as regras para os benefícios dos trabalhadores na iniciativa privada e as normas, privilegiadas, do funcionalismo público.
Em posição oposta, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, deseja que a proposta de atualização do sistema previdenciário seja retomada de onde parou, após a aprovação em comissão especial, sem qualquer alteração para reduzi-la a poucos pontos. Maia tem razão.
Porque, entre outros motivos, a situação fiscal não dá margem ao governo para qualquer recuo. Precisa avançar, a fim de conseguir o mínimo de 308 votos necessários para aprovar o projeto, em dois turnos, e enviá-lo ao Senado.
Além de tudo, o estabelecimento do teto constitucional para limitar o crescimento das despesas não dá alternativa ao país. De um lado, o déficit previdenciário aumenta sem freios — chega este ano a R$ 188 bilhões, tendo sido R$ 150 bilhões em 2016, e assim seguirá —; de outro, as receitas tributárias não se expandem como era esperado, devido aos passos lentos na recuperação da economia. Adicione-se ao cenário que aumentar impostos retardará a própria recuperação. Vai-se entrar num caminho em círculos: crescimento lento, baixa arrecadação, mais impostos, estagnação.
Muitos estudos apontaram para um ponto no futuro em que a Previdência funcionaria como um buraco negro sideral a tragar fatias crescentes da arrecadação de impostos. Parecia algo distante, mas não é mais.
Pelo teto constitucional, o total das despesas da União não pode crescer mais que 3,52% no ano que vem, ou R$ 44,1 bilhões. Mas só o aumento dos gastos com a Previdência será de R$ 50 bilhões. O futuro chegou.
Por isso é necessário aproveitar o momento para aprovar o projeto que passou pela comissão especial. Garantir agora a reforma melhorará as expectativas, porque não transferirá para as incertezas da eleição de 2018 o destino de um fator para as contas públicas já problemático hoje.
Que o governo reconstrua a base e aproveite a disposição de Rodrigo Maia de trabalhar nesta direção. Mesmo o tema da necessária equalização das regras de aposentadoria de trabalhadores no setor privado e servidores públicos requer um duro embate com grupos de pressão poderosos.
Mais um motivo para enfrentar todos os conflitos de uma vez. Mesmo se houvesse tempo para isso, fatiar a reforma significaria multiplicar chances de derrota.
Caso haja necessidade de ajustes futuros — e haverá —, já terá sido construída uma base com alguma solidez, sem a imperiosidade de nova reforma em 2019, a toque de caixa, em novo aperto fiscal.
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