O Brasil foi mais uma vez derrotado em uma votação no Congresso, com a aprovação, na semana passada, do texto-base do novo programa de renegociação de dívidas tributárias. Deformada pelo deputado Newton Cardoso Jr., relator da Medida Provisória (MP) 783, a proposta do novo Refis foi convertida em luxuoso presente aos sonegadores e em mais um estímulo ao calote fiscal. O objetivo básico do governo, usar o dinheiro da primeira parcela de pagamento para reforçar a posição do Tesouro, num ano de enorme dificuldade orçamentária, ficou gravemente prejudicado. Apontar o governo como o grande perdedor é subestimar o estrago ocasionado, como em tantas outras votações, por parlamentares sem compromisso com o interesse público. O perdedor é, sim, o País, novamente prejudicado no esforço de arrumação das finanças públicas e de retomada do crescimento seguro, depois da mais severa recessão registrada na história das contas nacionais.
Ficou para esta semana a votação dos destaques. Na melhor hipótese, ainda sobrará o dano produzido quando os deputados, em votação simbólica, consagraram o texto-base. Encerrada a tramitação na Câmara, o texto ainda será submetido ao exame dos senadores. Numa tentativa de garimpar algum dinheiro neste exercício, o Executivo prorrogou para 31 de outubro o prazo de adesão ao novo Refis. A MP 783 foi mais uma tentativa da equipe econômica de implantar, neste ano, o programa de regularização tributária.
Em todas, o esforço foi comprometido por parlamentares empenhados em proporcionar o máximo benefício a empresas sonegadoras, mesmo ao custo de uma perda enorme para o Tesouro e para a convalescente economia brasileira.
Ligações de parlamentares com empresas em débito com o Fisco foram denunciadas desde a primeira batalha. A denúncia envolveu o relator Newton Cardoso Jr., vinculado, segundo se informou, a firmas devedoras de mais de R$ 50 milhões ao Fisco. Mas ele foi mantido na função em todas as tentativas de implantação do programa. Pressionado por um colega para declarar se essas empresas se absteriam da renegociação, ele ficou em silêncio. A versão deformada e depois aprovada ampliou os descontos de juros e multas e permitiu o uso de prejuízo fiscal para redução do valor devido.
O plano original da equipe econômica era obter R$ 13,3 bilhões neste ano com o pagamento da primeira parcela pelas empresas participantes da renegociação. A estimativa caiu para R$ 8,6 bilhões depois dos primeiros estragos na proposta. A nova expectativa, segundo fontes da área econômica e financeira do Executivo, é uma arrecadação, em 2017, na faixa de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões.
A arrecadação inicial seria especialmente importante neste ano. A recuperação da economia está em fase inicial, ainda é lenta e seus efeitos na arrecadação de impostos e contribuições começaram a aparecer há pouco tempo. Apesar dessa melhora, conter o déficit primário no limite de R$ 159 bilhões será muito trabalhoso.
Parte da receita adicional será provavelmente consumida na manutenção de um mínimo indispensável de atividades no governo. Todo recolhimento extra, por meio de privatizações, concessões de infraestrutura ou programas especiais, como o novo Refis, é extremamente importante para o fechamento das contas.
Mas poucos deputados parecem participar dessa preocupação. O vice-presidente da Câmara, o peemedebista mineiro Fábio Ramalho, convocou a bancada de seu Estado para votar com o relator, como resposta à licitação, na semana passada, de quatro usinas da Cemig.
“Não temos compromisso de votar com o governo”, disse o deputado. De fato, nem com o governo nem a favor dos interesses do Brasil. Os danos causados com a imposição de mais um entrave ao acerto das contas públicas ficaram obviamente fora de seus cálculos e de seus planos políticos. Não há como limitar a censura ao deputado Newton Cardoso Jr. Ele apenas se tornou, por sua função como relator, o exemplo mais visível de desprezo ao País. Mas muitos outros estão à sua altura, como confirma a aprovação do texto-base.
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