- O Estado de S.Paulo
A inflação de 2017 foi a mais baixa desde 1998, como está nos comentários, mas não dá para festejar. Sobram dúvidas sobre se esses 2,95% em 12 meses são o resultado de uma mudança estrutural permanente ou se são apenas consequência da confluência de fatores positivos de caráter provisório.
A principal dúvida provém da esticada inesperada verificada em dezembro. As apostas concentravam-se em inflação em torno de 0,3%, mas veio bem mais: 0,44%.
É verdade que a dúvida acima poderia ser invertida: vai que a inflação de dezembro é que foi soluço fora de curva e que 0 movimento de longo prazo é de baixa estrutural.
A hipótese a ser testada tem a ver com a volta da demanda. Se bastar um ligeiro aumento da procura por alimentos e serviços para que a inflação volte a mostrar a cara, então estaríamos longe de uma queda persistente.
Jogo contra não falta. O principal deles é a desordem das contas públicas que obriga o governo a se endividar cada vez mais para pagar funcionários, aposentados e fornecedores.
Apenas a folha de pagamentos dos funcionários públicos das três esferas de governo (federal, Estados e municípios) alcança 13% do PIB, conforme cálculos do Banco Mundial. Para dar uma ideia do tamanho do buraco, pense que, para pagar essa conta, seriam necessárias todas as receitas de 15 meses de exportação do Brasil. Entre os fatores que jogam contra a baixa estrutural da inflação está a falta de vontade política para enfrentar a reforma da Previdência Social, que aponte para um equilíbrio de longo prazo nessa subconta.
Pode-se acrescentar outro fator de incerteza em relação ao futuro da inflação, que é a questão política. Estamos a nove meses das eleições presidenciais e ainda não se conhecem os candidatos e as forças que deterão os comandos do Estado a partir de janeiro de 2019. E isso conta para inflação, porque são fatores que vão determinar a qualidade da política econômica e do controle da inflação.
Comentários frequentes, principalmente por parte de empresários, têm afirmado que a inflação só caiu porque o Banco Central criou uma brutal recessão. Primeiramente, não foi o Banco Central que criou a recessão. Foi a desastrada política econômica do governo Dilma. Em segundo lugar, se recessão forte derrubasse inflação, a Venezuela que enfrenta uma queda do PIB de nada menos que 15%, não teria essa inflação de 2.616% em 2017.
Nesta quarta-feira, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, divulgou a Carta Aberta, exigida por lei sempre que a meta de inflação é descumprida. Foi a quinta vez que o Banco Central teve de se explicar. Mas, desta vez, foi por motivo diferente. Em 2002, 2003, 2004 e 2016 teve de justificar o estouro do teto da meta dos anos imediatamente anteriores. Agora, a Carta teve de explicar o estouro do piso da meta, os tais 3,0%.
O texto aponta os motivos que derrubaram a inflação dos alimentos (principal explicação) e a dos serviços – nada que não seja do domínio público. E enfatiza a estratégia (bem-sucedida) adotada para derrubar a inflação: ancoragem das expectativas a partir de 2016, que viraram pandemônio na administração anterior de Alexandre Tombini; correção dos preços administrados; e derrubada mais rápida do que gradual dos juros.
Mas, ao contrário do que alguns analistas esperavam, a Carta não adiantou nada de novo para a política de juros a partir de fevereiro deste ano.
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