- O Globo
A vitória sobre a inflação construiu o caminho pelo qual o país saiu da recessão. Por causa da queda dos preços, houve uma sequência de eventos favoráveis na economia que permitiu o início da retomada. Não foi a recessão que derrubou a inflação, foi a queda da inflação que superou a recessão. Nas causas da vitória estão a produção agrícola e a ação do Banco Central.
O mocinho da virada foi o preço de alimentos, mas a redução da inflação foi generalizada, tanto que, como disse o Banco Central, sem os alimentos a taxa teria ficado em 4,54%. A queda foi resultado da supersafra, mas também dos acertos da política econômica, principalmente do BC.
A inflação estava acima de 10% em janeiro de 2016 e terminou 2017 em 2,95%. O INPC, que mede a evolução da cesta de consumo de famílias até cinco salários mínimos, terminou o ano em 2,07%. Como esse índice corrige benefícios previdenciários, isso ajudará também nas contas públicas, porque o Orçamento foi elaborado prevendo 3,1%.
Por causa da queda dos preços, houve mais espaço no orçamento das famílias para outros consumos. E isso aconteceu principalmente porque foram os alimentos que puxaram a média dos preços para baixo. Em 2016, houve momentos em que a inflação de alimentos se aproximou de 15%. O grupo terminou 2017 com deflação de 4,8%. Com a queda da inflação, os juros puderam ser reduzidos em mais de sete pontos percentuais. O relaxamento monetário permitiu renegociação de dívidas privadas e redução dos preços de rolagem da dívida pública. Com menos inflação e menos juros, houve um aumento da confiança e, mais tarde, da produção e das vendas.
Um evento levou ao outro, numa sequência de fatos positivos na economia que desafiou o ambiente tóxico da política, com a revelação da inaceitável conversa entre o presidente e o empresário Joesley Batista e todas as articulações nefastas para manter o governo.
Apesar da confusão política, a economia foi encontrando seu caminho para sair do buraco de duas quedas sequenciais do PIB de 3,5%. Mas a crise política impõe um teto para a recuperação. A alta do PIB de 2017 deve ter ficado em torno de 1%. Pouco para o tamanho da perda, apenas permite que o país comece a fazer o caminho de volta.
Ao contrário de todos os outros momentos da história do real, esta queda da inflação não elevou a popularidade presidencial e a aprovação do governo. Uma das razões é que o ambiente ainda é de crise, a renda permanece em níveis mais baixos do que já esteve, o desemprego continua muito alto. Além disso, os vilões — preços que subiram muito apesar da queda geral — atingem em cheio a classe média: combustíveis, mensalidades escolares, energia, planos de saúde. Essa recuperação é também diferente de outras recessões, porque o país está saindo à francesa. Lentamente. A última recessão deste tamanho foi provocada pelo Plano Collor. A recuperação ocorreu no governo Itamar, e o país saiu do PIB negativo de 1992 para a alta de quase 5% em 1993. O clima agora ainda é de crise, o país continua com sequelas, as empresas investem pouco, o governo enfrenta graves dificuldades fiscais.
Sair desse fosso pela queda dos preços é um fato curioso no Brasil que teve durante tanto tempo uma relação atormentada com a inflação. Ela arruinou a economia do país várias vezes. Quando voltou a dois dígitos no fim de 2015 e começo de 2016, temia-se a reindexação da economia. O cenário felizmente não se confirmou.
A ideia de que foi a recessão que derrubou a inflação não explica o que aconteceu. No Brasil, várias vezes tivemos recessão com preços subindo, a última vez foi em 2015. O país colheu uma supersafra e isso foi providencial. A produção agrícola foi o grande jogador em campo. Mas a atuação do Banco Central buscando a meta, quando parecia difícil ser atingida, e os acertos da política econômica ajudaram a derrubar os índices de preços. Os IGPs da FGV terminaram o ano com deflação. Em 2018, a inflação sobe um pouco, mas o temor do descontrole que havia no começo de 2016 foi superado. Na velha briga do Brasil contra a inflação, o país venceu desta vez.
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