• A senhora viveu sob o jugo de diversos regimes autoritários. Diria que a Hungria está retomando o mesmo caminho?
"Nem todas as tiranias se parecem. Orbán não instaurou um regime autoritário, mas uma nova forma de tirania que se espalha hoje pelo mundo, onde um tirano é eleito, depois reeleito e novamente reeleito. Como Orbán, Putin, Erdogan. O próprio Orbán descreve essa nova tirania como uma democracia iliberal. Democracia, pois o regime é fruto de uma votação majoritária. “Iliberal”, porque não há mais direitos humanos, nem pluralismo. É um governo totalmente centralizado: nada mais pode acontecer na Hungria sem que ele assim tenha querido.
Nesse tipo de regime assistimos a uma “refeudalização” progressiva. O poder transforma em renda o que dependia anteriormente do lucro redistribuído pelo capitalismo, e cria sua própria oligarquia. Falar sobre esses regimes como se falava do nazismo ou do stalinismo é não perceber o que está acontecendo, nem compreender os seus perigos.
Vejam Matteo Salvini, na Itália. É um pequeno “Duce”, mas não vai marchar sobre Roma, nem tomará o poder pela força. Ele fará exatamente como fez Orbán. Chegar ao poder pelo voto majoritário, e lá permanecer, por meio de reeleição após reeleição. Todos esses novos tiranos se escondem atrás do argumento poderoso do voto majoritário, apresentado como uma garantia da natureza democrática de seu regime. Mas não se trata disso! Esses regimes não se parecem em nada com aquilo que chamamos de democracia. Pois, desde a primeira emenda à Constituição dos Estados Unidos, a democracia moderna é sinônimo de democracia liberal."
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Ágnes Heller, 89 anos, socióloga, discipula do filosofo marxista György Lukács, em entrevista
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