- O Estado de S.Paulo
Não se sabe o quanto a globalizada elite política, empresarial e financeira acredita em visões catastrofistas sobre meio ambiente, mas esse é um de seus temas mais discutidos, goste-se ou não.
Não acreditem em profetas do apocalipse, disse Donald Trump à fina flor do mundo político e empresarial reunido – como todo ano em janeiro – para o World Economic Forum em Davos, Suíça. Não se sabe o quanto a globalizada elite política, empresarial e financeira acredita em visões catastrofistas sobre meio ambiente, mas esse é um de seus temas mais discutidos, goste-se ou não.
E é praticamente o único assunto pelo qual é avaliada hoje a imagem do Brasil no exterior. Bom conhecedor desse público, o ministro da Economia, Paulo Guedes, foi à Suíça oferecer um argumento que, na sua essência, afirma que não é a busca do lucro o maior inimigo da proteção do meio ambiente em lugares como o Brasil (que precisa de seus recursos naturais para se desenvolver), mas, sim, o desespero de quem passa fome e destrói para sobreviver. Ou seja, pobreza.
A julgar pelos relatos de boa parte da imprensa internacional, o argumento de Guedes não convenceu, não importa se tem méritos. Ao contrário: alguns dos principais banqueiros internacionais sentiram-se obrigados a responder nesse mesmo evento aos gestores de grandes fundos de investimento, que anunciaram recentemente incluir um “fator de risco ambiental” (leia-se compliance por parte de grandes companhias) ao direcionar alocações de recursos.
A resposta foi uma cobrança a governos – banqueiros em momento Greta, talvez? – exigindo mais coordenação de políticas de combate a mudanças climáticas, para evitar que a “culpa” caia sobre o setor privado. Em outras palavras, também o setor financeiro está sentindo a pressão, e foi o chefe do Bank of America quem defendeu em Davos a adoção de um padrão internacional de contabilidade para averiguar como companhias privadas estão cumprindo metas fixadas em conferências sobre clima da ONU, por exemplo.
No que parece ter sido uma tática coordenada, o governo brasileiro ofereceu a apocalípticos ou não reunidos em Davos duas boias para se abraçar. Anunciou a criação de um Conselho da Amazônia chefiado por um general, o vice-presidente Hamilton Mourão, que conhece bem o lugar e também sabe como funciona um Estado-Maior. E a criação de uma Força Nacional Ambiental voltada exclusivamente para a repressão ao desmatamento da Floresta Amazônica.
Além de ser uma resposta óbvia, ainda que tardia, ao tipo de pressão internacional que o governo brasileiro de forma inepta conseguiu acelerar contra si mesmo, o anúncio oferece dois outros reconhecimentos implícitos. O primeiro é o da falta de uma instância de coordenação dos vários ministérios e órgãos do governo vinculados à Amazônia. O tal Conselho parece equivaler a uma “Casa Civil” da questão ambiental.
O segundo reconhecimento, implícito na Força Nacional, refaz o argumento de Guedes. Para qualquer pessoa com um mínimo de vivência na Amazônia, especialmente nas chamadas “zonas de fronteira” (aquelas nas quais se expande rapidamente algum tipo de atividade econômica), a chegada de contingentes populacionais cria realidades incontroláveis que duram já décadas (a degradação de vastas áreas do sul do Pará é um dos grandes exemplos). A destruição “formiguinha” torna-se formidável, e irreparável também, pela ausência do Estado.
É o que está no fundo da questão: a notória incapacidade do Estado brasileiro de dominar o próprio território e impor suas leis. O desastre de comunicação internacional na questão ambiental é marca do governo Bolsonaro, mas os avanços e recuos do desmatamento, a menor ou maior velocidade na ocupação de territórios, a força maior ou menor de atividades predatórias (especialmente extração de madeira e garimpo) parecem seguir ciclos que têm fugido ao controle de qualquer governo central brasileiro.
Pobreza ou não, o problema ambiental sempre foi o de autoridade.
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