O Globo
É a campanha política mais suja que o
Brasil já vivenciou
A campanha petista tem apresentado a
eleição como uma escolha entre civilização e barbárie e o voto em Lula como
um voto em defesa da democracia. Mas o governo Bolsonaro e a campanha eleitoral
que se seguiu tornaram o ambiente político tão degradado que é difícil
acreditar que civilização e democracia possam emergir desse embate.
O sinal mais forte da deterioração do ambiente é a campanha. As duas primeiras semanas do segundo turno constituem, indiscutivelmente, a campanha política mais suja que o Brasil já vivenciou, fazendo parecer inocentes os ataques de Collor contra Lula em 1989 ou os de Dilma contra Marina em 2014.
Enumero os fatos para o leitor não achar
que se trata de exagero retórico. O Brasil começou a campanha discutindo se
Lula era satanista, depois de uma live de um influenciador satanista viralizar
dizendo que o satanismo e o luciferianismo tinham se unido ao redor do petista.
Em seguida, o país discutiu se Bolsonaro era ligado à maçonaria e se o
envolvimento com a instituição era apropriado a um cristão. Aprendemos quem é
Baphomet e relembramos os grandes líderes políticos maçons. Também discutimos
se Bolsonaro praticou zoofilia quando criança e uma declaração sobre sua
disposição em comer carne humana. Discutimos também se Lula foi apoiado pelo
PCC, se foi mesmo o candidato mais votado nos presídios e se isso seria pior
que o apoio do goleiro Bruno, de Doutor Jairinho e de Guilherme de Pádua a
Bolsonaro.
Calma, não acabou. Discutimos também se o
influenciador eleito deputado federal Nikolas Ferreira, apoiador de Bolsonaro,
foi flagrado fazendo sexo oral noutro homem. Discutimos também se Damares
Alves, ex-ministra de Bolsonaro, mentiu, prevaricou ou disse a verdade quando
relatou que os dentes de meninas foram arrancados para que fizessem sexo oral
em homens na condição de escravas sexuais. Finalmente, discutimos se o boné de
Lula com a inscrição CPX mostrava vínculo com a comunidade do Complexo do
Alemão ou se era sinal de que ele era “cupinxa” (sic) do crime organizado.
Deixei de fora do relato as controvérsias “menores”. E lembrem: faltam ainda as
duas últimas semanas de campanha, as mais decisivas.
No passado, esse jogo sujo trafegava na
forma de boato ou de correntes de WhatsApp. Nesta eleição, quase todo o esgoto
foi veiculado no rádio e na TV. A diferença entre a campanha oficial e a
campanha B desapareceu.
Não discutimos como estruturar a política
de transferência de renda, quais devem ser suas fontes de financiamento, se
devemos remunerar melhor famílias com mais filhos, se deve haver condicionantes
e quais seriam, nem se o valor é adequado e qual deveria ser o fator e a temporalidade
da correção. Não discutimos o endividamento das famílias nem se as propostas de
refinanciar as dívidas são exequíveis e devem ser prioritárias. Não discutimos
se faremos a reforma tributária e se ela deve se restringir à introdução do
Imposto sobre Valor Agregado reunindo vários tributos sobre consumo nem se
reformamos também o Imposto de Renda criando mais faixas e pondo fim a alguns
abatimentos ou se tributaremos mesmo juros e dividendos e em que medida. Enfim,
não discutimos nada que interessa. Os dois candidatos nem sequer apresentaram
um plano de governo digno do nome. Bolsonaro porque não se importa com política
pública, e Lula porque não quer que um programa claro de governo crie embaraços
para a construção de sua frente ampla.
A sociedade está mais dividida do que
nunca, e esta campanha imunda seguramente não unirá os brasileiros. Eu me
pergunto que tipo de democracia é esta a preservar, em que as pessoas não
conseguem mais conviver. E me pergunto também que tipo de civilização é esta em
que, se Lula vencer, a grande lição será que, para ser eficaz na disputa
política, é preciso ser mais vil e rasteiro que o adversário.
3 comentários:
Ortellado é fruto da malfada revolta de 2013. Um tipo de gente que acha que consegue ser "neutro", pero no mucho. Seu odio ao PT vem de longa data, desde o CMI nos idos anos 2000. Pois bem, dito isto a coluna acima é a expressão do idealismo juvenil que ainda nutre o articulista. Ele quer que a campanha de lula seja de propostas com quem joga sujo. Me pergunto se promessas de campanha e propostas modorrentas conseguem viralizar ou alcançar a consciência das pessoas. No mundo real onde a disputa pelo poder é visceral nao responder aos ataques a mesma altura é ser ingênuo. Que bom que o PT aprendeu a dar a resposta na mesma moeda e com as mesmaa armas.
Bolsonaro me lembra o SUJISMUNDO, só que muito piorado...
Tudo que falaram sobre Bolsonaro é real,ele disse com clareza que comeria carne humana.
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