O Globo
Há pelo menos 12 ministérios que têm ou
deveriam ter o que fazer num plano nacional de combate imediato aos incêndios
O Supremo Tribunal Federal é uma Corte
constitucional. É um poder independente, que deve decidir, nas mais diversas
situações e casos, se a Constituição é ou não cumprida. Portanto foi com certo
espanto que tomamos conhecimento, nesta semana, de uma ordem executiva de um
ministro do STF, Flávio Dino.
Determinava que o governo federal enviasse mais bombeiros militares para atuar
nas regiões afetadas pelos incêndios. Mandava também que se deslocassem mais
equipamentos e veículos para apoiar os esforços da Força Nacional.
Onde estava a questão constitucional?
O Executivo também é um Poder independente, a que cabe justamente a função de executar políticas e tocar a administração. Governar, enfim. Não cabe ao STF determinar se bombeiros deveriam atuar aqui ou ali. Mas determinou. E o governo cumpriu. Dois dias depois da ordem de Flávio Dino, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, convocou 150 bombeiros para as ações de combate aos incêndios. Portanto dentro do prazo de cinco dias dado pelo STF.
Sabe-se que isso criou certo mal-estar no
governo federal. Compreensível. Dino entrara na seara do Executivo e, mais,
determinando algo que obviamente o governo já deveria estar fazendo. Mostrou a
todo mundo que o governo falhava num momento gravíssimo de emergência nacional.
E falhava em questões elementares, como a mobilização de bombeiros. O que fazia
o ministro da Justiça? Esperava ordem do STF?
Não há crise, apressaram-se todos a dizer. É
normal, disseram, pois o STF tem amparo legal para esse tipo de determinação
executiva. Tem mesmo — e isso vem do tempo da pandemia, quando o governo
Bolsonaro não era apenas incompetente na atuação sanitária de combate à
transmissão de Covid-19. Era ostensivamente contra as medidas. E as sabotava.
ameaça à saúde pública, à saúde de todos e de
cada brasileiro, poderia ser interpretada, como foi, como descumprimento pelo
governo de uma obrigação constitucional. Decorrendo daí a capacidade do STF de
determinar medidas que contribuíssem para o cumprimento executivo daquela
obrigação constitucional. “Saúde é dever do Estado.”
Dada a explicação, a coisa ficou ainda pior
para o governo Lula.
Dino deixou o Ministério da Justiça faz pouco tempo, chegou ao Supremo pelas
mãos de Lula. Não é, portanto, um adversário. E ficamos assim: o juiz do STF
precisou recorrer a uma prerrogativa instituída para barrar os desmandos de
Bolsonaro para determinar mais eficiência ao governo Lula, de que fazia parte
há até pouco tempo.
E, quer saber? Dino tem razão.
No complexo e confuso governo Lula, há pelo
menos 12 ministérios que têm ou deveriam ter o que fazer num plano nacional de
combate imediato aos incêndios. E que deveriam estar preparados para a
emergência climática caracterizada hoje por uma seca severa — prevista por
especialistas e mesmo por integrantes do governo.
Apanhado no meio da crise, o governo passou a
especular sobre medidas que já poderia ou deveria ter tomado. Por exemplo: a
criação de uma Autoridade Climática, com amplos poderes para enfrentar o
presente e o futuro. A ministra Marina da Silva propõe isso faz tempo. Ficaria
dentro de seu Ministério do
Meio Ambiente e das Mudanças
Climáticas.
Deu problema político. Não da grande política
— uma discussão sobre poderes e alcance de tal Autoridade. A questão foi outra:
onde e com que partido ficaria? Ainda agora, quando a ideia voltou à tona, já
surgiram especulações sobre nomes para comandar a talvez futura Autoridade. Um
ambientalista? Ou um representante da Frente Parlamentar da Agropecuária?
Também se tratou de um arcabouço jurídico da
emergência climática — pois é, não tinha. E até entrou na pauta o horário de
verão, ainda em análise, segundo fontes do governo. Repararam? Nenhuma ideia
nova. Apenas expõe um governo atordoado, o mesmo que ficou atordoado com a
epidemia de dengue.
Se bem que apareceu uma ideia nova, de Lula:
treinar os 70 mil recrutas que entrarão no Exército para o combate aos
incêndios.
Agora vai.
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