Joelmir Tavares / Folha de S. Paulo
Políticos lançam manifesto que critica emendas e repudia alianças com direita radical nas eleições
Ex-ministros de Lula (PT), Fernando
Henrique Cardoso (PSDB) e Dilma
Rousseff (PT) iniciaram uma mobilização para convencer a classe
política e eleitores a isolar a direita radical nas eleições de 2026 e
interromper o que chamam de extorsão do Orçamento pelo Congresso, via emendas.
O grupo organizou o manifesto "Vamos em
Frente", que até esta quarta-feira (15) contava com 83 assinaturas. Entre
os signatários, estão os ex-ministros Tarso
Genro, Cristovam
Buarque (governo Lula), Aloysio
Nunes Ferreira (FHC), José
Eduardo Cardozo, Renato
Janine Ribeiro (Dilma) e Nelson Jobim (que
serviu aos três governos).
Os idealizadores dizem buscar amplitude
ideológica. Articulado nos últimos quatro meses, o documento também foi
endossado por representantes da sociedade civil, acadêmicos, empresários e
advogados. O material ainda será aberto para adesões em um site, no intuito de
aumentar seu alcance.
A principal crítica da carta é à influência no Congresso "de bancadas oligárquicas e fisiológicas, que se dedicam a extorquir, para proveito próprio, os orçamentos públicos".
As emendas parlamentares já
consomem até 74% da verba de ministérios, como mostrou a Folha. A
avaliação dos autores é que o descontrole nos gastos subverte a relação
institucional entre os Poderes.
"Temos um objetivo muito concreto e
específico, que é reconstruir a dignidade perdida do Congresso
Nacional", diz Tarso Genro, um dos que capitaneiam o autointitulado
movimento cívico.
A iniciativa passou pelo Instituto Novos
Paradigmas, fundado pelo petista e ex-governador do Rio Grande do Sul. Para
ele, não é justo generalizar a conduta dos parlamentares, mas aquilo que chama
de "bloco político de extorsão orçamentária" tem prejudicado o
Executivo e vai continuar emparedando o presidente, seja ele de qualquer
coloração política, por "submetê-lo a um parlamentarismo perverso".
A carta ainda propõe ao campo democrático que
assuma o compromisso de não firmar alianças com partidos ou representantes
"da direita autoritária e da extrema direita". Também repudia a
aproximação com "quaisquer organizações partidárias que proponham
ditaduras de qualquer natureza".
Segundo Tarso Genro, o grupo descarta
anunciar apoio a candidato à Presidência e busca estimular a união de esforços
não só no plano nacional, mas também nos estados, para defender a democracia e
os termos da Constituição de 1988. O eixo central, diz o petista, é "mudar
a composição do Parlamento".
A carta não cita nomes, mas alude ao
ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL)
ao citar "a herança do governo anterior, com um déficit fiscal de R$ 782
bilhões, desmanche de instituições e políticas públicas, negação retrógrada da
inteligência científica universal, propagação da violência miliciana e o culto
da morte". Para os autores, esses "também são um legado
perverso" do qual o país deve ser defendido.
O ponto de consenso no grupo é que fortalecer
a democracia "só será possível com o suporte de um campo político
unificado", que demarque diferenças entre democracia e ditadura e
"entre frentes políticas eleitorais sem princípios e frentes eleitorais
baseadas em princípios mínimos".
Tarso
Genro afirma que uma das intenções é replicar a mobilização em outras
regiões, influenciando uma frente nacional. "É um chamado ao amplo
espectro das instituições que defendem a democracia em busca de uma saída
consensual e negociada para a situação em que estamos", diz o ex-ministro.
Ele ressalva, contudo, que o grupo inicial do
manifesto "não tem ambição de interferir nos partidos, mas, sim, no
pensamento político dos eleitores".
O texto fala em "estabelecer uma
comunicação entre as múltiplas visões democráticas —nos estados e na própria
União— para buscar pontos de unidade em direção a novas frentes políticas, com
suas especificidades regionais, já no primeiro turno ou, alternativamente, no
segundo turno" de 2026.
O sociólogo José César Martins, o Zeca,
coordenador do grupo
Derrubando Muros, diz que assinou o manifesto porque ele se propõe a
aglutinar "uma frente amplíssima" e por entender que é preciso
"unificar os democratas" e abraçar as diferenças em torno de um valor
que é inegociável.
"Mas democracia demanda entregas",
afirma ele, mencionando desafios como transição climática, superação de
desigualdades e as crises na educação e na segurança pública.
"Para isso, precisamos nos reinventar e
dar um choque de mudanças e progresso, [sendo] firmes, sem 'dono da bola' e
concessões à direita ou à esquerda, embora o problema mais grave agora venha da
extrema direita", prossegue Zeca, completando que "ditadura é
ditadura".
Leia abaixo a íntegra do manifesto
CARTA EM DEFESA DA DEMOCRACIA E DA REPÚBLICA: JUNTOS EM FRENTE
Esta carta é dirigida a todos os que professam a democracia e defendem a paz e
a ordem republicana do Estado Social da Constituição de 1988. E é um manifesto em defesa do Brasil, como país soberano, do trabalho como valor fundamental, da construção da nação como comunidade de destino, do empreendedorismo inovador -
em todos os níveis- baseado na inteligência cientifica universal.
As guerras das grandes potencias militares com seus interesses estratégicos
estão transformando o planeta inteiro num catastrófico teatro de ações políticas e
operações militares, que já ameaçam as condições naturais mínimas para a sobrevivência
dos humanos e a soberania das nações. As guerras, em geral, são propagadoras da
barbárie e alimentadoras do autoritarismo e das ditaduras.
Esta Carta propõe que aqui no Brasil, a partir da sociedade civil, propaguemos
um amplo movimento cívico descentralizado, com iniciativas locais, regionais,
nacional - idênticas ou análogas - para defender o futuro da democracia no país. A herança
do governo anterior, com um déficit fiscal de 782 bilhões, desmanche de
instituições e políticas públicas, negação retrógada da inteligência científica universal,
propagação da violência miliciana e o culto da morte - erigidos como política de Segurança
Pública - também são um legado perverso do qual devemos defender o país.
Afirmamos, primeiro, que a solução é mais democracia, não menos; e que isso só
será possível com o suporte de um campo político unificado, capaz de mostrar
diferenças: entre democracia e ditadura; entre frentes políticas eleitorais sem princípios
e frentes eleitorais baseadas em princípios mínimos, tanto voltados para a restauração da
dignidade da política, como da preservação dos Poderes da República.
Esta Carta, portanto, propõe que é possível estabelecer uma comunicação entre
as múltiplas visões democráticas - nos Estados e na própria União - para buscar
pontos de unidade em direção a novas Frentes políticas, com suas especificidades
regionais, já no 1º turno ou, alternativamente, no 2º turno das eleições de 2026, pautando-se
pelos seguintes objetivos:
1. Bloquear a influência no Congresso Nacional, de bancadas oligárquicas e
fisiológicas, que se dedicam a extorquir, para proveito próprio, os orçamentos públicos,
assim subvertendo a relação institucional entre os poderes da União;
2. Defesa dos princípios do Estado de Direito da Constituição de 88 e da
preservação dos seus poderes constitucionais;
3. Defesa de uma política interna e externa, que unifique o país na transição
climática, para uma potente política de prevenção de catástrofes e de redução das
desigualdades sociais e regionais;
4. Compromisso de não firmar alianças com setores de partidos ou partidos, da
direita autoritária e da extrema direita, ou de quaisquer organizações partidárias que proponham ditaduras de qualquer natureza nos processos eleitorais em curso no
ano vindouro.
Estas novas frentes denunciarão tentativas golpistas, defenderão a identidade
laica do Estado, defenderão a profissionalização das Forças Armadas e seus proponentes envidarão esforços desde agora - autônomos, comuns ou associados em rede – para proporcionar múltiplas manifestações e novos manifestos pautados pelos
objetivos ora concertados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário