terça-feira, 29 de abril de 2025

Para Haddad, é ‘ruim’ só Executivo arcar com responsabilidade fiscal

Marcelo Osakabe, Camila Souza Ramos e Guilherme Pimenta / Valor Econômico

Ministro da Fazenda cita medidas legislativas que geraram gastos de R$ 200 bilhões sem que fosse definida origem para os recursos

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta segunda-feira, 28, que tem trabalhado juntamente com os demais poderes para alçar a questão fiscal como uma agenda de Estado, defendida independente da que está no Planalto.

“Tenho conversado com presidente [da Câmara] Hugo Motta [Republicanos-PB]. Acho ruim a responsabilidade fiscal ser uma atribuição exclusiva do Executivo. As medidas tomadas por Legislativo e Judiciário podem prejudicar muito mais que as do Executivo”, afirmou Haddad, que respondia a uma pergunta sobre as prioridades do governo no Legislativo neste ano.

O ministro, que participou do J. Safra Macro Day 2025, em São Paulo, citou quatro medidas aprovadas antes de sua gestão e que, em seus cálculos, teriam resultado em R$ 200 bilhões em despesa adicional sem que se tenha previsto de onde sairiam os recursos: “crescimento do orçamento impositivo, Fundeb triplicou, choque dos precatório e a tese do século”.

“Aí vemos nos jornais críticas sobre a gastança [do governo]. Essa é uma gastança que foi contratada quando? E a pessoa está preocupada com o Pé-de-Meia? Tem alguma coisa errada com o debate público”, criticou.

Haddad também defendeu que o debate sobre os rumos da economia foque no fiscal sem perder de vista ações para elevar o crescimento e investimento. “Não estamos falando de ajuste recessivo, Brasil tem condições de se arrumar sem comprometer suas possibilidades futuras”, defendeu o ministro.

Crescimento
Haddad afirmou acreditar que o Brasil pode crescer nos próximos anos a despeito da turbulência geopolítica e com menor ajuda do governo na expansão dos gastos. “O Brasil vem subinvestindo há muito tempo, e tem um subconjunto de projetos que podem sair da gaveta se acertarmos uma série de políticas”, afirmou.

Citou como exemplos o ritmo acelerado das concessões do Ministério dos Transportes, o conjunto de iniciativas para baixar os spreads e também o esforço para aumentar os investimentos em data centers no Brasil.

“Devo ir para Califórnia esta semana começar a divulgar o marco regulatório do plano nacional de data centers. Somos deficitários na balança de serviços, contratamos 60% da nossa demanda lá fora e isso não se explica, porque o Brasil tem as maiores vantagens competitivas, sobretudo de cabeamento, mas de energia limpa. O lançamento dessa política vai fazer investimento melhorar muito nessa área”, afirmou.

Haddad viaja aos Estados Unidos no fim desta semana para se reunir com gigantes do setor de tecnologia e apresentar a política brasileira de data centers. No Vale do Silício, terá reuniões com executivos do Google, NVidia e Amazon. Também participará de eventos promovidos pelo Milken Institute e pela Amcham Brasil, principalmente para apresentar a investidores a agenda do Ministério da Fazenda e o plano de transição ecológica.

Antes de retornar ao Brasil, o ministro ainda terá reuniões com autoridades do governo mexicano, na Cidade do México. Retorna ao Brasil na madrugada do dia 8 de maio.

Haddad afirmou que, dadas as atuais circunstâncias, é possível virar a chave no sentido de uma política fiscal menos atuante. “Acredito que o crescimento tem tudo para ser puxado por consumo das famílias e investimento. Não precisamos de impulso maior para crescer bem”, declarou, reforçando que esse plano independe do cenário externo.

Para ministro, país pode crescer nos próximos anos mesmo com turbulência geopolítica e menor ajuda do governo na expansão dos gastos

Sem entrar em detalhes, o ministro da Fazenda disse avaliar que o cenário externo turbulento pode se resolver neste ano e que o país tomou a decisão correta ao se manter fiel em sua tradução de não alinhamento externo.

“Não alinhamento é manter canais abertos com três grandes blocos. É uma política acertada com o presidente Lula, que é um grande ativo do país na diplomacia”, disse, lembrando que o trabalho do Brasil na presidência do G20 em 2024 refletiu essa postura.

Haddad também elogiou o trabalho conduzido pelo vice-presidente, Gerald Alckmin, à frente da reação brasileira ao tarifaço, e também citou que o novo contexto deve fazer avançar agendas como a do acordo entre Mercosul e União Europeia. “Estive recentemente com o ministro das Finanças da França e vi da parte do governo francês uma abertura maior. À luz dos acontecimento recentes, vai ganhar impulso.”

Plano de desenvolvimento
Haddad afirmou que o Brasil precisa de um novo Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), uma agenda de Estado que teria como foco do desenvolvimento econômico a sustentabilidade.

“Queremos produzir energia verde, não queremos desperdiçar, queremos deixar de importar serviços tecnológicos de fora. São muitos os objetos do plano de transformação ecológica. A cada etapa desse processo, esse plano vai ganhando um peso maior na economia brasileira”, afirmou o ministro, que depois do Safra Day participou do lançamento do 2º edital do Eco Invest, que tem como objetivo levantar R$ 11 bilhões para financiar a recuperação de áreas degradadas na Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pampa e Pantanal.

No evento do Banco Safra, ele comentou que o país precisa recuperar uma agenda de Estado, que conta com o apoio dos três Poderes e independentemente de qual partido político ocupa o Executivo.

O PND era o nome dado pela ditadura militar para o instrumento que planejava o crescimento da economia brasileira em janelas de tempo, orientando investimentos em setores específicos, entre outras medidas. Ele sucedeu outras iniciativas do tipo, como o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek (1956-1961) e o Plano Estratégico de Desenvolvimento (1967-1970).

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