sábado, 30 de janeiro de 2010

Villas-Bôas Corrêa :: O susto anunciado

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Nos muitos dos 64 anos bem vividos do presidente Lula, especialmente nos sete anos dos dois mandatos, não apenas os amigos da corriola palaciana mas também os companheiros da ascensão do torneiro mecânico de São Bernardo do Campo (SP) ao maior líder operário da história desde país, que fundou o Partido dos Trabalhadores (PT), hoje desgastado, mas que foi a base da sua eleição a presidente da República – testemunham a disposição, a garra com que enfrenta agendas que emendam dias e noites e viagens domésticas e internacionais.

O presidente é de natural bem humorado, brincalhão, e fala pelos cotovelos. Não pode ver gente reunida e um microfone sem deitar falação em improvisos que raramente durem menos de uma hora. Salvo em caso de chuvarada ou apertos da agenda, com o avião da Presidência com os motores ligados para o compromisso nos mais diversos cantos do mundo, que conhece como a palma da mão.

Mas nada justifica que a redobrada vigilância sobre o presidente da República não se tenha dado conta de que a corda estava para arrebentar, que ninguém é de ferro. O inesperado pegou o país no desespero das enchentes que não dão trégua e derrubam casas, destroem cidades e deixam milhares no desespero de não saber como recomeçar depois que perderam tudo, como uma pancada seca na boca do estômago: Lula, por ordem médica, abandonou o avião que o levaria ao Forum Econômico de Davos, na Suíça, onde receberia o crachá de Estadista do Ano para se internar em hospital com suspeita de infarto – felizmente logo afastada com o pronto e competente atendimento no Real Hospital Português.

Desde quarta-feira Lula, a primeira-dama, dona Marisa Letícia, e familiares estão na casa em São Bernardo do Campo. Na próxima semana deverá voltar a Brasília para um meio expediente sob controle médico. E a campanha eleitoral com a inseparável candidata, ministra Dilma Rousseff, também dará uma trégua aos trabalhadores das turmas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do Minha Casa Minha Vida, a ser aproveitada a para o lançamento oficial da chapa, com o vice ainda bailando entre especulações e o favoritismo do presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), também presidente da Câmara dos Deputados.

E Lula será acompanhado pela imprensa, pelas lentes das emissoras de televisão, pela atenção do povão onde quer que apareça. O presidente da República é um servidor da pátria e tem o dever de zelar pela sua saúde e dar o bom exemplo. A obsessão de apresentar a sua candidata, Dilma Rousseff, ao voto, na medida em que se aproxima a hora do início oficial da campanha, até aqui desrespeitado, só tende a aumentar a pressão. A cada rodada de pesquisa sobre as intenções de voto, disparam os batimentos cardíacos. E esta deve ser a última campanha em que a liderança de Lula pode ser o fator decisivo. Na próxima, em 2014, Lula estará com 69 anos.

Além da prioridade compulsória com a saúde, a pauta deste ano até as eleições é de atemorizar: fiscalização de centenas de obras de recuperação da malha rodoviária arruinada pelas enchentes, que ainda não cessaram, reconstruir pontes às dezenas derrubadas e que bloqueiam o transito entre cidades e estados. Além dos desafios políticos: como fica a reforma agrária dos solenes juramentos do PT? E a gastança com o obeso ministério que movimenta o papelório no circo da burocracia? O desafio da crise ética de Brasília, a nova capital desmoralizada pela crise ética dos três poderes e que permanece intocada com o esquecimento maroto da reforma política, será um tema para a oposição na caça ao voto eleitor desencantado, esquivo e com os dentes trincados de raiva e vexame.

A caça ao eleitor vai mobilizar o país na contradição da raiva da decepção e dos oposicionistas que começam a sonhar com um desastre do governo. A cada ano, a prova de fogo, da próxima Copa do Mundo e da realização da Copa de 2014 no Brasil. Desafios repassados aos futuros governos. Como a Olimpíada de 2016. O estadista do ano tem que dar o exemplo: não pode fumar como um suicida. Cabelos brancos que rareiam na coroa, no alto da cabeça, são as marcas do tempo e do juízo.

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