
O jogo limpo é o melhor negócio para o novo governo. Pode ser uma escolha moralmente superior e politicamente muito respeitável, mas é também uma decisão pragmática. A nova administração precisa de credibilidade. Os próximos quatro anos deverão ser difíceis. Para as economias desenvolvidas prevê-se uma convalescença demorada, com desemprego elevado pelo menos por uns dois anos. A arrumação fiscal será lenta e penosa nos Estados Unidos e na maior parte da Europa. Tudo isso poderá afetar o comércio internacional. Além disso, em algum momento será indispensável aumentar os juros no mercado internacional e também isso afetará o Brasil. Internamente, o governo terá de enfrentar os investimentos programados para a Copa do Mundo e precisará combinar esse esforço com a manutenção dos programas sociais. Em suma, a agenda interna será pesada e o governo não poderá contar com o empurrão amigo da prosperidade global.
A nova administração parte de uma situação já desconfortável. Do lado fiscal, será preciso realizar um ajuste estimado por especialistas em pelo menos R$ 54 bilhões. Talvez não possa fazer um corte tão grande, mas precisará pelo menos apresentar um plano confiável para os próximos anos. Haverá resistência mesmo entre os aliados - ou principalmente entre eles. Ao mesmo tempo, o Banco Central terá de conter a pressão inflacionária. Seus dirigentes precisarão aplicar políticas duras. Do lado externo, há o risco de uma deterioração maior da conta corrente, formada pelas balanças de mercadorias e de serviços e pelas transferências unilaterais. O mercado financeiro e as principais consultorias elevaram para US$ 9,5 bilhões sua projeção de saldo comercial. Se estiverem certos, será menos de metade do superávit do ano passado, US$ 20,3 bilhões. Mas continuam prevendo um grande buraco na conta corrente (US$ 67,9 bilhões) e um investimento direto líquido de US$ 40 bilhões. De acordo com essas projeções, será preciso financiar mais de um terço do déficit em conta corrente com endividamento e com capitais aplicados em papéis. Não dá para incluir nessas contas um ingresso repentino de recursos chineses.
Há boas notícias na balança comercial de janeiro, divulgada ontem. O valor da exportação, US$ 15,2 bilhões, foi 28,2% maior que o de janeiro do ano passado. O da importação, US$ 14,8 bilhões, foi 22,8% superior ao de um ano antes. Durante a maior parte do ano passado a importação cresceu bem mais velozmente que a exportação. É cedo para falar em mudança de tendência. Essa seria a melhor novidade. Mas há também notícias menos entusiasmantes. Os preços dos minérios e alimentos continuam sendo a principal sustentação da receita comercial. No ano passado, os preços dos básicos aumentaram 30,4%, enquanto o volume exportado aumentou 11,4%. Em janeiro, a receita dos básicos foi 56,3% maior que a de um ano antes e isso se resultou principalmente das cotações. Não deve ser ambição do novo governo manter o País na dependência da fome chinesa de matérias-primas. É preciso recuperar o dinamismo comercial do setor manufatureiro. Uma política de competitividade não é apenas mais um problema - é a síntese dos desafios econômicos.
Jornalista
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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