As águas de março estão fechando o verão, e o nível de reservatório das hidrelétricas brasileiras está muito abaixo do que deveria estar, se comparado aos anos anteriores. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) calcula que o mês fechará com água em 52% da capacidade dos reservatórios no Sudeste e Centro-Oeste, subindo um pouco acima do ponto atual. Mas isso é o nível mais baixo em 10 anos.
O gráfico com dados do ONS mostra como foi cada fim de março, desde 2003, nas duas regiões onde estão 70% dos reservatórios de água do país. Este ano, o Brasil usou as termelétricas durante todo o verão para poupar água, e a impressão geral foi de um período fortemente chuvoso. O problema é que a água tem caído mais no litoral do que nas cabeceiras dos rios das bacias onde estão as grandes hidrelétricas.
O baixo nível dos reservatórios significa que o país terá que continuar consumindo uma energia mais cara na travessia do período seco, do contrário as usinas podem chegar muito rapidamente num nível crítico. As térmicas funcionam a gás, óleo combustível e diesel. No caso do gás, a fonte é também matéria-prima para a indústria. A Associação Brasileira das Distribuidoras de Gás Canalizado disse que pelo segundo mês consecutivo houve mais uso de produto para a geração de energia do que para insumo industrial. No caso do diesel, é combustível para os caminhões e ônibus. Além disso, o custo por MWh é muito maior do que as outras fontes de energia. O cobertor vai ficando curto.
Há várias contas sendo feitas no setor elétrico sobre o impacto do uso das térmicas. Uma das menos assustadoras é a do Instituto Acende Brasil, que fala num custo acumulado de R$ 6 bilhões este ano.
As regiões Sudeste e Centro-Oeste são as mais importantes em termos de geração de hidroeletricidade. Os reservatórios estão, atualmente, antes do fim do mês, em 45% do nível máximo. É o mais baixo desde 2003.
O que causa estranheza no não especialista é que este ano o verão pareceu muito chuvoso, principalmente no litoral do Rio e São Paulo, com, inclusive, a repetição de calamidades públicas. Mesmo assim, a chuva não caiu nos lugares certos.
Há vários problemas no setor de energia. Um é que esse custo extra da energia térmica virou uma batata quente na mão do governo. Ele não pode repassar para o consumidor porque isso anularia o efeito benéfico da queda do preço da energia que foi anunciada em clima de campanha eleitoral. Quando um assunto técnico é politizado, não se encontram boas soluções.
O que o governo está avisando é que vai dividir com as geradoras parte do custo e entregar uma parte para o Tesouro. Isso será um retrocesso no esforço de tornar mais transparente a conta de luz, além de ser um peso indevido para as geradoras carregarem. Tudo isso para manter uma parte da redução oferecida como um presente do governo aos consumidores-eleitores.
As empresas estão descapitalizadas, e os investidores privados, assustados com o grau de intervencionismo no setor. Isso pode significar menos investimentos no futuro.
Como o ano que vem é eleitoral - e ano da Copa do Mundo - o país não poderá correr o risco de falta de energia. Portanto, a perspectiva é de continuação do uso das termelétricas para complementar e poupar as hidrelétricas. Mas isso elevará ainda mais esse custo.
O melhor é torcer para que as chuvas continuem mais um pouco além de março e que desta vez caiam nos lugares certos para aumentar o nível dos reservatórios. E torcer também para um pouco mais de racionalidade - e menos de política eleitoral - na questão do abastecimento da energia no Brasil.
Fonte: O Globo
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