segunda-feira, 23 de abril de 2018

Celso Rocha de Barros: Teremos novos partidos?

- Folha de S. Paulo

Movimentações mostram grandes vazios na centro-esquerda e na extrema direita

É claro que teremos novas legendas. Todo dia alguém muda de nome, passa a se chamar "Patriotas", "Podemos", "Avante", "Maria Eunice", e nada disso tem a menor importância. Mas e partidos, partidos no sentido forte, como PT e PSDB foram nos últimos vinte, trinta anos? Agremiações com ligações fortes com setores sociais específicos, defendendo programas razoavelmente distintos entre si?

Pode surgir algo de novo dos escombros do sistema partidário esvaziado pela Lava Jato?

As movimentações em torno da campanha presidencial mostram dois grandes espaços razoavelmente vazios no espectro ideológico, que podem vir a ser ocupados por novos partidos suficientemente vertebrados: a centro-esquerda e a extrema direita. O PT perdeu o controle da esquerda moderada, e o PSDB perdeu o controle da direita radical.

As intenções de voto em Lula continuam impressionantes, mas também é notável que a soma das intenções dos candidatos de centro-esquerda —Marina, Ciro, Joaquim Barbosa— é bastante expressiva. Mesmo que nenhum dos três candidatos desista em favor do outro, é possível que seus militantes se encontrem em 2019 em algum esforço de reconstrução partidária.

O PSB, em especial, vem retomando uma trajetória que, embora tenha ficado fora do radar de muitos analistas, já é longa. O PSB sempre foi o aliado moderado do PT por excelência, desde a eleição de 1989. Era mais ou menos esperado que o PSB nordestino —que teve entre seus quadros, em um dado momento, Eduardo Campos e Ciro Gomes— eventualmente exigisse uma cabeça de chapa na aliança com o PT. Há gente razoável que acha que o maior erro de Lula foi não fazer esse movimento já em 2010.

PSB e Marina concorreram juntos em 2014, Ciro já foi do PSB, e socialistas, trabalhistas e os comunistas do PC do B (mais distantes do centro) formaram por muito tempo um bloco parlamentar. Não seria difícil imaginar que essas forças se aglutinem caso o PT se distancie demais do centro. Em outro cenário, poderiam se unir ao PT em um partido completamente novo de perfil moderado.

Do outro lado, ou, mais precisamente, muito mais para o outro lado, a direita radical parece ter se consolidado como identidade política no Brasil. O eleitorado bolsonarista é convicto, tem raízes históricas no militarismo e no conservadorismo religioso, e, mais recentemente, encontrou um vocabulário ideológico na extrema direita do partido republicano.

De qualquer forma, qualquer que seja o resultado da eleição presidencial, alguma versão da direita bolsonarista deve encontrar expressão partidária e passar a fazer parte da paisagem. Nesse caso, a direita moderada passará a ter o problema que a esquerda moderada teve esses anos todos: terá que aprender a dialogar e controlar seus exaltados. Não é fácil, porque extremista de esquerda em geral é professor universitário ou sem-terra, mas extremista de direita volta e meia é general.

Se esses movimentos ajudarem a consolidar um novo quadro partidário brasileiro, que venham logo. O maior risco para o Brasil, no momento, mais do que qualquer problema fiscal ou social, é ficar sem partidos fortes, os únicos antídotos conhecidos contra os personalismos que já acabaram com mais um país latino-americano.
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Celso Rocha de Barros, doutor em sociologia pela Universidade de Oxford.

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