quarta-feira, 24 de agosto de 2022

Bernardo Mello Franco - Dom Pedro sobe a rampa

O Globo

Monarquismo é a doença infantil do bolsonarismo; presidente tenta usar o coração do imperador em sua campanha à reeleição

A ideia foi bizarra até para os padrões do governo atual. A pretexto de festejar o bicentenário da Independência, Jair Bolsonaro mandou trazer de Portugal o coração de Dom Pedro I. O órgão desembarcou em Brasília na segunda-feira, mergulhado num pote de formol.

Pedro de Alcântara Francisco António João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon morreu em 1834. Seu corpo foi enterrado no panteão real em Lisboa. O coração foi levado ao Porto, onde fica trancafiado numa igreja.

O órgão descansou em paz durante 188 anos. Agora saiu da urna de mogno para servir ao projeto político de Bolsonaro. À revelia, o imperador foi transformado em cabo eleitoral do capitão.

A víscera subiu a rampa do Planalto com honras de chefe de Estado. Aviões da Esquadrilha da Fumaça desenharam um coração no céu de Brasília. A artilharia de campanha disparou 21 tiros de canhão. Criancinhas cantaram o hino e agitaram bandeiras do Brasil.

Tudo seria apenas mórbido se não envolvesse o desperdício de dinheiro público. A Presidência e o Itamaraty ainda não divulgaram os custos da operação.

O monarquismo é a doença infantil do bolsonarismo. Nas manifestações da extrema direita, bandeiras do Império costumam dividir espaço com cartazes golpistas e camisetas da seleção. Em 2018, Bolsonaro quase escolheu como vice um descendente do imperador, que se apresenta como “príncipe”. O cavalheiro se elegeu deputado e agora tenta o segundo mandato pelo PL. Ontem desfilava sorridente pelo palácio presidencial.

Em discurso rápido, o capitão repetiu um lema de sua campanha à reeleição: “Deus, pátria, família”. O slogan foi roubado de Mussolini, que também explorava símbolos da monarquia para conseguir apoio popular.

Ao importar o coração de Dom Pedro, Bolsonaro se inspirou em outro tirano. Em 1972, Emílio Garrastazu Médici mandou trazer os restos mortais do imperador para as comemorações do Sesquicentenário da Independência. A ossada foi doada por Portugal, que também vivia sob uma ditadura.

O general tinha mais prestígio do que o capitão. O coração embebido em formol foi apenas emprestado ao Brasil. Terá que ser devolvido no próximo dia 8, a três semanas da eleição.

2 comentários:

Anônimo disse...

O coração do Dom Pedro foi recebido pelo GENOCIDA SEM CORAÇÃO... Que DESgoverno é este?

ADEMAR AMANCIO disse...

Gastando tempo e dinheiro com bobagem.