O Estado de S. Paulo
São estas as duas peças-chave para o cumprimento da meta fiscal deste ano: alta das receitas e contenção possível das discricionárias
Os dados do Tesouro Nacional até agosto
indicam qual será a tônica das ações da equipe econômica nos últimos quatro
meses de 2024, visando a cumprir a meta fiscal: aproveitar o crescimento da
arrecadação e conter o ritmo dos gastos não obrigatórios.
Vale lembrar, o objetivo de resultado
primário do governo central é zero, mas com uma margem de tolerância de R$ 28,8
bilhões e a exclusão, para o cálculo da meta, do suporte ao Rio Grande do Sul.
No último relatório bimestral, o déficit
estimado pelo Executivo foi de R$ 68,8 bilhões. Possivelmente o déficit será
menor, já que nem todos os créditos abertos em favor das regiões afetadas pelas
enchentes deverão ser utilizados, a exemplo dos mais de R$ 7 bilhões destinados
ao leilão de arroz.
A arrecadação cresceu 8,8%, até agosto, descontada a inflação. O crescimento do PIB, ao elevar a renda disponível, é acompanhado pelo aumento do consumo, da massa salarial e dos lucros, com os tributos incidentes sobre esses componentes seguindo a dinâmica da produção. E algumas medidas enviadas pela equipe econômica vêm surtindo efeito, embora não se saiba ao certo a contribuição de cada uma.
A Lei 14.592, de 2023, alterou a base de
cálculo do PIS/Cofins, o que se somou ao retorno, a partir de meados de 2023,
da incidência dessas contribuições sobre combustíveis. Até agosto, o PIS/Pasep
cresceu 22,4% e a Cofins, 21,4%, em termos reais.
Já a Lei 14.754, de 2023, mudou a sistemática
de tributação de fundos exclusivos e offshores, alavancando o IRRF-Capital e o
IRPF, que tiveram avanços de 21,9% e 18,0%, respectivamente.
Outra medida que está rendendo bons frutos é
a limitação ao uso de compensações tributárias oriundas de ação judicial,
originada da Medida Provisória 1.202, de 2023. De janeiro a agosto, os débitos
compensados com créditos obtidos dessa maneira registraram queda de R$ 28,3
bilhões.
Como parte da arrecadação é
constitucionalmente repartida, é mais relevante, do ponto de vista da União, o
desempenho da chamada receita líquida, obtida da diferença entre receita total
e transferências a Estados e municípios. Estas cresceram 8,4% até agosto,
variação de magnitude inferior ao crescimento da arrecadação bruta, mas ainda
bastante expressiva.
O caixa da União deverá ser reforçado
adicionalmente nos próximos meses pelas medidas pactuadas com o Congresso como
forma de compensar a desoneração da folha. Prevista na Lei de Responsabilidade
Fiscal, a compensação só será possível por conta da atuação da equipe econômica
junto ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Do lado dos gastos, as vinculações ao salário
mínimo, conjugadas com a ampliação do número de beneficiários, elevaram em 3,4%
os pagamentos de benefícios previdenciários e em 16,6% os desembolsos com o
Benefício de Prestação Continuada. Vale dizer, o dito pentefino dos gastos
sociais se iniciou por esses dispêndios, uma vez que a ampliação expressiva
verificada a partir de 2022 do público atendido por essas políticas não se
justifica, do ponto de vista demográfico.
Outro conjunto de dispêndios tem seus
desembolsos atrelados ao desempenho da arrecadação, como gastos com saúde,
educação e emendas parlamentares. Em consequência do ótimo desempenho das
receitas, as despesas sujeitas à programação financeira com saúde avançaram, em
2024, R$ 32,2 bilhões, a preços de agosto.
Resultado dessas vinculações e do auxílio ao
Rio Grande do Sul, que nos oito primeiros meses do ano somou R$ 11,9 bilhões, a
despesa total cresceu 7,1%. Porém, mais que um obstáculo ao atingimento da meta
de primário deste ano, esses gastos vinculados indicam dificuldades para o novo
arcabouço fiscal se consolidar nos exercícios subsequentes.
Isso pois o regramento impõe uma limitação de
crescimento de 2,5% dos dispêndios, o que em 2024 será possível graças à
contenção de gastos não obrigatórios. Após o terceiro relatório bimestral, o
Executivo vem adotando cortes de despesas discricionárias, além de um
faseamento (liberação limitada mensalmente) nesses desembolsos.
Se por um lado as despesas discricionárias
avançaram 16,7% no ano, por outro a margem de manobra do Poder Executivo
descrita acima permitiu que esses gastos tivessem queda de 43,3% em agosto
contra mesmo mês do ano anterior.
Possivelmente, o resultado em tal período foi
afetado ainda pelo congelamento das emendas impositivas pelo STF, o que não
invalida, de qualquer maneira, o movimento da equipe econômica para limitar os
gastos de 2024, em consonância com o regramento fiscal.
São estas as duas peças-chave para o
cumprimento da meta deste ano: alta das receitas e contenção possível das
discricionárias.
Até agosto, o déficit primário foi de R$ 100
bilhões, resultado 9,1% melhor que o verificado no mesmo período de 2023. Com a
exclusão dos dispêndios relativos ao Rio Grande do Sul, o saldo torna-se
negativo em R$ 88,1 bilhões. Consequentemente, o esforço fiscal adicional
exigido no último quadrimestre é de R$ 59,3 bilhões. Não será simples, mas
atingir a meta fiscal de 2024 está ao alcance das mãos do governo.
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