"De uma vez por todas, é preciso que, no Brasil, a lei valha para
todos" (Roberto Gurgel, procurador-geral da Republica)
No início de 2006, quando o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), da CPI dos Correios,
divulgou seu relatório final sobre o caso do mensalão denunciado por Roberto
Jefferson em meados do ano anterior, jornalistas de Brasília procuraram Lula
para ouvi-lo a respeito. Diante de assunto incômodo, como é do seu feitio, Lula
se esquivou. E disse: "Não vou ler. Aguardarei o pronunciamento final da
Justiça"
Alguns meses antes, Lula ocupara rede nacional de televisão para,
aparentemente constrangido, pedir desculpas aos brasileiros. Lamentou tudo o
que tinha ocorrido, numa admissão velada de que algo de muito grave tinha
ocorrido de fato. Ora olhando para a câmera, ora para o teto, se disse traído.
E apunhalado pelas costas. Não revelou o nome dos traidores. Nem de quem o
apunhalara.
Se o tivesse feito daria margem para que seus desafetos alardeassem:
"Estão vendo? Tanto ele sabia da existência do mensalão que não teve
dificuldade em identificar os mensaleiros." De lá para cá, Lula tratou o
caso de duas maneiras. A primeira: garantindo que tudo seria apurado pela
Justiça, e os culpados punidos. A segunda: afirmando que o mensalão não passara
de uma farsa. De uma grande farsa.
A primeira maneira serviu para que Lula atravessasse como um coitadinho os
meses que faltavam para a eleição de 2006. Reeleito, adotou a segunda maneira.
O que existira, o que fora chamado de Caixa 2, o que resultaria em punições,
cedeu lugar à teoria da farsa. E se fora uma farsa ... Bem, nada mais lógico do
que deduzir que ninguém pagaria por ela. Sem crime, sem culpados.
Lula bateu à porta de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) empenhado
em convencê-los a adiar o julgamento do processo do mensalão. Não porque
temesse a punição dos seus comparsas. Como eles seriam punidos, se Lula e Dilma
juntos haviam nomeado sete dos atuais dez ministros? Nada mais republicano do
que esperar que tais ministros votassem, para poupar seus padrinhos de
constrangimentos.
O adiamento pretendido por Lula tinha a ver com 0 fato de que o julgamento
poderia correr paralelamente a campanha eleitoral. Lula temia que o PT perdesse
com isso. O PT perdeu com a atitude de Lula de interferir no calendário da
Justiça. E deve ter perdido alguns votos em São Paulo, com a contaminação do
debate político pelo julgamento. Lula tinha razões para se preocupar. E nenhuma
para se meter.
Agora, às vésperas de o STF confirmar o nome dos que o traíram, Lula elogiou
o voto do ministro Ricardo Lewandowski, que absolveu o ex-ministro José Dirceu.
Para ele, Lewandowski foi claro e abordou "questões centrais" durante
a sua exposição, segundo Gustavo Uribe, repórter do GLOBO. Lula tem repetido
que não existem provas capazes de mandar para cadeia o acusado de ter chefiado
o esquema do mensalão.
Cadê o Lula que se recusou a ler o relatório da CPI dos Correios porque
preferia aguardar o pronunciamento da Justiça? E cadê o Lula que garantia estar
convencido de que a Justiça apuraria o caso e puniria os culpados? O gato
comeu. Não comeu. O Lula que disse tudo aquilo era apenas um farsante. Confiram
o que ele dirá tão logo termine o julgamento.
O comportamento de Lula em relação aos mensaleiros é típico de quem se sabe
culpado pelo crime que os outros pagarão sozinhos. De resto, é típico também de
quem se sente refém de segredos. Marcos Valério espera receber em dobro a
atenção e o carinho que mereceu do PT até aqui. Do contrário...
Fonte: O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário