Avaliação é que novos presidentes da Câmara e do Senado precisam mais do apoio de Dilma do que o contrário
Júnia Gama
BRASÍLIA - O Palácio do Planalto detectou um movimento de autoafirmação feito pelo Congresso ontem, quando decidiu adiar a votação do Orçamento da União deste ano. A presidente Dilma Rousseff, no entanto, já esperava que os novos presidentes da Câmara e do Senado, Henrique Alves (PMDB-RN) e Renan Calheiros (PMDB-AL), respectivamente, e os novos líderes nas duas casas dessem essa demonstração de autonomia na estreia dos trabalhos. Embora observando com atenção cada passo do Congresso, a princípio, o adiamento da votação não foi motivo de grande preocupação no governo.
Existe uma avaliação de que a margem de barganha, principalmente de Henrique e Renan, é limitada: eles foram eleitos sem grande margem de folga, com o PMDB rachado, enfrentam processos na Justiça e têm a rejeição da opinião pública. Os dois parlamentares desejam disputar o governo de seus estados em 2014 e, portanto, precisam mais de Dilma, que pode lhes dar votos, do que Dilma deles - especialmente porque neste ano não tem grandes questões para serem analisadas pelo Congresso.
Congresso acha que recebe menos do que dá
Por isso, o Planalto interpretou o gesto como sendo voltado para "consumo interno", uma tentativa desses parlamentares ganharem musculatura junto aos seus pares com demonstrações de força do Congresso. A principal queixa em todas as bancadas na Câmara e no Senado se refere à atrofia do Legislativo em relação aos outros Poderes. Nos dois primeiros anos de governo Dilma, o Executivo cobrou muito mais do que deu aos parlamentares, que reclamam da falta de liberação de emendas e de "tratoramentos" do Planalto para votação de temas caros ao governo. Foi justamente com a proposta de retomar a autonomia que Alves e Renan foram eleitos.
Na manhã de ontem, Dilma fez a primeira avaliação da nova configuração do Parlamento em reunião com a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) e com os três líderes do governo no Congresso: Eduardo Braga (PMDB-AM), do Senado; Arlindo Chinaglia (PT-SP), da Câmara, e José Pimentel (PT-CE), do Congresso.
Além de avaliar que o poder de barganha dos caciques peemedebistas está fragilizado, o Planalto também joga com a ameaça de levar o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), para o lugar hoje ocupado pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB) na chapa da reeleição em 2014. O aviso é sempre lembrado por pessoas próximas a Dilma como forma de limitar a liberdade de ação do PMDB. Para o governo, se o Orçamento for realmente aprovado depois do Carnaval, como prometeu Renan Calheiros, não haverá mal-estar.
Institucionalmente, a presidente Dilma manterá o canal de diálogo com o Congresso por meio dos presidentes das duas casas e dos líderes partidários. Mas pretende transformar o vice-presidente Michel Temer, presidente de honra do PMDB, em um interlocutor mais frequente. Os dois teriam uma audiência privada no final da tarde do ontem, que foi adiada mas deverá acontecer ainda esta semana.
Enquanto o PMDB não estiver causando problemas reais para o governo, a presidente Dilma não pretende descuidar do aliado: quer fazer de Temer interlocutor privilegiado do Planalto no Congresso, uma espécie de coordenação política paralela.
Também volta às rodas de conversas no governo que Dilma já admite a possibilidade de ter mais generosidade com o PMDB na partilha de cargos, atendendo, por exemplo, à velha reivindicação do partido de ter um ministério com porteira fechada.
O papel da presidente, afirmam seus interlocutores, é cuidar do principal aliado da coalizão governista. Assim, ela faz o contraponto à ação política do ex-presidente Lula, que, para não perder o PSB de Eduardo Campos, joga com a possibilidade de rifar o PMDB da chapa da reeleição em 2014.
Fonte: O Globo
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