- Folha de S. Paulo
A solução para o afastamento de Eduardo Cunha não foi a indicada. Teria mais aderência à Constituição a cassação do mandato pelos pares do presidente da Câmara, em vez da via judicial.
O que fazer, entretanto, nesse caso extremo e ostensivo de abuso de prerrogativas funcionais em causa própria? O óbice interposto era tamanho que inviabilizava a solução parlamentar do processo.
Desafiava-se o enunciado basilar das sociedades democráticas: todos são iguais diante da lei. Projetava-se sobre o conjunto dos servidores públicos o antiexemplo do tiranete de repartição, disposto a fazer o diabo para livrar-se de punições.
Tem limites, concluiu o Supremo, até a ampla esfera de proteção concebida para salvaguardar do arbítrio os representantes da população eleitos. Deputados, senadores e seus presidentes detêm prerrogativas específicas, mas não deixam de ser funcionários do Estado para a aplicação da lei.
A crise deflagrada por dez anos de descomedimento do poder político e econômico vai produzindo corretivos importantes e duradouros nas regras de jogo da jovem democracia de massas brasileira.
A decisão de Teori Zavascki, com endosso unânime da corte, é uma de pelo menos quatro peças cruciais nessa correção de rota. As outras são o pedido de impeachment da presidente Dilma, a decretação da prisão do senador Delcídio e a anulação da posse de Lula no ministério.
Todas decorrem de o tecido constitucional ter sido esticado pelos autores dos abusos até fronteiras inexploradas. Todas traduzem respostas restauradoras e revigorantes de um pacto civil inclusivo.
Deveriam ser lidas, compreendidas e criticadas por quem pretende participar do debate enriquecido sobre os rumos do país. Se os americanos produziram seus antológicos textos federalistas no fim do século 18, os brasileiros vamos, com mais vagar e tropeços, compondo os nossos.
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