• Projeto para criminalizar o dinheiro doado sem registro para políticos não passava de truque para isentar todos os que se beneficiaram dele até agora
No pano de fundo de tudo estão as já célebres gravações feitas pelo ex-apaniguado de Renan Calheiros na Transpetro, subsidiária da Petrobras, Sérgio Machado, com o próprio presidente do Senado e outros caciques do PMDB — Romero Jucá e José Sarney, ex-presidente da República.
Com trechos de conspiração explícita contra a Operação Lava-Jato, os diálogos serviram para chamar atenção sobre manobras parlamentares a fim de tornar inócuas as investigações do grande esquema de corrupção montado pelo lulopetismo, de que se beneficiaram também o PMDB e o PP, especialmente mas não só.
No domingo, O GLOBO alertou que na segunda deveria entrar na pauta de votação da Câmara um Cavalo de Troia. Na aparência, algo desejado, a criminalização do caixa dois; tanto que o projeto se valeu de uma das dez propostas do Ministério Público para aperfeiçoar as armas do Estado no combate à corrupção. Na realidade, porém, escondia-se no projeto uma anistia para políticos com ou sem mandatos que se beneficiaram de dinheiro de empresários recebido “por fora”.
Ao criminalizarem agora o caixa dois — planejaram os articuladores do plano —, tudo o que aconteceu no passado, nos subterrâneos financeiros da política, não poderia ser usado pelo Ministério Público para denunciar os beneficiários desse dinheiro sujo. Pois o efeito das leis não pode retroagir.
Manobra sob medida para isentar citados em delações premiadas como receptadores desse tipo de dinheiro — como Jucá, por exemplo — até a promulgação da lei. Um motivo para a pressa na tramitação do projeto é que se aproxima a definição sobre a provável contribuição premiada de Marcelo Odebrecht e de executivos da empreiteira, na qual seriam listados cem políticos beneficiados com “caixa dois eleitoral” e “caixa dois com propina”, algo assim. Mas não seria fácil. Pois esta é uma distinção difícil de fazer, porque tudo é crime. Mesmo que alguns entendam que seria inócuo o projeto da criminalização, o deputado Miro Teixeira (RJ) e o senador Randolfe Rodrigues (AP), da Rede, cada um em sua Casa, ajudaram a impedir que o golpe — este sim — fosse desfechado.
Esta anistia por decurso de prazo, além de ir contra preceitos constitucionais da exigência de moralidade e probidade do homem público, entraria em conflito com o artigo 350 do Código Eleitoral, onde se estabelece pena de cinco anos de prisão para quem omite informações em “documento público”. Há, como sempre, controvérsias jurídicas, mas é inadmissível admitir esta anistia pela porta dos fundos, matreira.
Não se deve, porém, considerar que tudo está resolvido. Os interesses são pesados e transitam nos bastidores longe da vigilância da opinião pública. Deverão ocorrer novas manobras para restabelecer a impunidade de sempre. Quando um destaque para votação em separado fatia artigo da Constituição no Senado, para livrar Dilma da perda de direitos políticos, tudo é possível.
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