Há menos riscos ameaçando a economia global no curto prazo, mas o futuro não será nada promissor no longo prazo, pelo que se depreende dos documentos que o Fundo Monetário Internacional divulgou antes de sua reunião anual. O ritmo de crescimento global foi rebaixado mais uma vez, para 3,1%, e deve melhorar um pouco no ano que vem, para 3,4%. Países emergentes importantes, como Brasil e Rússia, estão saindo da recessão, enquanto que a China tem conseguido calibrar a desaceleração de sua economia às custas de novas injeções de crédito, empurrando problemas graves para a frente. A saída do Reino Unido da União Europeia não provocou as ondas de choques que se temia. Tudo isso desanuviou as incertezas.
Mas o horizonte para as economias avançadas é de baixo crescimento, ameaça ainda presente de deflação, produtividade em queda, baixo investimento e políticas monetárias expansionistas - ambiente propício à eclosão de novas crises. O baixo crescimento impede resolução mais rápida da desalavancagem das empresas e das famílias, a espiral de endividamento que antecedeu a crise financeira de 2008 e que ainda ameaça as economias avançadas e algumas emergentes.
Segundo o FMI, a pilha de débitos globais atingiu o recorde de US$ 152 trilhões, ou 225% do PIB mundial. Dois terços deles, ou US$ 100 trilhões, são do setor privado. "O elevado débito privado não apenas aumenta as chances de um crise financeira como também dificulta o crescimento, pois devedores muito endividados eventualmente diminuem seu consumo e investimento", em um círculo vicioso apontado pelo Monitor Fiscal.
Não deixa de ser surpreendente que dívidas elevadas provocadas por um boom de crédito em várias economias avançadas continuem crescendo após um quase colapso econômico. Para o FMI, o processo, previsível após uma crise financeira, ainda levará mais tempo do que o previsto na ausência de uma recuperação econômica mais robusta - que não está no horizonte.
Os técnicos do FMI olharam para o passado - 27 episódios em economias ricas entre 1980 e 2006 - e constataram que a desalavancagem levou em média 5 anos. Assim, tomando como ponto de partida 2009, o FMI constatou que a resolução do problema deveria estar bem avançada. Não está: a redução das dívidas privadas foi de apenas um terço em relação aos precedentes históricos e os níveis de endividamento agora "são significativamente maiores".
O FMI recomenda ações fiscais para coadjuvar a política monetária e propõe, quando for o caso, o uso de subsídios e outros incentivos para alongar o prazo das dívidas, sanear bancos com créditos não pagos etc. No entanto, essa não é uma receita geral e tem inconvenientes. Um deles é que a dívida pública também cresceu nos países desenvolvidos durante esse período. O outro é que, dependendo da saúde fiscal no início da crise, não há espaço para o impulso fiscal.
Se a deterioração das contas públicas antecedeu ou foi concomitante à piora dos balanços privados e das famílias, a recessão decorrente não poderá ser tratada com medidas anticíclicas. É o caso de alguns países desenvolvidos e, aponta o Fundo, de países emergentes sistemicamente importantes, como o Brasil. "Países que começam a crise financeira em uma fraca posição fiscal têm que cortar gastos públicos em um momento em que seus efeitos multiplicadores fiscal são provavelmente altos", assinala o Monitor.
O documento detalha a situação brasileira. A dívida bruta, de 63,7% do PIB em 2007, crescerá nos próximos anos até chegar a 93,6% do PIB em 2021, 30 pontos percentuais acima da média da América Latina. A dívida líquida avançará nesse período 13,1 pontos percentuais do PIB. Supondo que a PEC do teto de gastos seja aprovada, o FMI prevê um mirrado superávit primário de 0,3% em 2020. O déficit nominal (inclui juros), será em 2021 de 6,4% do PIB, quase o triplo dos 2,17% do PIB de 14 anos antes. O diferencial entre juro e crescimento - quando negativo, a dívida cai - será positivo em 4,1% de 2016 a 2021.
Por isso a missão do FMI que esteve no Brasil sugeriu que, logo que possível - quando o crescimento voltar - o governo busque, com medidas também pelo lado das receitas, um superávit primário de 3,5% do PIB ao longo de cinco anos. É pouco provável esperar algo nesse sentido de um governo que tem pouco mais de dois anos pela frente e depende de uma base partidária pouco estável.
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