- O Globo
O TCU deu ontem a segunda nota vermelha para a ex-presidente Dilma, encerrando o debate que começou com a rejeição das contas de 2014. Também inabilitou para cargos públicos o ex-ministro Mantega e o ex-secretário do Tesouro Arno Augustin. O que Dilma fez com as contas, os bancos públicos, a meta fiscal e o Orçamento não pode ser feito. A decisão do Tribunal marcará as futuras administrações.
Ficou claro ontem que em 2015 foram cometidos os mesmos delitos que em 2014. Tanto que dos R$ 74 bilhões pagos aos bancos federais e FGTS, no fim do ano passado, R$ 21 bilhões se referiam aos atrasos de 2015 e os outros R$ 53 bilhões eram de anos anteriores. Somente de juros, o governo gastou R$ 4,5 bilhões. No segundo mandato, a presidente tentou reduzir a velocidade da bicicleta, mas havia pedalado tanto nos anos anteriores que não foi possível interromper as más práticas contábeis.
Um dos argumentos usados pela defesa de Dilma era que, se a meta era anual, e no fim das contas foi aprovada a mudança para um déficit de R$ 118 bilhões, não houve qualquer irregularidade nos decretos de expansão de gastos quando o valor original não estava sendo cumprido. O que o ministro José Múcio Monteiro respondeu é que a meta é sim anual, mas o que aconteceu no fim do ano não convalidou os erros anteriores. No período em que a presidente aprovou os decretos ampliando as despesas, o governo não estava cumprindo a meta fiscal que estava em vigor.
Isso parece um detalhe temporal, mas é fundamental que tenha ficado consagrado pela votação unânime do Tribunal. O contrário seria a desmoralização completa da meta fiscal. Qualquer governante poderia descumprir o que estava aprovado como objetivo para as contas públicas do ano, desde que antes do fim do exercício aprovasse outro número, do tamanho do rombo acontecido. O ministro José Múcio explicou que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) determina o monitoramento das contas com os relatórios bimestrais, exatamente para que o governo verifique se está na rota adequada.
O debate incandescente sobre se o que houve entre o Tesouro e os bancos federais foi ou não operação de crédito foi encerrado no relatório. Um atraso eventual de um ou dois dias nas contas dos bancos através das quais o governo executa suas políticas sociais não é operação de crédito. Mas seis meses ou um ano de atraso “não é um prazo razoável”, disse José Múcio. E é sim “abuso do poder do controlador” sobre os bancos, exatamente o que o “legislador quis evitar” ao escrever o artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Todos os outros argumentos da ex-presidente em sua defesa foram derrubados. Aceito apenas o uso de MP para os créditos extraordinários. O relator sugeriu que o Congresso discuta o assunto para aperfeiçoar o uso desse instrumento para ampliação de gastos.
O procurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Paulo Bugarin, disse que a decisão do Tribunal ajudará o país a “resgatar a dignidade da lei orçamentária” e servirá para que os futuros governantes evitem o caminho de transformar o Orçamento numa peça de ficção. Durante o julgamento da presidente Dilma no Senado, o ministro Ricardo Lewandowski não aceitou que o procurador Júlio Marcelo fosse testemunha da acusação. Considerou-o impedido e declarou sua suspeição. O mesmo Lewandowski achou que o ex-ministro Nelson Barbosa não estava impedido. Ontem foi um dia em que a verdade triunfou mais uma vez. As teses defendidas pelo procurador Júlio Marcelo não eram partidárias nem coisa de militante. Foram aceitas no voto do relator, que recomendou a não aprovação das contas de 2015. E o relatório foi aprovado pela unanimidade dos ministros.
O que falta agora é o Congresso analisar as contas. As de 2014 estão ainda paradas sem serem analisadas. O mesmo Congresso que em alguns meses discutiu, ouviu as partes, analisou e votou o processo de impeachment baseado na acusação de que Dilma cometeu crime contra as leis fiscal e orçamentária do país não encontrou tempo para analisar essas mesmas contas.
A rejeição das contas da Presidência da República pelo TCU por dois anos seguidos e a inabilitação para cargos públicos de um ex-ministro da Fazenda e de um ex-secretário do Tesouro vão servir de parâmetro e orientar futuros governantes do país. A Lei de Responsabilidade Fiscal veio para ficar.
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