O Globo
A Polícia Federal americana pescou os
lambaris, falta o peixe gordo
Amanhã completa-se um ano da insurreição
trumpista que pretendia melar o resultado da eleição de Joe Biden. Cinco dias
depois da invasão do Capitólio, Steven M. D’Antuono, chefe do escritório de
Washington do Federal Bureau of Investigation (FBI), avisou: “Nossos agentes
vão bater na tua porta”. Até agora, bateram numas mil portas e prenderam ou
indiciaram 724 pessoas de 45 estados americanos. Abriram 170 investigações e
partiram da análise de 100 mil peças de comunicação digital. Sem lavajatismo,
quase todo dia havia alguém sendo interrogado. O sujeito dizia que esteve no
Capitólio por dez minutos, e o FBI mostrava, com vídeos, que ele esteve lá das
14h45 até por volta das 15h05, com um amigo que agarrou um policial e empurrou
uma porta. Outro achou que passara despercebido, e o FBI bateu à sua porta em
outubro, mostrando-lhe que esteve no Capitólio por pelo menos 17 minutos.
Outros, que posaram ao lado de estátuas ou quadros, foram logo achados. Um
discreto desordeiro que passou despercebido articulou um ataque a uma prisão.
Seu cúmplice era um agente disfarçado.
Os agentes procuraram agulhas no palheiro, mas nunca dispuseram de tantos meios para achá-las. Exibicionistas incriminaram-se nas redes sociais. Além disso, o FBI rastreou os celulares que estavam ligados no Capitólio e na vizinhança durante as horas dos distúrbios. A isso somaram-se as câmeras dos policiais e pistas oferecidas por centenas de pessoas.
Sempre sem lavajatismo, em junho os
condenados eram cem. Alguns tomaram penas leves, com liberdade condicional;
outros, que vandalizaram o prédio ou agrediram policiais, tomaram até cinco
anos de cadeia. Boa parte da turma que arrombou janelas foi alcançada. Um
deles, apanhado em julho, estava com a mulher e dois filhos. Entre os atletas
que escalaram as paredes do prédio havia um fuzileiro naval da reserva. Também
havia sido fuzileiro o primeiro a entrar à força na Rotunda do Capitólio, às
14h25. O rapaz de 19 anos que se filmou botando os pés sobre a mesa da
presidente da Câmara, Nancy Pelosi, foi alcançado em abril. O palhaço que
circulou com roupa de bicho e chifres na cabeça foi alcançado três dias depois
e tomou até 41 meses de prisão. Queria notoriedade, tornou-se exemplo.
Havia de tudo naquela multidão: jovens,
velhos, famílias, veteranos, pastores, policiais (alguns pastores policiais),
professores e malucos fantasiados, todos movidos pela realidade paralela
instigada pelo presidente Donald Trump.
Eram todos lambaris e, no primeiro
aniversário da insurreição, peixe gordo se protege, tentando blindar a
documentação da Casa Branca relacionada com o episódio. Sabe-se que o
ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani foi um dos instigadores, muitas vezes
tendo tomado algumas a mais. Sabe-se também que Ivanka, filha de Trump, tentou
chamá-lo à razão, mas ele passou horas diante dos aparelhos de televisão. Seus
advogados pediram à Suprema Corte que preservasse o sigilo das movimentações na
Presidência.
Deve-se esperar que a Corte se pronuncie,
pois o caso é constitucionalmente intrigante. O ex-presidente quer manter o
sigilo que Joe Biden, seu rival na campanha, dispensou. O FBI brilhou, mas, nos
limites de sua investigação, só pegou lambaris.
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