O Globo
O discurso de Michelle e Damares ameaça
quem não comunga com suas crenças
Em 1941, Getúlio Vargas baixou decreto que
proibia as mulheres de jogar futebol. O ditador já vinha matando e prendendo
oposicionistas desde a implantação do Estado Novo, em 1937, quando avançou
ainda mais nas liberdades individuais.
Dizia o texto:
— Às mulheres não se permitirá a prática de
desportos incompatíveis com as condições de sua natureza.
A proibição obrigou as entidades
esportivas, então atreladas ao Estado, a vetar campeonatos femininos. Várias
mulheres foram detidas (!), acusadas de organizar jogos. Houve sedição.
Desobediência. À revelia do ditador, continuaram a ocorrer partidas em campos
distantes. A estapafúrdia lei só caiu em 1983.
O decreto de Getúlio atendia à pressão de setores conservadores, junto aos religiosos, interessados em cercear o comportamento feminino. Defendiam que a mulher deveria limpar a casa, ter filhos e cuidar do marido. Exatamente o que pensa a terceira mulher de Bolsonaro.
A revolta das mulheres iranianas, nas
últimas semanas, exibe ao vivo o que é um Estado teocrático, intolerante com a
diversidade religiosa e com a liberdade de opinião. Na terra dos aiatolás, as
mulheres são obrigadas por lei a cobrir a cabeça e a enxergar seus esposos (!)
como comandantes em chefe.
Dias atrás, em Teerã, uma jovem,
presa por não usar véu na rua, acabou morta pelas forças policiais da
moralidade. São encarceradas aquelas que ainda vestem calças apertadas ou saias
acima dos joelhos.
Pobre Irã. Depois de derrubar um governo
autoritário e sanguinário, de Reza Pahlevi, caiu na ditadura dos aiatolás e
retrocedeu em liberdades individuais aos tempos da Inquisição Católica.
Um Estado teocrático, aquele em que se
criminaliza qualquer religião não oficial, não é diferente de qualquer outra
ditadura, seja da Coreia do Norte ou da Arábia Saudita.
Não há imprensa livre, liberdade de opinião, e o Poder Judiciário é vassalo do
Poder Executivo. Sem dúvida, o que deseja Bolsonaro com todas as letras.
No Brasil, juridicamente um país laico,
embora a Constituição fale de Deus, a religião sempre buscou influenciar leis e
políticas públicas. O divórcio, controle de natalidade, aborto, distribuição de
preservativos, até o canabidiol, entre outros exemplos, ou foram retardados ou
barrados por pressões religiosas. Também a educação sexual é vista não como
saúde pública, mas como depravação de sátiro capaz de criar crianças para se
casar três vezes.
Anos atrás, a conclusão do sequenciamento
genético resultou em embates, principalmente a partir de denominações
evangélicas, na tentativa de criar entraves ao financiamento público de
pesquisas capazes de evitar doenças, com adiamento da morte dos pacientes. Há
um desespero religioso na possibilidade de o homem, aquele criado à semelhança
de Deus, vir a prolongar a vida por meio de renovação de órgãos e até mesmo
superar a morte. Basta ler os livros de Ray Kurzweil para saber que os avanços
da biotecnologia devem levar os algoritmos da inteligência artificial a criar
equipamentos para ser implantados no corpo humano. Ou mesmo drogas capazes de
reparar tecidos apodrecidos.
A pesquisa, a dedução e a ciência sempre
foram perseguidas por diferentes matizes religiosos. Embora cada época tenha
sua Damares, os franciscanos em geral respeitavam o novo conhecimento. Não
chegavam a desafiar o axioma do bom Sócrates: “Eu não imagino que sei aquilo
que não sei”.
Mas foram quase uma exceção entre os
crentes. Santo Agostinho, ali pelo ano 410, dizia que os teatros não o atraíam
mais, nem se preocupava em saber o “curso das estrelas”. Era o mote para os
procatólicos mergulharem o mundo nas trevas da ignorância, dando as costas ao
estudo e ao questionamento, no que hoje chamamos de Idade Média. Santo Tomás de
Aquino, conhecido como o “boi mudo”, colocava a teologia como a “rainha das
ciências”!
Do resultado dos muitos dogmas impostos
pela Igreja, pipocaram as superstições e o desestímulo às descobertas e
invenções. A Terra então era religiosamente plana.
Os pastores bolsonaristas, apoiados pela
isenção de impostos na pessoa física e na jurídica, usam a mais-valia
evangélica para um proselitismo político desejoso de liquidar com a diversidade
de opiniões e as liberdades individuais. O discurso de Michelle
Bolsonaro e Damares Alves não
são rezas pias, mas ameaças a quem não comunga com suas crenças e visão de
mundo.
Em último caso, os pastores usam a quantia
não recolhida, portanto de toda a sociedade, que faz falta na educação e saúde,
para conduzir todos, de novo, à Terra plana.
Agora, como antes, é uma Inquisição com dinheiro
público.
6 comentários:
Quem é um tribunal inquisitório é o ST,F e o Alexandre de Moraes o seu Verdugo
Q bom!
Kkkkkkkkk
Verdade. Q bom. E o bolsonaro tem tanto medo do verdugo q não passa nem agulha.
RáRáRáRáRáRáRáRáRá
Falou a Sra do Lula
Michelle já explicou o motivo do Queiroz ter depositado 89 mil na conta dela? Ela tem tanto tempo pra falar besteira da vida alheia e não encontra tempo pra explicar a bufunfa que ela recebeu?
Damares é um caso clínico.
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