segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Denis Lerrer Rosenfield* - Qual direita?

O Estado de S. Paulo

O bolsonarismo adquiriu um perfil mais claro de movimento de extrema direita, e veio para ficar, sejam quais forem os resultados do segundo turno.

O novo quadro político-partidário já apresenta uma mudança significativa no que diz respeito às forças de direita em jogo e aos seus diferentes significados. Isso diferentemente das eleições de 2018, quando Bolsonaro representava genericamente a direita em sua aversão ao lulopetismo, a saber, contra as simpatias petistas pelas ditaduras de esquerda, a corrupção, o desrespeito à propriedade privada rural e o descalabro fiscal. Amalgamava ele posições conservadoras, liberais e de extrema direita, nem sempre diferenciadas. O bolsonarismo, nestes quatro anos, adquiriu um perfil mais claro de movimento de extrema direita.

Ele veio para ficar, independentemente dos resultados do segundo turno. Eis por que se torna relevante destacarmos algumas de suas características principais: 1) o seu desprezo pela democracia caracteriza-se pelas reiteradas tentativas de Bolsonaro e de seu grupo de deslegitimarem o sistema eleitoral e as urnas eletrônicas; 2) a independência entre os Poderes é ameaçada, como se o Supremo Tribunal Federal (STF) fosse um entulho que deveria ser removido; 3) para eles, a democracia não possui um valor universal, sendo tão somente um instrumento para a conquista do poder, que, uma vez alcançado, se torna um fim em si mesmo; 4) de movimento social, o bolsonarismo está se tornando institucional, na medida em que elegeu um número expressivo de deputados e senadores afins com sua ideologia; 5) note-se que deputados eleitos na esteira de Jair Bolsonaro, afastando-se depois, não foram reeleitos, mostrando a coesão deste movimento; 6) o atual presidente considera a sua voz como tendo um valor absoluto, ao qual os outros devem prestar obediência. Sua posição é a de um líder máximo, o que se traduz pelo tratamento que os seus partidários lhe reservam: “mito”; 7) em seus movimentos, os bolsonaristas expõem o que se poderia considerar uma estética da força. Ela se faz presente nas manifestações de motociatas, com homens, alguns armados, andando de motos, com capacetes. Ela se apresentou, também, na proposta do dito “tratamento precoce”, deixando doentes morrerem à míngua, e no absoluto desprezo pela vida. Jamais o presidente visitou um hospital. A estética da força mostrou-se como uma estética da morte; 8) do ponto de vista intelectual, o bolsonarismo é muito pobre, não tendo os equivalentes da extrema direita francesa, como Mauras e Céline; ou do fascismo italiano, como Gentile e outros.

A direita liberal desaparece. O Novo elege apenas três deputados, e o governador Romeu Zema, com uma votação expressiva em primeiro turno, decidiu alinhar-se com Bolsonaro. Eis um fenômeno importante, pois não é uma exceção. Boa parte dos liberais, principalmente por aversão ao petismo, alinhou-se ao bolsonarismo, e isso antes mesmo das eleições. Processo semelhante aconteceu no apoio dos produtores rurais aos conservadores e ao bolsonarismo, pois, com razão, foram os que mais diretamente sofreram com as invasões e a violência do MST, apoiadas pelo PT e por Lula. Os liberais, nesse sentido, tornaram-se uma força auxiliar do atual presidente, tendo perdido suas características próprias. A dita política liberal do governo Bolsonaro, representada pela figura do ministro Paulo Guedes, nada entregou do prometido. Alguém se lembra, ainda, das privatizações de R$ 1 trilhão? E o não pagamento dos precatórios, quebra de contrato, para o pagamento das emendas do orçamento secreto? Entrou em seu lugar, além do atendimento paroquial dos interesses corporativos, sem nenhuma noção de equidade, um social-darwinismo, deixando os pobres à própria sorte. Cortes do programa Farmácia Popular e da merenda escolar são demonstrações disso. Mesmo o Auxílio Brasil tem uma data para o seu término, dezembro de 2022, escancarando a sua intenção eleitoral.

A direita conservadora tem somente um perfil religioso, voltado para as pautas do aborto, da união civil homossexual e da política de gênero na educação. O conservadorismo inglês – para dar um exemplo paradigmático – está baseado em concepções liberais na economia e no respeito às instituições e às tradições. Aqui, os que se apresentam como conservadores jogam precisamente contra as instituições, sempre questionando as regras próprias da democracia. Pode-se, então, dizer que o conservadorismo brasileiro é ideologicamente sem muita consistência, salvo neste aspecto religioso e, para utilizar uma expressão popular, aguado.

Por último, temos uma direita que corresponde à tradição partidária brasileira, afeita sobretudo à satisfação dos interesses particulares, fisiológicos, financeiros, corporativos e paroquiais deste tipo de agremiação. Não tem, nem pretende ter, nenhum tipo de perfil ideológico, terminando por ser o fiel da balança de qualquer governo. É avessa tanto ao extremismo bolsonarista quanto ao petista, ambos podendo ser igualmente prejudiciais aos seus próprios interesses. É firme partidária da conservação de um sistema político que lhe satisfaz.

*Professor de filosofia na UFRGS

4 comentários:

Anônimo disse...

Pode Jair se acostumando
Kkkkkk

Anônimo disse...

Não é bolsonarismo. Bozo não tem capacidade pra criar algo inédito.
É fascismo, mesmo, incluindo cópias de alguns movimentos de esquerda como a ideia do Chaves de ampliar a Suprema Corte. Até da esquerda a extrema direita copia.
Copiar, claro, pois broxonaro é muuuuuuito limitado.

Anônimo disse...

Qual direita? A PIOR POSSÍVEL...

ADEMAR AMANCIO disse...

O Brasil se ressente de uma direita civilizada e uma esquerda moderada.Sim,a direita é mais agressiva que a esquerda.