Correio Braziliense
O risco que Lula corre é o novo ministério
ficar com cara de governo velho, no qual antigos caciques políticos e a cúpula
petista pontificariam, sem sinalizar uma forte renovação
Engana-se quem pensa que este período de
transição para o novo governo será fácil para o presidente eleito Luiz Inácio
Lula da Silva. No plano político, a sinalização está sendo boa: Lula
estabeleceu as relações cordiais com os demais Poderes e opera a montagem de um
governo de ampla coalizão democrática. Também mostrou que não pretende deixar
no sereno os eleitores de mais baixa renda que o elegeram, ao anunciar que os
recursos do Bolsa Família vão extrapolar o teto de gastos.
Entretanto, o dólar disparou depois da
divulgação da inflação no Brasil e nos Estados Unidos. Ontem, o câmbio já
passou dos R$ 5,30. O preço do fechamento do dia foi de R$ 5,396, alta de 4,14%
no dia. Por volta das 15h30, o dólar estava a R$ 5,341, alta de 3,09%. Logo na
abertura do mercado, a moeda americana chegou a subir quase 3%. Na
quarta-feira, o dólar já havia fechado o dia em alta, de 0,74%, fechando a R$
5,18. Desde o início do mês, a alta é de 2,96%. É óbvio que existe muita
especulação no mercado, com divulgação de fake news que mexem com a Bovespa, em
razão da insegurança dos investidores.
Lula já disse que não tem pressa para indicar o novo ministro da Fazenda, mas é aí que está o xis da questão no mercado financeiro. A rigor, ninguém sabe quais serão as medidas de impacto dos 100 primeiros dias de governo, exceto aquelas que estão sendo negociadas no Congresso, que sinalizam uma certa continuidade da farra fiscal que marcou a gestão do ministro Paulo Guedes durante a campanha eleitoral. Esse problema somente se resolverá quando for anunciado o nome do novo ministro da Economia ou da Fazenda, se houver desmembramento.
Havia uma expectativa positiva de que o
vice-presidente eleito Geraldo Alckmin viesse a ocupar esse cargo, mas isso
nunca foi cogitado de verdade por Lula. O próprio Alckmin já havia dito isso, o
que fora interpretado como dissimulação, porém, ontem, Lula jogou uma pá de cal
nessa possibilidade, ao afirmar que o ex-governador paulista não ocupará nenhum
ministério. Esse também não foi o problema maior para o mercado financeiro, o
que gerou instabilidade foi a própria fala de Lula e o fato de o ex-ministro da
Fazenda Guido Mantega ter sido confirmado como um dos integrantes do governo de
transição.
Coalizão
Até agora, a principal ancoragem da
transição de governo no mercado financeiro era a presença dos economistas
Pérsio Arida, André Lara Resende e Guilherme Mello na equipe econômica da
transição. A confirmação de Guido Mantega, ministro da Fazenda dos governos
Lula e Dilma Rousseff, sinaliza noutra direção. Mantega tem uma velha relação
com Lula, que começou quando dava aulas de economia para o então líder
metalúrgico no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo.
Arida, Resende e Mello têm evitado
declarações à imprensa; imagina-se que a mesma coisa acontecerá com Guido
Mantega. Enquanto não se define o nome do futuro ministro, porém, as
especulações no mercado financeiro vão continuar, até porque existe um ambiente
internacional que também favorece isso. A guerra da Ucrânia se prolonga, o
inverno se aproxima na Europa e há sinais de que poderemos ter um ambiente de
recessão na economia mundial. Esse cenário acaba alimentando as teses de
políticas anticíclicas, como as adotadas por Lula após crise de 2008, que se
prolongaram no governo Dilma, levando-a ao impeachment.
A transição vai bem no plano político. Lula
está prestigiando todos os políticos que o apoiaram desde o primeiro turno e
ampliou a equipe de transição para incorporar os partidos e lideranças que o
fizeram no segundo turno, principalmente Simone Tebet. O risco que corre,
porém, é o novo ministério ficar com cara de governo velho, no qual antigos
caciques políticos e a atual cúpula petista pontificariam. Com a PEC da
Transição, do ponto de vista de sua base eleitoral, e o bom relacionamento com
os líderes do Centrão, principalmente o presidente da Câmara, Arthur Lira, Lula
garante a estabilidade do governo na sua largada para o novo mandato. Mas isso
não basta para satisfazer os setores da classe média e da elite econômica do
país que fazem restrições ao presidente eleito.
De qualquer forma, o novo governo será o
que Lula conseguir articular em termos de forças democráticas. O primeiro turno
das eleições mostrou que o projeto original era viabilizar nas urnas, de forma
inequívoca, um governo de esquerda, ainda que sua coalizão eleitoral se
autointitulasse “frente ampla”. A correlação de forças políticas e eleitorais,
porém, obrigou Lula a ampliar suas alianças em direção ao centro político; a
vitória por estreita margem, a realizar uma articulação ampla das forças
democráticas para dar sustentação ao seu governo. Essa articulação não passa
apenas pelos acordos no Congresso, passa também, e sobretudo, pela formação do
governo e sua composição.
Um comentário:
Luiz Carlos Azedo.Pensei que fosse Azevedo,rs.
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