O Estado de S. Paulo
A alavancagem financeira em situação de juros reais positivos é um risco enorme
O agronegócio brasileiro deu um salto desde o
início da pandemia. A resposta dos governos frente à parada súbita foi
transferir grandes quantidades de recursos para famílias e empresas.
Com isso, a demanda foi mantida. Mas a
resposta da oferta foi atribulada, especialmente depois da invasão da Ucrânia
pela Rússia em fevereiro de 2022.
Os preços de commodities subiram: entre 2020 e 2022, a soja aumentou mais de 60% e o milho, mais de 90%. A resposta do Brasil foi fulminante, elevando rapidamente a produção e as exportações.
Parte da explicação da elevada velocidade de
resposta de nossa produção foi a disponibilidade de financiamentos a custos
relativamente baixos. De um lado, a taxa Selic se manteve na faixa de 2% de
junho/2020 a maio/2021, ao mesmo tempo que cresceram muito as operações de
mercado de capitais, utilizando-se de novos instrumentos financeiros criados
recentemente.
Com isso, o sistema expandiu-se muito,
especialmente na área de grãos, puxando o crescimento brasileiro até 2023. A
região Centro-Oeste brilhou intensamente.
Entretanto, não há bem que sempre dure. Com o
fim da pandemia, as cadeias de suprimentos se normalizaram e as políticas
monetárias ativas trataram de reduzir a inflação e a atividade em boa parte do
mundo. Com isso, os preços de commodities começaram a cair e estão voltando aos
níveis pré-pandemia.
Em paralelo, o clima adverso começou a cobrar
um preço em boa parte do País, sendo particularmente cruel no Rio Grande do
Sul.
Produtores e outros players começaram a se
dividir em dois grupos: aqueles que se aproveitaram da oportunidade, mas
mantiveram qualidade operacional e disciplina de capital, e os que elevaram seu
tamanho, arrendando ou comprando terras, à custa de grande alavancagem, mesmo
quando as taxas de juros se elevaram significativamente a partir do final de
2021.
Não é preciso muita informação para concluir
que a alavancagem financeira em situação de juros reais positivos é um risco
enorme, especialmente quando eventos climáticos prejudicam a produção.
Daí os pedidos de recuperação judicial que
estamos vendo, especialmente no Centro-Oeste. Veremos muita fragmentação e
consolidação, típicas dessas freadas de arrumação.
A nota boa é que o setor voltará a crescer
depois desse rearranjo. Mas fica uma grande lição: excelência operacional,
ganhos de produtividade e disciplina de capital são fundamentais em países
propensos a volatilidade e crises.
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