Valor Econômico
Diretores do Banco Central dizem que não pretendem reagir preventivamente à possibilidade de novos estímulos à economia, mas têm indicado a intenção de ajustar a dosagem da política monetária caso seja preciso
Quando o Banco Central decidiu dar um choque
de juros, em dezembro, sua avaliação era que haveria uma “nova expansão da
atividade econômica no quarto trimestre, sem sinais claros de desaceleração
relevante”. Na sexta, ficamos sabendo, pelos dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), que o BC errou sua previsão.
Apesar da surpresa negativa, o Produto Interno Bruto (PIB) não deve alterar o plano de voo do Comitê de Política Monetária (Copom), que, na semana que vem, vai subir os juros para 14,25% ao ano e provavelmente deixará em aberto o que pretende fazer na reunião seguinte, de maio.
Em um seminário em Lisboa, na sexta, o
diretor de política econômica do BC, Diogo Guillen, reconheceu que os dados
vieram mais fracos do que o esperado. Mas ele ponderou que ainda é muito cedo
para afirmar que a desaceleração da economia está de fato ocorrendo.
A dúvida não é exatamente se a economia está
em queda livre. O que os membros do Copom ainda não estão seguros é se a
economia está mesmo se desacelerando de uma forma gradual, seguindo o seu
cenário básico, que esfria o crescimento do PIB dos 3,4% observados em 2024
para os 2,1% previstos pelo comitê em 2025.
Essa desaceleração é necessária, segundo
Guillen, para que ocorra a transmissão do aperto monetário implementado pelo
Copom para, no final, levar a inflação para a meta, definida em 3%.
Os dados do IBGE mostram que a economia
apresentou uma desaceleração expressiva. Saiu de um ritmo de crescimento de
0,7% no terceiro trimestre para 0,2% no quarto trimestre. O consumo das
famílias, que era o grande motor do crescimento, perdeu fôlego. Saiu de uma
taxa de expansão de 1,5% no terceiro trimestre para um recuo de 1% no quarto
trimestre.
“Tivemos a divulgação do PIB, vindo um pouco
mais fraco do que o esperado”, disse Guillen, em um evento do banco central de
Portugal. “O consumo das famílias também veio um pouco mais fraco do que o
esperado.” Mas ele desfilou, a seguir, uma lista de argumentos que
desaconselham tomar esse dado do PIB trimestral como uma prova segura de que a
economia está, de fato, entrando em trajetória de desaceleração.
Um deles é que os dados divulgados são sempre
sujeitos a revisões posteriores. Ele apresentou uma série estatística do Índice
de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) que mostra os valores
inicialmente divulgados e todas as revisões posteriores.
Esse argumento não é exatamente novo. Há
cerca de 15 anos, quando o economista Carlos Hamilton ocupava a atual cadeira
de Guillen, o BC divulgou um box em um Relatório de Inflação explorando como os
dados do próprio IBGE podem ser revistos ao longo do tempo.
Outro argumento apresentado por Guillen é que
os dados do PIB podem ser muito diferentes dependendo do método de ajuste
sazonal empregado. Faz muita diferença se esse trabalho é feito a partir do
dado agregado do PIB ou se é feito com os componentes do lado da oferta.
Ele também chamou a atenção para o fato de
que dados de curto prazo podem conter ruídos que não apontam, necessariamente,
uma tendência. Ele lembrou que, em agosto, os dados pareciam indicar uma
economia fraca, que depois não se confirmou em setembro e outubro.
No fim do ano, tivemos uma nova safra de
dados mais fracos. “Neste começo de ano, você vê dados mistos”, disse, sem
entrar em detalhes. “Você vê alguns dados mais fortes.” Em janeiro, a criação
de empregos formais surpreendeu, com 137 mil vagas.
Entre os dados que indicam moderação da
atividade, ele citou uma pesquisa conduzida pelo BC junto aos bancos que mostra
um tom mais cauteloso na oferta de crédito; e também o enfraquecimento dos
índices de confiança. Mas teve o cuidado de ponderar que esses são “soft data”,
ou apenas a percepção de setores econômicos, não os dados concretos da
atividade.
Por fim, ele chamou a atenção para o risco de
que alguns sinais de desaceleração da economia reflitam, na verdade, limites na
capacidade de oferta. Ele mencionou o dado mais fraco do mercado formal de
trabalho de dezembro, que veio acompanhado de alta nos salários. Pode ser,
disse, que as empresas estejam pagando mais porque não encontram mão de obra.
Há um outro risco ao cenário de desaceleração
da economia no radar do BC, que não foi mencionado por Guillen. É a eventual
adoção de novas medidas de estímulo pelo governo Lula, como a liberação de
recursos do FGTS, a criação de uma nova modalidade de crédito consignado ou
outras ações criativas nas políticas fiscal e parafiscal.
O presidente do Banco Central, Gabriel
Galípolo, e o diretor de política monetária do BC, Nilton David, disseram que
não pretendem reagir preventivamente à possibilidade de novos estímulos. Mas
têm indicado a intenção de ajustar a dosagem da política monetária caso medidas
expansionistas de fato sejam implementadas.
Todo o discurso de Guillen foi construído,
aparentemente, para passar a mensagem de que o Banco Central não vai reagir aos
primeiros sinais de desaceleração econômica, como esses que foram transmitidos
pelo PIB.
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