Valor Econômico
Países do bloco examinam negociações em curso, enquanto Milei visa acordo com Donald Trump
A partir desta semana começam efetivamente as
reuniões da presidência rotativa da Argentina no Mercosul. Será a ocasião para
os parceiros tentarem identificar como o governo de Javier Milei planeja
realmente atuar à frente do bloco.
Milei insiste que trabalha intensamente em um projeto de acordo comercial com os EUA, aproveitando a afinidade ideológica com Donald Trump. De seu lado, Trump disse estar aberto à possibilidade de avançar num tratado comercial com o ‘grande lider’ Milei.
Por enquanto, o que há é retórica e nada de
concreto. Entre sócios do Mercosul, alguns interlocutores acreditam que Milei
vai respeitar as regras do Mercosul, sob pressão de parte de seu setor privado.
Outros apontam para sua imprevisibilidade e o veem capaz de colocar em risco o
mercado vizinho para produtos argentinos.
Milei fala algo diferente a cada momento. Já
acenou que tentaria um acordo 4+1 (Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e a
Bolívia) com os EUA. Depois, se não desse, a Argentina iria fazer a negociação
sozinha, o que é ilegal, viola as regras do Mercosul. O bloco estabelece que
seus países membros devem negociar acordos comerciais de maneira conjunta.
No Congresso argentino, Milei disse que no
caso de não poder obter flexibilização das condições para acordos, está
disposto a sair do Mercosul, reclamando que o bloco ‘só beneficiou os
industriais brasileiros em detrimento da economia argentina’.
Milei poderá abrir uma caixa de Pandora. Se
sair do Mercosul, a situação estará clara: haverá um período de dois anos no
qual a Argentina continuará sob direitos e obrigações do bloco. Depois, sofrerá
tarifas dos parceiros, assim como levantará barreiras aos ex-sócios, causando
destruição de riqueza nos dois lados.
Já no cenário em que a Argentina negociar com
os EUA, mas querendo permanecer no Mercosul, apesar da mega perfuração das
regras básicas, a reação do bloco não é automática. Será preciso que os
parceiros abram procedimento para avaliar a violação argentina e os estragos
previsíveis.
Certo mesmo é que o presidente da Argentina
pode dar um golpe na já dificil integração econômica na América do Sul, assim
como Trump vem fazendo na América do Norte na imposição de choque tarifário
contra os vizinhos e sócios Canadá e México com argumentos ‘idiotas’.
No Mercosul, como no Nafta, o setor
automotivo seria um dos mais afetados. Cerca de 28% das exportações argentinas
para o Brasil no ano passado foram veículos em geral. Por sua vez, 22% das
exportações brasileiras para a Argentina foram veículos e 9,7% partes e
acessórios.
Não é para os EUA que a Argentina passaria a
exportar carros que não poderia vender para o Brasil. Um acordo, modesto,
poderia envolver vários produtos industriais suspensos hoje do Sistema Geral de
Preferências (SGP americano), mas sem valor expressivo, na avaliação de fontes.
Esta semana, os países do bloco oficialmente
passarão em revista negociações que estão realmente em andamento.
A União Europeia informou que a revisão legal
do acordo com o Mercosul está quase concluída. Logo começarão as traduções dos
tetos. Depois, em poucos meses poderia tentar ratificar o acordo para entrada
em vigor num cenário geopolítico completamente diferente. Os europeus parecem
ainda mais desesperada para implementar o acordo, que dará boa vantagem para as
empresas europeias no Mercosul (tarifa menor), na competição com a China e os
EUA.
Também há possibilidade de ainda na
presidência argentina até julho o Mercosul concluir as negociações de acordo de
livre comércio com a Associação Europeia de Livre Comércio (Efta, na sigla em
inglês), formada por Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein.
Para os países do Efta, o acordo é importante
para assegurar pelo menos as mesmas preferências que serão obtidas pelas
empresas dos países da EU. Isso e dá uma evidente vantagem competitiva nos
negócios com um mercado de mais de 260 milhões de habitantes como é o caso do
Mercosul. Os países do Efta são pequenos, mas muito ricos.
A China continua insistindo em ter um acordo comercial com o Mercosul. Mas o bloco reage com enorme prudência em relação aos asiáticos em geral. O setor privado considera arriscado e complicado movimento nessa direção, especialmente no contexto de política industrial. No Brasil, há segmentos que consideram que não dá para baixar a guarda para os asiáticos, ainda mais quando todo mundo está com um pé atrás em relação a abertura de mercado.
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