quarta-feira, 11 de junho de 2025

Bolsonaro tropeça na política e não se livra das imputações em interrogatório no STF - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Aliados sinalizam descontentamento com desempenho de ex-presidente em depoimento

Auto-exilado no Texas, de onde tem feito pressões por sanções americanas ao ministro Alexandre de Moraes, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) se desesperou ao ouvir o pai convidar seu algoz para vice durante seu interrogatório no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça-feira (10). “Qualquer pessoa com dois neurônios entendeu a ironia da fala de @jairbolsonaro, entendeu que a ÚLTIMA pessoa no planeta que seria escolhida para vice dele seria Moraes”, escreveu no X.

“Foi ruim”, resumiu seu companheiro de armas, o influenciador Paulo Figueiredo, foragido da justiça brasileira nos EUA, ao comentar o depoimento do ex-presidente discordando da enquete de seu canal na internet. Achou-o pouco preparado e confuso nas respostas e desesperou-se com o pedido de desculpas de Jair Bolsonaro a Moraes pela afirmação de que o ministro recebera milhões em suborno: “Ele quase pediu misericórdia ao Alexandre de Moraes. Foi um erro porque esse julgamento é uma farsa”. Só esqueceu de dizer que foram dois pedidos de desculpas.

A reação dos dois soldados do ex-presidente resume o impacto político do seu depoimento. Não agradou quem pendura seu futuro na sobrevivência do naco bolsonarista do eleitorado ou na desmoralização de Alexandre de Moraes. O humor com o qual Bolsonaro encarou o depoimento e a maneira obsequiosa com a qual respondeu ao ministro relator tampouco se encaixa no figurino de vítima no qual tenta se ajustar ao longo de seu confronto com o Supremo Tribunal Federal.

Se, para a política, o depoimento de Bolsonaro na Primeira Turma do STF deu ruim, para suas chances no processo tampouco parece ter funcionado. É o que se depreende da reação do seu advogado. Ao final do depoimento, Celso Villardi passou a fazer perguntas pedindo, expressamente, para que seu cliente respondesse apenas sim e não. Ficou claro que, em suas respostas a Moraes, Bolsonaro havia sido confuso e pouco convincente em se divorciar da trama golpista.

No depoimento da manhã, do general Heleno Ribeiro, seu advogado, Matheus Milanez, também tinha tentado a mesma estratégia. Não teve sucesso porque seu cliente, aos 77 anos, parecia pouco treinado para as respostas. Em vez de negar peremptoriamente a contestação do resultado eleitoral, o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional respondeu que “não houve oportunidade” para isso. Por isso, quando Villardi mencionou que adotaria o “método Moraes” de inquiri-lo, o ministro advertiu-o: “Seu colega tentou mais cedo e não deu certo”. Villardi conseguiu que Bolsonaro desse um simples “não” à pergunta sobre a edição da minuta do golpe, contrariando o que seu ex-ajudante de ordens, Mauro Cid, dissera véspera. Não foi capaz de desfazer, porém, a declaração do cliente de que “não havia clima para golpe”.

Antes mesmo de ser confrontado com o teor golpista de declarações suas ao longo do governo, Bolsonaro atribui-as à “retórica” adquirida em 28 anos de vida legislativa na Câmara Municipal do Rio e na Câmara dos Deputados. Indagado sobre as acusações ao Tribunal Superior Eleitoral e as ameaças aos ministros do STF, tomou por regra atribuí-las a “desabafos” e ao seu “temperamento explosivo”. As manifestações golpistas de apoiadores que pediam ao AI-5 viraram “maluquice”. E, finalmente, sobre as reuniões com comandantes das Forças Armadas para convencê-los a aderir a medidas de exceção, disse não passarem de “conversas informais com companheiros de turma”.

Se, na véspera, havia sido benevolente ao encontrar seu ex-ajudante de ordens, no depoimento desta terça, tentou dar um troco ao delator. Disse que o discurso encontrado no seu escritório no PL que tratava de Estado de Sítio e operação de Garantia da Lei e da Ordem estava no inquérito e fora extraído do celular de Mauro Cid.

É inútil tentar encontrar uma estratégia com começo, meio e fim de Bolsonaro a partir do depoimento desta terça, mas o habitual caos como método não lhe afastou da condenação. E mais: permitiu que Alexandre de Moraes, ao franquear espaço para suas loas ao próprio governo, combatesse com sucesso a imagem de algoz implacável do bolsonarismo.

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