segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Opinião do dia – Luiz Sérgio Henriques

A oxigenação programática deste centro, que vai muito além do PMDB, pode ser um dos acontecimentos mais interessantes do fim de ciclo petista, quando menos como estímulo para abandonar este período de contraposições simplórias e deseducadoras. Num horizonte amplo, tal centro se tornaria, quem sabe, desafio produtivo para uma esquerda autorreformada, que assimilasse os valores da política democrática e largasse, como um molambo qualquer, a fantasia autoritária.

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Luiz Sérgio Henriques: tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das 'obras' de Gramsci no Brasil. ‘De novo, o centro político’. O Estado de S. Paulo, 21 de setembro de 2015.

PMDB racha em discussão sobre sair ou ficar no governo

• Partido se divide sobre continuar ou não no governo; encontro deverá definir rumo da sigla

Caciques do PMDB têm opiniões divergentes sobre o futuro do partido na crise política: sair já do governo Dilma, prolongar a permanência ou ficar até o fim. Os rumos da sigla deverão ser decididos em encontro previsto para novembro.

PMDB na encruzilhada

• Partido se divide sobre continuar ou não no governo; encontro deverá definir rumo da sigla

Júnia Gama - O Globo

- BRASÍLIA- Fiel da balança do governo Dilma Rousseff, o PMDB vive um acirramento das discussões sobre permanecer ou não na base aliada. Setores do partido favoráveis ao desembarque pressionam para forçar uma decisão, com o discurso de que, para viabilizar uma candidatura presidencial em 2018, o PMDB precisa começar a se desvincular de uma das gestões mais mal avaliadas dos últimos tempos.

Há nesse grupo quem defenda que no congresso organizado pela Fundação Ulysses Guimarães para 15 de novembro, do qual devem participar mais de três mil peemedebistas, haja consenso, mesmo que sem valor decisório, da saída do governo. É o caso do oposicionista declarado Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), presidente da Câmara dos Deputados:

— A posição do partido é política. O que vai resolver se o PMDB vai sair do governo é esse posicionamento político. Se quiserem convocar convenção da Executiva, melhor ainda. Lá, eu voto quatro vezes e tenho certeza de que vai ser uma média de dois votos contra um para ir para a oposição — disse Cunha.

Outra ala, porém, quer protelar a decisão o máximo possível, à espera de que o governo se deteriore até que seja inevitável deixá- lo. Antes que isso ocorra, o grupo pretende aproveitar ao máximo as benesses do poder, como cargos e emendas. Nas palavras de um dos articuladores desse processo, a decisão sobre os rumos do PMDB “vai ser uma guerrilha política”.

— Ninguém sabe sequer se esse congresso vai acontecer. Não existe nem convite ainda para o evento. Acho que muitos estão usando isso como instrumento de pressão sobre o governo. Além disso, congresso não decide nada. Tem que levar para a convenção. E lá pode mudar tudo, inclusive o comando do PMDB — afirma um dos parlamentares peemedebistas que defendem que o partido permaneça no governo.

Para alguns peemedebistas, o vice- presidente Michel Temer tem demonstrado com divergências públicas, como nas críticas à criação de mais impostos, seu distanciamento do centro governista. O fato de Temer e do ministro Eliseu Padilha ( Aviação Civil) terem deixado de vez a articulação política reforçou para setores do PMDB a tese de independência do partido em relação ao Palácio do Planalto.

Incerteza sobre desfecho da crise política
Mas, reservadamente, caciques do partido dizem ser impossível fazer qualquer previsão sobre como o PMDB se portará. Isso porque, explicam, os rumos do governo Dilma são tão incertos que fica difícil tomar qualquer posição neste momento ou fazer uma programação, mesmo a curto prazo. Há ainda o fato de Temer, por ser o vice- presidente, ter a obrigação institucional de permanecer no governo, mesmo que sua relação com Dilma piore.

— O PMDB vai discutir isso ( saída da base), se é que vai, em novembro, no congresso do partido. Mas a deterioração do governo está numa velocidade tão grande que é impossível fazer qualquer previsão sobre como as coisas estarão até lá. Semana passada, estava menos pior que esta, e a anterior também parecia menos grave. Não se encontram precedentes para essa velocidade com que as coisas estão se deteriorando — afirma um ministro do PMDB.

— Agora, o PMDB não pode tomar iniciativa para nada, Temer é o vice- presidente. Se alguém vai fazer movimentos, vai ter que ser de outros partidos. E imagino que os partidos da base não devem desembarcar do governo agora. Mas, na hora que o bonde partir, todo mundo salta — diz um peemedebista da cúpula.

Mesmo que, ao final do processo, o PMDB permaneça na base, outro instrumento que o partido terá para marcar suas diferenças em relação ao governo Dilma será um programa de governo, que está sendo elaborado para ser submetido ao congresso da sigla, em novembro.

— Até agora, o PMDB está observando os fatos. No congresso, vamos aprovar o novo estatuto do partido. O objetivo não é deliberar sobre a permanência no governo. Mas qualquer militante pode pedir para que isso seja colocado em votação. E, no PMDB, não existe consenso, existe maioria. O que a maioria decidir, está decidido. E essa decisão, se for passar pela comissão executiva, vai com uma força política brutal — afirma Moreira Franco, presidente da Fundação Ulysses Guimarães.

Os líderes do partido na Câmara, Leonardo Picciani ( RJ), e no Senado, Eunício Oliveira ( CE), estão entre os que defendem que a legenda continue apoiando o governo que ajudou a eleger e, portanto, que não decida sobre rompimento no congresso de novembro. Os dois líderes se reaproximaram do governo nos últimos meses e, segundo aliados, garantiram algumas nomeações em cargos do Executivo. Segundo Eunício, o Congresso deve discutir rumos do partido, não o rompimento com o governo:

— O objetivo do congresso será discutir o partido e o Brasil, não é esse o fórum para rompimento.

Parte da bancada, especialmente a de deputados, no entanto, está insatisfeita com a relação entre o Planalto e o partido. Um dos maiores críticos é o deputado Lúcio Vieira Lima ( BA), que vocaliza hoje a insatisfação crescente dentro da legenda. Segundo ele, caso o congresso de novembro chegue a uma posição majoritária pelo rompimento, não restará alternativa à cúpula da legenda que não romper oficialmente:

— A Dilma agora está jogando tudo em dividir o PMDB no fisiologismo. E está usando como ponta de lança o Rio de Janeiro, que já foi um dos maiores defensores do rompimento. O Rio está se comportando em relação a Dilma como se comportou o PFL em relação a Collor: “é hora de aproveitar e tirar o resto que tem”. Agora, além dos que já eram contra o governo, você tem hoje os descontentes e aqueles que têm mais medo da opinião pública do que da morte. E esses estão a favor do rompimento, porque temem sofrer as mesmas vaias e agressões que os integrantes do PT estão sofrendo — afirmou Vieira Lima.

Dilma se reúne com ministros no Alvorada para discutir reforma ministerial

• Presidente começa a se movimentar para definir quais serão os cortes

Leonêncio Nossa e Dida Sampaio - O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff se reuniu neste domingo a noite com ao menos quatro ministros no Palácio da Alvorada. Ela retomou as conversas sobre a reforma ministerial, cujo anúncio é esperado para esta semana. Participam do encontro os ministros Ricardo Berzoini (Comunicações), Luís Inácio Adams (Advogado-geral da União), Nelson Barbosa (Planejamento) e Miguel Rossetto (Secretaria-Geral da Presidência). Ontem, além de Barbosa, estiveram reunidos com Dilma no Alvorada os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e Valdir Simão (CGU). O objetivo das conversas é detalhar que mudanças serão feitas na estrutura dos ministérios.

O tema da reforma ministerial tem ocupado a agenda da presidente ao longo da última semana, já foram realizadas três reuniões entre sexta-feira e domingo. Hoje, são 38 pastas, que devem ser reduzidas para 28. O Palácio do Planalto já determinou um estudo sobre a estrutura física, funcionários e o papel de cada secretário, além dos programas prioritários de cada pasta que podem ser realocados para outras no caso de fusão de ministérios.

A redução no número de ministérios é tema de discussões há quase um mês. O ministro do Planejamento anunciou o corte no dia 24 de agosto, em coletiva no próprio Palácio do Planalto, logo após a reunião de Coordenação política. Na ocasião, a ideia surgiu como uma agenda positiva para minimizar o impacto da saída do vice-presidente Michel Temer (PMDB) da articulação política.

Um mês após iniciar discussões da reforma administrativa, Dilma não procurou PMDB

• Presidente afirmou que vai anunciar nesta quarta corte de dez pastas, mas vice e senadores até agora não foram ouvidos

Andreza Matais e Talita Fernandes - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Na semana em que a presidente Dilma Rousseff prometeu anunciar quais serão os dez dos 39 ministérios que irá cortar, dirigentes do PMDB no Senado dizem não ter sido procurados para discutir o tema. A colegas de partido, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou que não foi chamado a conversar e, se for, não pretende negociar indicações.

Renan disse a peemedebistas que os atuais ministros do partido são seus amigos e não irá entrar na discussão de redução de ministérios por essa razão. Argumentou ainda que não pretende mais fazer movimentos para ajudar o governo a sair da crise, por considerá-los inúteis.

Nem mesmo o vice-presidente Michel Temer, que retornou ao Brasil após passar toda a semana passada em viagem oficial a Rússia e Polônia, havia sido convidado para discutir a reforma até ontem à noite, segundo dirigentes do partido.

Temer convidou lideranças do PMDB para uma conversa na noite desta segunda-feira, 21. O partido tem discutido internamente qual o melhor momento de deixar o governo, pauta que ganha mais adeptos na legenda a cada dia.

Na segunda-feira passada, o governo anunciou medidas – entre cortes de gastos e aumento de impostos – para tentar cobrir o rombo no Orçamento, mas não mencionou o corte de ministérios – o Planalto informou que iria esperar Temer voltar ao País para falar sobre reforma.

No domingo, 20, a presidente se reuniu com ao menos quatro ministros no Palácio da Alvorada: Ricardo Berzoini (Comunicações), Luís Inácio Adams (Advogacia-Geral da União), Nelson Barbosa (Planejamento) e Miguel Rossetto (Secretaria-Geral da Presidência).

Kátia Abreu. “Não estamos sabendo absolutamente nada da reforma e da fusão de ministérios. Nem a bancada do partido nem o líder no Senado foram consultados”, afirmou o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE). Até agora, o único a tratar do tema, “entre outros assuntos”, foi o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ). Ele conversou, na semana passada, com a ministra da Agricultura, Kátia Abreu.

A ideia do governo é indicar ao Ministério um nome que agrade à bancada na Casa. “Só na especulação não nos cabe fazer nenhum comentário. Vamos aguardar informações mais precisas”, disse Picciani.

O fato de Dilma ter escalado Kátia Abreu como interlocutora do partido no governo em detrimento de Temer, que é presidente da legenda, transformou-se em um dos focos de insatisfação no PMDB.

Dirigentes da sigla dizem que ela é “cristã nova” no PMDB – ingressou há menos de dois anos no partido – e não seria a pessoa adequada para fazer essa negociação.

“Se tiver que falar com alguém, que a presidente fale com o Renan ou com o Temer, que é vice-presidente da República e sucessor natural da Dilma”, disse um peemedebista. Segundo ele, o discurso da ministra em defesa do governo está cada vez mais distante do entoado pelo partido.

O PMDB tem cinco ministérios: Kátia Abreu (Agricultura), Eduardo Braga (Minas e Energia), Henrique Eduardo Alves (Turismo), Helder Barbalho (Pesca), Edinho Araújo (Portos) e Eliseu Padilha (Aviação Civil). A expectativa é de que Aviação Civil e Portos sejam incorporados ao Ministério dos Transportes. Turismo deve ser fundido com outra pasta. / Colaborou Leonencio Nossa

Aliado de vice critica excesso de erros da gestão Dilma

• Ex-ministro Moreira Franco diz que PMDB não trai governo

O acúmulo de equívocos do governo é algo bárbaro

• Ex-ministro de Dilma e um dos principais aliados de Temer, peemedebista diz que a gestão petista 'não confia em ninguém'

Daniela Lima – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Ex-ministro da presidente Dilma Rousseff e um dos principais aliados de seu vice, Michel Temer, o peemedebista Moreira Franco, 70, diz que a relação entre o PT e o PMDB foi minada porque "o governo não confia em ninguém"

Em entrevista à Folha, Moreira Franco afirma que a "estratégia inicial" do segundo mandato de Dilma foi "desidratar o PMDB". "Mas nós sabemos nos defender. Estamos aqui há 50 anos. Temos raízes. Somos o partido que derrubou a ditadura sem matar ninguém, só com a política."

Interlocutor de Temer com diversos setores, inclusive da oposição, diz que o vice tem sido incompreendido e que "arca com o ônus de se explicar" numa tentativa de não agravar a crise.

Ele sustenta que "o PMDB não trai", que a queda de Dilma "não é uma meta" da sigla, mas que a legenda busca uma "solução para o país".

Folha - Especulam muito sobre o papel do PMDB nessa crise. O que o sr. vê?

Moreira Franco - O PMDB não conspira, não trai. Ao longo de toda a sua trajetória, e são 50 anos, o PMDB sempre teve a política como ferramenta de atuação. É um partido que tem a cultura da conversa, do diálogo e da maioria. O impeachment não pode ser tratado como algo banal, trivial. Ele não é. Mas aqui foi um tema introduzido pelo governo e, mais grave, pela presidente.

Nomes do seu partido dizem que o desempenho da economia será determinante para o desfecho da crise. Concorda?

A crise que vivemos é mais grave que a de 1929. Há um êxodo no mundo, a Europa está sendo objeto de ocupação. Há a China... E aqui é mais grave porque as raízes dela são internas, foram equívocos da política econômica. O ambiente é difícil, hostil. Exige paciência, equilíbrio e conversa. Estamos diante de desafios do passado.

Como assim?

Temos toda uma geração que não conhece inflação e não sabe se proteger dela, nem no supermercado nem no mercado de trabalho. É uma sensação de perda histórica. Estamos preocupados.

O vice-presidente Michel Temer reclamou do "clima de intrigas" no governo.

O Michel tem sido cauteloso, cuidadoso e incompreendido. O zelo é tamanho que ele assume o ônus de se explicar, o que por si só não é bom, mas ele assume. Há um esforço partidário de superação [da crise], mas estamos tendo dificuldades.

Que dificuldades?

O governo chamou o [Gilberto] Kassab [ministro e dirigente do PSD] e o Cid [Gomes, que deixou o ministério da Educação após falar que o governo era vítima de achacadores] para desidratar o PMDB. Nós sabemos disso. Mas estamos aqui há 50 anos, temos raízes. O PMDB é o partido que derrubou uma ditadura sem matar ninguém, só na base da política. Nunca fomos um partido de donos, e isso, muitas vezes, não é compreendido. O compromisso do PMDB é com a base.

O governo não compreende?

Primeiro, porque não confia em ninguém. Não entende que aliança não é casamento. Aliança é algo feito em torno de um projeto. As sugestões que se leva são sempre malvistas, nunca são nem sequer meditadas. Parecem não compreender que não se governa só com voto de deputado. Governa-se com saber, com humildade para convencer e ganhar as pessoas.

Foi a sensação de alijamento que levou ao afastamento entre o PMDB e o PT?

Não temos ressentimento por termos ficado quatro anos no limbo. Não há ressentimento por termos visto que a estratégia de montagem inicial do segundo mandato [de Dilma] foi diluir a força do PMDB. Sabemos nos proteger. Quando o Michel foi convocado para ajudar na articulação política, ajudou sinceramente. Fizeram milagres, ele e o Eliseu Padilha [ministro e integrante do conselho político do governo].

Milagres?

Nada andava. Os compromissos não eram cumpridos. Conseguiu-se aprovar boa parte do ajuste fiscal por convicção, porque as negociações não saiam. E isso em política é a pior coisa que tem. Você apalavrar e não cumprir. Gera um desconforto terrível. E nós falamos: "Tem que mudar..." e não mudava. Ainda assim não temos ressentimento. Agora, queremos ver se encontramos uma solução. É preciso ter uma.

O ajuste proposto na última semana pelo governo aponta um caminho?

A justificativa para o [Joaquim] Levy ser ministro da Fazenda foi evitar que o país perdesse o grau de investimento. Diante desse quadro, é inconcebível mandar um Orçamento deficitário. A base industrial brasileira, tirando os países desenvolvidos, é a melhor do mundo. Estamos perdendo isso. Foi um esforço de três gerações.

Setores do governo argumentaram que a perda do grau de investimento pela Standard & Poor's foi uma ação política.

A agência não tinha outra alternativa. Se você recebe um Orçamento deficitário e tem uma empresa de avaliação de risco, o que é que vai fazer? O gesto político equivocado foi mandar o Orçamento deficitário. Isso é que foi incompreensível.

O sr. falou que é preciso encontrar uma solução...

O quadro é extremamente grave e não adianta fingir que não é. A autocrítica é um ganho civilizatório. E esse valor é algo muito forte. Se você erra, e não admite o erro, não tem porque eu ficar confiando em você, vivendo com você... Existe uma grande dificuldade da admissão dos equívocos. É um gesto sem mal-estar, para resolver, reconstruir. Temos que ser sinceros. Não dá mais para achar que vai cobrir o sol com a peneira. E isso não significa que o PMDB queira derrubar [a presidente], não. Não é objetivo, não é meta, não é desiderato. O que se quer é encontrar uma alternativa para o país.

O pacote econômico do governo caminha nessa direção?

Ele é politicamente equivocado. Não se pode ter como força maior da solução o imposto, numa situação como a que estamos vivendo, com uma carga tributária monumental e uma má vontade construída politicamente há décadas. Não é possível que não tenha outra alternativa que equilibre melhor isso. Mas vamos ver como o Congresso vai agir. Tudo ali depende dos parlamentares.

A recriação da CPMF tem chance de ser aprovada?

É muito difícil.

Temer estava fora do país quando o pacote foi anunciado e será cobrado a se posicionar. Como ele vai reagir?

Ele já deu declarações contrárias à criação de imposto.

Há relatos de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está preocupado com o afastamento de Temer do governo. Vê possibilidade de reaproximação?

O Lula disse, segundo o Painel [coluna de política da Folha], que a reforma administrativa, para dar certo, teria que começar do zero, e acho que ele é uma pessoa que tem talento e experiência para manifestar isso. O primeiro problema é a recomposição da estrutura de apoio do governo.

O sr. é apontado como um dos principais interlocutores de Temer com a oposição.

Eu não falo com a oposição. Tenho contatos pessoais com algumas pessoas há anos. Conheço o Fernando Henrique Cardoso desde o Cebrap.

O sr. coordena a formulação do programa que será apresentado no congresso do PMDB. O que será?

Será um documento robusto. Vamos mandar para todos os militantes, melhorar nossa presença digital, que era nenhuma, montar uma base para que os militantes possam participar, opinando sobre projetos que estão tramitando tanto na Câmara quanto no Senado.

O sr. consegue vislumbrar um cronograma para o desfecho da crise?

Impossível prever. A velocidade dessa crise é surpreendente... O acúmulo de erros, de equívocos é uma coisa bárbara. A bateção de cabeça... Exemplo: anunciaram que as emendas parlamentares seriam usadas para financiar o PAC. Recuaram.
Não dá para votar um programa de ajuste indo e vindo. Quando você apresenta a proposta e depois começa a tratá-la como um rascunho, não dá.

Vai precisar de articulação, agora que Temer se afastou...

Ele foi afastado.

Vê alguém no governo com capacidade de organizar a base?

Tanto o Giles [Azevedo] como o [Ricardo] Berzoini são pessoas por quem tenho apreço pessoal. Eles têm a confiança do PMDB.

Há um outro fator de instabilidade que é a Operação Lava Jato. Não teme as consequências do envolvimento de nomes do PMDB na investigação?

Não. O PMDB não tem nesses 50 anos de currículo nenhuma participação orgânica em casos de corrupção. Existem problemas, companheiros citados –e eles terão todas condições de se defender. Agora, participação orgânica, como outros partidos, nunca tivemos.

Aliados querem que Dilma adie reforma e evite atritos

• Temor é desagradar partidos na semana em que Congresso apreciará vetos

• Michel Temer e Renan Calheiros sinalizaram que não deverão fazer indicações para novas pastas do governo

Valdo Cruz – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Diante do risco de criar atritos com sua base aliada, a presidente Dilma Rousseff foi aconselhada por assessores a postergar sua reforma administrativa e ministerial para a próxima semana.

A presidente, no entanto, seguia, na noite deste domingo (20), disposta a anunciar ainda nesta semana o corte de ministérios.

Segundo assessores, um meio-termo poderia ser anunciar o formato da mudança administrativa até quarta-feira (23), conforme o prometido, deixando a definição de nomes do novo ministério para a semana seguinte, a fim de amarrar com os partidos aliados as indicações.

O temor no Planalto é desagradar legendas da base governista, principalmente o PMDB, numa semana em que o Congresso agendou a votação de vetos presidenciais importantes para o equilíbrio das contas públicas.

Estão na pauta, por exemplo, os vetos ao aumento médio de 59,5% dos servidores do Judiciário, com impacto anual médio de R$ 6,4 bilhões, e à extensão do aumento real do salário mínimo para todos os aposentados.

Num sinal do grau de dificuldades nas negociações, o governo já foi avisado, por exemplo, de que o vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), não vão negociar novas indicações para o governo.

A decisão foi tomada depois que emissários da presidente procuraram interlocutores dos dois para discutir nomes de ministeriáveis.

"Eu já disse que meu papel é buscar ajudar com a aprovação de uma agenda para o país, não indicando nomes para ministérios", disse Renan Calheiros à Folha.

Assessores de Temer, que retorna nesta segunda-feira (21) a Brasília depois de viagem à Rússia, também disseram que ele não irá tratar de indicações para ministérios.

Dilma marcou para quarta-feira a divulgação de sua reforma. Segundo assessores, apesar dos conselhos, ela prefere manter a decisão ou transferir o anúncio, no máximo, para sexta-feira (25).

Um auxiliar disse à Folha que a presidente quer anunciar pelo menos o corte das pastas, porque ela assumiu esse compromisso e entende como importante sinalizar ao mercado sua disposição de fazer o ajuste fiscal.

Nesse caso, ela poderia adiar sua viagem para Nova York, inicialmente prevista para quinta (24) à noite, onde vai participar da abertura da Assembleia-Geral da ONU.

Redução de pastas
No fim de semana, Dilma praticamente fixou o corte de dez ministérios. Faltavam alguns acertos, que serão definidos com sua equipe ao longo dos próximos dias.

Foi estabelecido que três secretarias com status de ministério seriam fundidas em uma –Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos– e que a pasta do Trabalho será incorporada à da Previdência.

Na área do PMDB, a presidente Dilma decidiu fundir Portos com Aviação Civil e Pesca com Agricultura. Ou seja, dois peemedebistas vão perder o cargo de ministro.

Perdem também status de ministério o GSI (Gabinete de Segurança Institucional), a SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos) e a SRI (Secretaria de Relações Institucionais) –essa última será incorporada à Secretaria-Geral da Presidência da República.

A presidente avaliava ainda fundir Turismo com Esportes e Micro e Pequena Empresa com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. Outra possibilidade era fundir Turismo com a pasta do Desenvolvimento.

Lula assume interlocução com o PMDB

Por Andrea Jubé e Raymundo Costa - Valor Econômico

BRASÍLIA - A reforma ministerial que a presidente Dilma Rousseff pretende anunciar na quarta-feira contempla um rearranjo completo na coordenação política. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva desponta como ponta-de-lança na relação com o PMDB, com a missão de esvaziar o movimento pelo impeachment. O ministro Ricardo Berzoini assume a Secretaria Geral da Presidência, que vai incorporar a articulação política. Ele atuará na interface direta com o Congresso Nacional junto com o assessor especial Giles Azevedo. Do núcleo mais próximo a Dilma, a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, segue no cargo, mas com a pasta turbinada e empoderada para reforçar a articulação.

Lula se consolida como interlocutor privilegiado no contato direto com o vice-presidente Michel Temer e os presidentes do Senado, Renan Calheiros (AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (RJ). Nesse período de crise aguda, decisivo para os rumos do ajuste fiscal e para barrar o impedimento de Dilma, Lula intensificará as visitas a Brasília. Ministros do PT lhe pediram que faça reuniões com aliados na capital semanalmente. Nos últimos 15 dias, Lula esteve com Temer e Eduardo Cunha.

O ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, segue no comando da pasta, mas agora avalizado por Lula, com quem se reuniu na sexta-feira, logo após o encontro do ex-presidente com Cunha. O café da manhã com Mercadante aconteceu depois do jantar de Lula com cinco ministros do PT, que se queixaram do trato com o correligionário. Dilma disse a Lula que mantém Mercadante porque confia nele, ele é dedicado, comprometido com o governo e porque substitui-lo neste momento poderia gerar mais instabilidade política.

No encontro com Dilma, Lula reforçou à antecessora que aproveite a reforma para desmontar o "ministério de amigos" e formar um gabinete onde os ministros tenham verdadeira interlocução com as bancadas.

Ricardo Berzoini, que já reforçava a articulação política de maneira informal, deverá assumir o lugar de Miguel Rossetto na Secretaria Geral, que no rearranjo administrativo absorverá a Secretaria de Relações Institucionais (SRI). A mudança, contudo, é uma operação complexa e delicada, porque implica a Dilma não apenas afastar um amigo, que foi seu coordenador de campanha, mas um expoente da Democracia Socialista (DS), a segunda principal tendência do PT depois da Construindo um Novo Brasil (CNB), de Lula.

Um petista com trânsito no Planalto lembra que Rossetto tem sido atuante no diálogo com os movimentos sindicais, em especial com a Central Única dos Trabalhadores (CUT), da qual é fundador, e afastá-lo neste momento em que os sindicalistas podem ser chamados às ruas para defender Dilma seria um erro.

Mas neste momento de turbulência máxima com o Congresso, Berzoini é peça-chave na relação com os parlamentares. Como ex-presidente do PT e ex-ministro da coordenação política e da gestão Lula, Berzoini tem boa relação com Michel Temer, com outros dirigentes de partidos e aliados de modo geral. Ele volta para a coordenação, desde que Dilma lhe dê poderes para garantir a execução dos acordos com os aliados.

Da cota de amigos da presidente, Kátia Abreu - que chegou a ser cotada para a cadeira de Mercadante - seguirá na Agricultura, que deverá incorporar a Secretaria da Pesca. Mas Kátia revelou a interlocutores que a presidente lhe pediu que reforce a articulação política. No fim de semana, a ministra acionou lideranças do PMDB para tratar da reforma ministerial. Dilma deve se reunir com Temer ainda hoje para tratar do tema.

Na fase aguda da crise, Kátia se aproximou ainda mais da presidente, com quem tem se reunido até três vezes por dia. Senadora reeleita pelo Tocantins, tem bom trânsito com os senadores e parlamentares ligados ao agronegócio. Mas dificilmente ajudará no trato direto com o PMDB, onde é considerada "cristã-nova" e ingressou por causa da amizade com Temer. Kátia fez desafetos no PMDB. Ela se indispôs com setores do partido, quando assumiu o ministério e afastou nomeados de caciques da sigla.

Em outra ponta, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, fica para assegurar a aprovação do Orçamento e a recriação da CPMF. Nesta segunda-feira, ele já tem novo encontro com Renan Calheiros para apresentar mudanças no pacote fiscal. Levy também articula com o Congresso uma nova reforma da Previdência.

Apesar das especulações feitas na base aliada do governo, especialmente no PT e no PMDB, a presidente Dilma não pensa em fazer mudanças na área econômica nesta reforma. No PT e no PMDB surgiram especulações de que Lula iria sugerir o nome do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles para o Ministério da Fazenda. A troca não está em pauta para Dilma. Na cúpula do dois partidos, PT e PMDB, a avaliação é que a entrada de Meirelles poderia dar "um refresco" para o governo, mas provavelmente não seria a solução. Seguindo apurou o Valor, Meirelles é uma hipótese considerada nas duas siglas para o pós-Dilma, na eventualidade de afastamento da presidente.

Para líderes, derrota nos vetos liquida pacote

Por Leandra Peres – Valor Econômico

BRASÍLIA - O futuro do pacote econômico lançado pelo governo na semana passada será decidido muito antes das negociações para aprovar a recriação da CPMF. Os líderes do governo no Congresso dizem que uma derrota na votação dos vetos presidenciais amanhã enterrará qualquer outra proposta legislativa vinda do Executivo.

"Os vetos têm que funcionar como uma demonstração de força do governo. O problema é que a situação hoje está longe de ser uma vitória", diz um líder da base aliada.

O raciocínio é de que se o governo não conseguir mostrar coesão mínima em sua base para manter os vetos e capacidade de organizar os aliados na votação, esgotará o pouco espaço de manobra que ainda resta e não terá condições de negociar as medidas do pacote econômico, que exigem quorum de 308 votos para aprovação, superior à votação dos vetos.

O Congresso terá que decidir amanhã à noite sobre o reajuste de 78% do Judiciário, a correção das aposentadorias mais altas pelo mesmo índice do salário mínimo e a substituição do fator previdenciário por uma fórmula menos austera que combina idade e tempo de contribuição. "É só bomba", descreve o líder.

Não é por outra razão que a presidente Dilma Rousseff, em reunião na semana passada com os líderes, pediu que fosse feito um levantamento detalhado da posição de cada bancada sobre os vetos presidenciais. O resultado será apresentado hoje ao ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, que agora faz a coordenação política do governo.

No fim da semana passada, o diagnóstico era de que o governo não conseguiria segurar a derrubada de todos os vetos, especialmente a correção dos salários dos servidores do Judiciário. O fim do fator previdenciário é considerado pelos líderes o menos polêmico uma vez que o governo já enviou uma medida provisória ao Congresso que prevê a substituição do fator por uma fórmula móvel de idade e tempo de contribuição que, em tese, foi resultado de negociação com os parlamentares.

Um outro líder aliado na Câmara dos Deputados conta que há três meses conversa com sucessivos coordenadores políticos do governo para encaminhar os pedidos de sua bancada. Apenas dez deputados foram atendidos. Segundo ele, o desgaste é tamanho que "nem cargos estão conseguindo segurar a base". A reação de deputados ao saber que terão que esperar ainda mais pelas nomeações ou que o governo quer mudar a indicação para um outro cargo é de exasperação. "A maioria diz que é para 'deixar para lá', que não quer mais saber de negociar com o governo", descreve este líder.

A mudança na coordenação política depois de menos de três meses que a presidente pediu ao vice-presidente, Michel Temer, para assumir as funções é tratada pelos líderes como mais um recomeço. Será preciso apresentar as demandas novamente ao ministro Berzoini, saber se ele terá autonomia e poder para negociar e nomear e se não será sabotado pela Casa Civil, onde está o ministro Aloizio Mercadante.

Dilma vai procurar Temer para evitar arestas com aliado

• Cúpula do PMDB está irritada por não ter informações sobre reforma ministerial

Cristiane Jungblut – O Globo

- BRASÍLIA- A presidente Dilma Rousseff se reuniu ontem à noite com ministros, mais uma vez, para fechar os detalhes das medidas fiscais a serem enviadas ao Congresso e os detalhes da reforma ministerial. Após chegar de Porto Alegre, onde almoçou com a família, ela recebeu no Palácio da Alvorada os ministros Luís Inácio Adams ( Advocacia Geral da União), Nelson Barbosa ( Planejamento), Miguel Rossetto ( Secretaria Geral) e Ricardo Berzoini ( Comunicações). Para evitar criar arestas com o PMDB na reforma ministerial, Dilma quer ter uma conversa final com o vicepresidente Michel Temer sobre o tamanho do partido na Esplanada. O encontro deve ocorrer hoje, antes de uma reunião da cúpula do PMDB, convocada por Temer para esta noite.

Dilma mantém o plano de anunciar até quarta- feira a reforma ministerial e administrativa e oficializar as medidas do pacote fiscal necessário para reverter o déficit de R$ 30,5 bilhões no Orçamento de 2016. As medidas foram anunciadas semana passada, mas os respectivos projetos de lei, decretos e propostas de emenda constitucional ainda não foram divulgados. Dilma avisou aos aliados que as medidas serão enviadas ao Congresso sem alterações.

Preocupação com derrubada de vetos
Nas conversas do fim de semana, Dilma também pediu atenção máxima à votação dos vetos presidenciais pelo Congresso, em sessão marcada para amanhã. Se derrubados, esses vetos jogarão por água abaixo o ajuste fiscal, e, por isso, Dilma quer que eles só sejam votados se os líderes do governo tiverem certeza de que serão mantidos. Ela também decidiu que a reforma ministerial terá que ir além do fim do status de ministro de alguns colaboradores.

— A presidente já se convenceu de que não dá apenas para tirar o status de ministro do presidente do Banco Central ou do advogado- geral da União — disse um interlocutor da presidente.

Cúpula do PMDB se reúne em jantar
Temer convocou os principais caciques do PMDB para um jantar, quando eles decidirão como se comportar nesta nova fase do governo. O vice- presidente e o restante da cúpula peemedebista estão irritados com os vazamentos sobre os ministérios da legenda no novo desenho da Esplanada. A avaliação geral, inclusive do presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL), é que o Planalto foi “desastrado” mais uma vez ao promover a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, amiga de Dilma, a interlocutora do partido.

— Estamos tentando identificar o autor desta lambança. Quem fala pelo PMDB é o Michel. Criar mais um problema a esta altura é falta de noção — disse um ministro.

A cúpula peemedebista já decidiu que não cairá no que considera uma “armadilha” de ministros petistas: fazer o próprio PMDB escolher quais dos seus atuais seis ministros permanecerão. Os ministros petistas querem reduzir o espaço do PMDB para quatro ou três pastas.

Renan disse aos seus colegas de partido que não foi consultado sobre ministérios. As especulações sobre redução das pastas causou irritação no partido. O ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves tem deixado claro nos bastidores que não quer sair. Líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira ( CE) disse que a bancada não foi consultada.

— A bancada do PMDB não se manifestou sobre a reforma ministerial e administrativa — disse Eunício.

Para Serra, saída para a crise é a adoção do parlamentarismo

• Senador diz que sistema evita troca- troca exigido por deputados

- O Globo

O senador José Serra ( PSDB- SP) defendeu, em entrevista para o “Preto no Branco”, programa do jornalista Jorge Bastos Moreno exibido ontem pelo Canal Brasil, a adoção do parlamentarismo no Brasil. O tucano entende que a mudança do sistema de governo, atualmente presidencialista, seria a verdadeira reforma política a ser oferecida à sociedade pelo Congresso Nacional.

Em situação de crise, argumentou o senador, os deputados teriam de pensar duas vezes antes de enfraquecer o governo. Isso porque, no sistema parlamentarista, todos correriam o risco de disputar nova eleição:

— Se o presidente quiser, ele convoca eleição. Imagina o parlamentar... “Opa, vou desestabilizar o governo?” Se desestabiliza, ele pode ter que se candidatar de novo.

Para Serra, enfrentar uma crise no presidencialismo é processo sempre traumático, pois cada votação se dá na base do troca- troca, e “o país fica instável” por causa do processo:

— Hoje, um deputado, nesse mal chamado presidencialismo de coalizão, tem as benesses e não tem a contrapartida, necessariamente.

No sistema defendido pelo senador, o mandato do primeiro- ministro — o chefe de governo — não tem duração definida: ele permanece no cargo enquanto tiver apoio parlamentar e governar corretamente. Serra lamenta que parcela da sociedade faça uma ideia equivocada do parlamentarismo:

— Há uma coisa folclórica de que o parlamentarismo é governo de deputados, e que o governo é fraco. Não é, não. A maioria tem que apoiar o governo. Se ele perde um projeto importante, cai, e a maioria fica chupando o dedo.

O tucano se confessou arrependido por não ter defendido com mais vontade, no governo de José Sarney ( 19851990), a implantação do parlamentarismo proposta pelo presidente. Na época, Sarney reivindicou um mandato de cinco anos, sendo que no último indicaria um primeiro- ministro:

— Era razoável. Se você recomeçar o parlamentarismo, bota aí um período que o primeiro- ministro tem estabilidade. Depois, se ele estiver indo mal, você troca numa boa. Se o parlamentarismo prevalecesse, não estaríamos vivendo esta crise. Teria mudado o governo e acabou.

Serra lembrou que, enquanto Fernando Henrique Cardoso, Ulysses Guimarães, José Richa e Nelson Jobim e ele eram favoráveis à proposta, Mário Covas foi contrário.

Críticas ao PT
Perguntado sobre a solução para a crise enfrentada pelo governo da presidente Dilma, Serra foi pessimista:

— Não vejo uma solução atrás da esquina. Se você me pedisse para fazer na ponta do lápis o que tinha que fazer com a economia, a gente poderia até esquematizar, mas trata- se de governo, de processo social, de diferentes poderes. Enfim, há muita coisa indeterminada, indefinida, e um governo fraco. Essa é a verdade. O governo Dilma resultou em um governo fraco, no sentido de fixar propósitos, persegui- los, materializálos e antecipar os acontecimentos. Ele vai sempre atrás daquilo que está acontecendo

Serra criticou os petistas por terem obsessão pelo ex- presidente Fernando Henrique Cardoso:

— Mesmo no programa do PT, que eles fizeram, continuam batendo no Fernando Henrique. Ele é culpado de tudo. É uma coisa absurda.

PSDB tentará romper ‘ Cinturão Vermelho’

• Tucanos apostam em sentimento antipetista para eleger candidatos ao redor da capital paulista

Silvia Amorim, Sérgio Roxo - O Globo

- SÃO PAULO- O cenário eleitoral que se desenha para 2016 na única região do estado de São Paulo onde o PT tem supremacia política em relação ao PSDB aponta para um enfrentamento entre petistas e tucanos dos mais acirrados. A crise política e econômica, que desgasta o governo Dilma Rousseff e o PT, reavivou o interesse dos tucanos pelo chamado Cinturão Vermelho paulista, um conjunto de oito prefeituras administradas pelo PT ao redor da capital.

Algumas delas, como Guarulhos e Osasco, estão no comando da sigla há 15 e dez anos, respectivamente. Diferentemente de eleições anteriores, o planejamento do PSDB para o próximo ano é lançar candidato próprio em todos esses bastiões petistas.

Duas cidades são os maiores objetos de desejo do PSDB: Guarulhos e São Bernardo. Isso porque uma eventual vitória nesses locais seria simbólica. A primeira é o maior município da região metropolitana de São Paulo, e a segunda, o berço do petismo e onde vive o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva. Hoje, o PT governa uma população quase cinco vezes maior do que a do PSDB no entorno da cidade de São Paulo — 4,7 milhões contra 1 milhão — excluindo- se a capital paulista.

Dois candidatos definidos
Apesar da intenção, o PSDB tem candidato definido hoje somente para duas cidades do cinturão petista. Uma delas é São Bernardo, onde o deputado estadual Orlando Morando foi escalado para enfrentar o sucessor de Marinho.

Morando levou a eleição em 2008 para o segundo turno contra o atual prefeito. Em 2012, o PSDB optou por não ter candidatura própria. Outra cidade onde a situação está acertada é Mauá. Nesse caso, a solução veio de fora do partido. O PSDB filiou há algumas semanas Clovis Volpi, então no PTB, ex- prefeito de Ribeirão Pires, para tentar impedir a reeleição do petista Donisete Braga.

Os tucanos ainda analisam quem será o representante do partido na eleição municipal em Santo André, Guarulhos, Osasco, Carapicuíba, Franco da Rocha e Embu das Artes. Em 2012, o partido não teve candidato em três cidades do Cinturão Vermelho. Em Osasco, o PSDB venceu o pleito naquele ano, mas seu candidato foi impugnado.

O contexto político de crise nacional e o sentimento antipetista em São Paulo têm sido considerados pelo PSDB como uma das maiores janelas de oportunidade que o partido teve para enfraquecer o adversário em seu reduto histórico.

— Estamos otimistas e nos preparando para avançar sobre prefeituras do PT. A eleição em São Paulo é uma disputa sempre muito relacionada ao cenário nacional. Com o governo Dilma Rousseff fragilizado, o PT se desmanchando e os governos locais petistas sofrendo com a falta de dinheiro e apoio do governo federal, o quadro promete ser muito favorável aos candidatos da oposição. É o melhor momento que o PSDB vive para essa região — afirmou o secretário- geral do PSDB em São Paulo, Cesar Gontijo.

O partido não está de olho somente nas prefeituras petistas, e tem se preparado para investir eleitoralmente em outras cidades que considera estratégicas na região metropolitana. Dos 39 municípios da área, o PSDB administra apenas cinco, apesar de ser o maior partido em número de prefeituras no estado. Para isso, a legenda iniciou uma onda de filiações. Ex- prefeitos de outros partidos considerados competitivos estão sendo cortejados pelos tucanos. Três já foram filiados desde julho para as eleições em São Caetano, Barueri e Itaquaquecetuba.

O PT desdenha da ofensiva tucana sobre o Cinturão Vermelho.

— Eles anunciaram esse plano em 2012 e levaram uma surra — afirmou o presidente do PT em São Paulo, Emídio de Souza.

PT: PSDB também tem problemas
O dirigente do partido disse acreditar que as questões locais vão dar o tom dos debates nas eleições municipais do próximo ano, minimizando assim o impacto do degaste nacional da imagem do partido:
— Na eleição municipal o tema predominante sempre é a gestão local. Isso aconteceu tanto no auge do nosso prestígio nacional como agora.

Para Emídio, o PSDB também enfrenta problemas que podem atrapalhar os planos dos tucanos em São Paulo.

— O ( governador Geraldo) Alckmin também não está num bom momento, com matanças ( chacinas com suspeitas de participação de policiais) e falta d‘ água — disse o petista.

Entre os municípios da região metropolitana, São Bernardo é considerado ponto de honra pelos petistas, por ser a cidade de Lula. Ao longo de seus oito anos de gestão, Luiz Marinho recebeu generosos repasses de recursos do governo federal.

Marinho deve apontar, nos próximos meses, como candidato a seu sucessor, o secretário de Ser viços Urbanos, Tarcísio S ecoli, que nunca disputou uma eleição. Tarcísio tem alguns pontos em comum com o atual prefeito: ambos iniciaram a carreira no Sindicato dos Metalúrgicos e fazem par te do gr upo de amigos que frequenta a casa de Lula.

Partidos terão de fazer 'ajuste' em 2016

• Com doação de empresas proibida pelo STF, Fundo Partidário se tornará a principal fonte de recursos nas eleições municipais

Daniel Bramatti, Rodrigo Burgarelli - O Estado de S. Paulo

Em 2016, partidos e candidatos terão de fazer um "ajuste fiscal" mais profundo que o do governo federal para bancar os custos e fechar as contas das eleições municipais. Com a proibição das doações de empresas, determinada pelo Supremo Tribunal Federal na semana passada, o Fundo Partidário, alimentado por recursos públicos, se transformará na principal fonte de financiamento de campanhas.

O problema é que, para os padrões de gastos vigentes, os recursos serão insuficientes. Mesmo se fosse integralmente investido nas campanhas, o atual valor do Fundo Partidário - R$ 867 milhões - cobriria menos de 20% dos custos das mais recentes eleições municipais, realizadas em 2012.

O PT, por exemplo, gastou, em valores corrigidos pela inflação, quase R$ 835 milhões nas campanhas de todos os candidatos do partido a prefeito e a vereador há três anos. Sua atual cota anual no Fundo Partidário, de R$ 116 milhões, equivale a apenas 14% das despesas eleitorais de 2012.

Para equilibrar as contas, os partidos terão as seguintes alternativas: cortar gastos, multiplicar as doações de pessoas físicas ou elevar o valor do Fundo Partidário - ou, ainda, tentar promover uma combinação dessas três medidas.

Nenhuma das alternativas é de simples aplicação. Um simples corte de despesas teria de ser drástico - da ordem de 65% para bancar uma campanha apenas com o Fundo Partidário e as doações de pessoas físicas, supondo que o valor do primeiro item se mantenha no atual nível e o do segundo repita o padrão verificado em 2012.

Conquistar mais doações de pessoas físicas também não será tarefa fácil - essa modalidade de financiamento não tem tradição no Brasil, e mudar esse cenário é ainda mais complicado em um contexto de alta desconfiança em relação a partidos e políticos, tendência constatada por diversas pesquisas de opinião.

Em 2012, doações de pessoas físicas cobriram cerca de 20% do total de gastos dos concorrentes a prefeito e a vereador - estão incluídas na conta contribuições de candidatos que custearam as próprias campanhas.

Por fim, restaria aos partidos a opção de voltar a "turbinar" o Fundo Partidário, algo que o Congresso vem fazendo, ano a ano, desde 2011. No início deste ano, os valores do fundo tiveram uma elevação recorde de 200%, decidida por um acordo entre os principais líderes partidários na votação do Orçamento-Geral da União.

Mas o cobertor orçamentário é curto, conforme demonstra a crise fiscal por que passa o governo federal. Para ampliar a destinação de verbas ao Fundo Partidário, seria necessário tirar recursos de outros programas ou setores do governo - uma medida de alto custo político em meio à batalha dos ministérios por verbas.

Para manter em 2016 os mesmos níveis de gastos de 2012, o Congresso Nacional teria de multiplicar por seis a atual dotação orçamentária do Fundo Partidário - o que faria o aumento recorde deste ano parecer modesto. Ainda assim, parte do dinheiro não poderia ser usado em campanhas, já que está comprometida com a manutenção da máquina dos partidos - pagamento de salários e de aluguel de sedes, por exemplo.

Proibição. As doações de empresas para candidatos a partidos foram consideradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, em julgamento que demorou um ano e cinco meses e foi concluído na quinta-feira passada pela Corte - oito ministros votaram a favor da proibição do financiamento eleitoral por pessoas jurídicas.

A decisão do Supremo deve tornar sem efeito a parte da minirreforma política aprovada recentemente pelo Congresso que trata do financiamento privado de campanhas. Com isso, as únicas fontes legais serão o Fundo Partidário e as pessoas físicas, que poderão doar até 10% da renda bruta declarada no ano anterior ao da eleição.

Aécio Neves - Sem rumo

- Folha de S. Paulo

Se questionados, provavelmente 9 em cada 10 brasileiros achariam o atual governo um dos mais fracos e ineptos de toda a história do país. O décimo teria certeza.

Contrariando a máxima de que toda unanimidade é burra, vai se consolidando no país a convicção de que vivemos um período de desgoverno sem paralelo, agravado pela reiterada incapacidade de quem o comanda de se colocar à altura da complexidade da crise. Crise, aliás, urdida e fomentada nas hostes do partido governista, sob as bênçãos de suas maiores lideranças.

O que mais assusta é a ausência de perspectivas. Não há uma agenda visível e factível para o país.

Para onde vamos, afinal? O que estamos assistindo, entre assustados e indignados, é a erosão crescente do nosso futuro. O presente, por sua vez, é uma incógnita que se sustenta na falta de uma coordenação efetiva. Este é um governo que reage apenas a espasmos, quando se sente acuado.

Foi preciso perder a nota de crédito de uma agência de risco para anunciar o esforço necessário para apresentar um Orçamento que não fosse deficitário. O pacote improvisado está longe de reduzir o ônus do Estado obeso e ineficaz que a nação é obrigada a carregar e impõe sacrifícios a quem já paga uma das taxas de tributação mais altas do planeta.

O receituário de plantão é um só: aumentar a arrecadação com mais impostos. Já pressionado pela conjugação de inflação e recessão, o brasileiro se vê forçado a pagar ainda mais ao Estado. A verdade é que parece que a presidente não quer mudar nada. Ao que tudo indica, ela nunca achou que estivesse errada. Para que tenha êxito, qualquer programa de ajuste depende da confiança em quem o conduz.

Mas como confiar em quem usou e abusou da mentira, omitindo do país uma realidade que já se anunciava extremamente grave, apenas para vencer as eleições? Como confiar em um governo que diz uma coisa hoje e amanhã age de forma contrária?

Os movimentos erráticos proliferam em todas as direções, desnorteando empresários, investidores e cidadãos. Os ministros da área econômica divergem sem constrangimento, as bases de sustentação da atual administração clamam contra as medidas e o próprio Planalto dá sinais ambíguos sobre as políticas e medidas que defende em público.

Nas relações conflituosas com o Poder Legislativo e no desrespeito com as forças legítimas da oposição, o governo tem sido pródigo em contrariar todos os fundamentos da boa política.

O que mais falta acontecer?

P.S.: Em meio a todo o debate sobre a grave crise econômica, chama a atenção o ensurdecedor silêncio do ex-ministro Guido Mantega. Nem uma palavra em defesa da obra que conduziu sob as bênçãos dos presidentes Lula e Dilma.

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Aécio Neves é senador e presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat - O que Lula não tem

- O Globo

Você pune um menino de rua que rouba e não pune as pessoas do andar de cima? Não pode ser assim. Hélio Bicudo, jurista

Viver é muito perigoso. Mas viver no limite da irresponsabilidade é muito mais. Há quem goste. Soa como um desafio. Exemplo: quanto não deve excitar Lula a proximidade da sombra da Lava- Jato? As informações reunidas pelo juiz Sérgio Moro comprometem Lula com o que começou de fato a acontecer durante o seu segundo governo. Era preciso pagar dívidas da campanha de 2006. A saída? Roubar a Petrobras.

Lula é um sobrevivente (cuidado com sobreviventes. Acham-se capazes de tudo). Sobreviveu à seca no Nordeste, à miséria em São Paulo, aos riscos da vida sindical na ditadura de 64, e a três derrotas seguidas para presidente. O candidato antes favorável à limitação do direito de propriedade privada, ao aborto e à estatização dos bancos, virou o Lulinha Paz e Amor e, afinal, elegeu-se.

Um dos segredos do seu sucesso: a falta de princípios. Poderia repetir a sério o que o comediante norte-americano Groucho Marx afirmou fazendo graça: “Esses são meus princípios. Mas se você não gosta deles, tenho outros”. Lula por ele: “Sou uma metamorfose ambulante”. Lula por Hélio Bicudo, fundador do PT: “Ele só está em busca de vantagem para ele e para sua família”.

Na semana passada, Lula reuniu-se com Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados. Pediu-lhe que segurasse qualquer pedido de impeachment contra Dilma. Indecorosa atitude! Um pedido de impeachment que respeite os preceitos legais deve ser mandado adiante. O presidente da Câmara exorbitaria dos seus poderes se o retivesse.

Se sabe disso, Lula não se importa. No seu primeiro governo, telefonou para José Viegas, Ministro da Defesa, intercedendo pelo advogado Roberto Teixeira. Havia morado de graça em um apartamento dele em São Bernardo. Pediu a Viegas para facilitar a vida de Teixeira, interessado nos espaços ocupados pela massa falida da Transbrasil em aeroportos país a fora. Um ótimo negócio.

A Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT condenado no caso do mensalão, Lula pedia para esconder acesa a cigarrilha que fumava quando era alvo de fotógrafos. Ao senador que o procurou em 2006 dizendo que Marcos Valério, operador do mensalão, queria dinheiro para ficar calado, Lula limitou-se a perguntar: “Você procurou Okamotto?” Paulo Okamotto, hoje, preside o Instituto Lula.

Valério jamais abriu a boca. Quando tentou era tarde. Pegou 40 anos de cadeia.Lula escapou depois de se dizer traído pelos mensaleiros e entregar a cabeça de José Dirceu. Nega-se a admitir que o mensalão existiu. Mas pediu o voto de quatro ministros do Supremo Tribunal Federal em favor dos mensaleiros. Um dos ministros: Gilmar Mendes.

O mesmo que assistiu, certa vez, a uma cena inesquecível. Estava na antessala do gabinete de Lula, no Palácio do Planalto, quando o viu sair acompanhado de José Sérgio Gabrielli, então presidente da Petrobras. “Veja só, Gilmar. Um Procurador da Fazenda, no Rio, está chantageando a Petrobras”, narrou Lula. “Eu falei pro Gabrielli: Por que você não manda grampear ele?” Grampo é crime.

Lula não vê nada de mais em ter informado ao Exército, ao completar 18 anos, que media dois centímetros a mais do que media. Não se conforma em ter menos de um metro e setenta. Nem vê nada demais no fato do seu filho mais velho ter enriquecido enquanto ele presidia o país. Lula considera natural ter enriquecido prestando serviços a empresários, e de nessa condição aspirar a um novo mandato de presidente. Ilegal não seria. Seria simplesmente imoral.

José Roberto de Toledo - A volta do bumerangue

- O Estado de S. Paulo

Se é difícil para Dilma Rousseff ir até 2018 “com 7% ou 8% de popularidade”, tampouco seria fácil para o autor da frase concluir o mandato que por acaso venha a herdar só com 11%. Essa é a parcela da população que acha Michel Temer ótimo ou bom como vice-presidente, segundo pesquisa inédita do Ibope divulgada com exclusividade aqui. Temer e Dilma estão tecnicamente empatados em desaprovação. Na última pesquisa Ibope divulgada, em junho, ela tinha 9%, com margem de erro de dois pontos porcentuais.

A dificuldade de a presidente terminar no prazo legal o mandato para o qual foi eleita foi ressaltada pelo próprio vice há 20 dias, durante entrevista à coordenadora de um dos muitos movimentos de classe média alta paulistanos que defendem o impeachment de Dilma: “Se continuar assim, vou dizer a você, com 7%, 8% de popularidade, fica difícil passar três anos e meio”.

Como qualquer um imaginaria, o desarranjo verbal percutiu como uma granada – até porque não foi o primeiro. Desde então, Temer afastou-se para longe dos holofotes brasilienses. Bem longe. Foi em missão oficial à Rússia, onde posou para foto negociando com o vice-primeiro-ministro. Vice com vice, subentendia-se da legenda. Mas Temer não foi para seu Gulag sem antes conversar separadamente com dois eternos presidenciáveis do PSDB. Não falaram sobre impeachment, garantem os três. “Da, konechno.”

Temer passou a ser a nota em comum entre os sempre dissonantes caciques tucanos desde que eles avaliaram que o PSDB não deveria assumir publicamente a vanguarda do impeachment. Para não dar de mão beijada a Dilma o discurso de que ela é vítima de golpe – e, de quebra, deixar com o PMDB o desgaste da estabilização. Como raramente fazem, Aécio Neves, Fernando Henrique, José Serra e até Geraldo Alckmin concordaram que é melhor o PMDB comandar o processo, segundo revelou a repórter Daniela Lima, no sábado.

Não chega a ser uma conclusão original. Até o Planalto sabe que sem o PMDB o impeachment não alcançará os 342 votos necessários na Câmara dos Deputados. Mais importante, sem o aval do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB), o pedido para sacar Dilma nem sequer entraria na pauta de votação. Daí que Cunha e o PMDB estão sendo cortejados simultaneamente pelo PSDB e por Lula da Silva para fazer o oposto. Mesmo que tudo venha a ser acertado por cima, faltou combinar por baixo. Qual a opinião pública sobre os chefes do PMDB? A questão é pertinente e oportuna. Afinal, eles comandariam o processo de impeachment e assumiriam a frente do governo – com os tucanos atrás – caso Dilma entregue a faixa mais cedo.

Entre 12 e 16 de setembro, o Ibope perguntou: “Pelo que sabe ou ouve falar, como avalia a atuação do Michel Temer, vice-presidente da República? É ótima, boa, regular, ruim ou péssima?”. Só 2% ficaram com a primeira opção; 9%, com a segunda; 29%, com a terceira; 14%, com a quarta; 26% com a última. Isto é: 11% de ótima/boa contra 40% de ruim/péssima e 29% de regular. Os outros 21% não responderam. Não têm ideia de quem seja Temer nem do que é capaz. É nesses que ele pode ter alguma esperança. Na maioria que tem ideia, o vice é como a presidente, quase uma unanimidade. A popularidade de Temer varia de 7% no Sul a 12% no Nordeste; de 10% entre os mais pobres a 11% entre os mais ricos. Popularidade é bumerangue: vai longe, mas volta na orelha.

E os presidentes da Câmara e do Senado, que ocupam o terceiro e o quarto lugares na linha sucessória de Dilma? Como são avaliados? Do mesmo jeito que a primeira e o segundo da linha: Cunha tem 11% de ótimo/bom e 40% de ruim/péssimo; Renan Calheiros, 8% de ótimo/bom e 40% de ruim/péssimo. São ilustres desconhecidos para 26% e 25% da população, respectivamente.
O pós-Dilma, se vier, não será fácil como seus vendedores dão a entender que será.

Vinicius Mota - Renunciar, verbo apassivado

- Folha de S. Paulo

Quando se trata de Dilma Rousseff, é bom ter cautela nas conclusões, mas ela parece ter compreendido o poder que a renúncia lhe dá. A hipótese de entregar o boné aplacou a sabotagem contra o Planalto que Lula e o PT praticam.

Os companheiros vinham malhando todo ensaio de medida restritiva adotado por seu próprio governo. Na Argentina, 11 dias atrás, Lula condenou o ajuste fiscal.

Preservar a conduta dúbia seria ideal para o lulismo. Manter-se-ia desobstruído o escape de emergência, em caso de impeachment, para um período de recolhimento de cacos em que tudo seria terrível para o PT, menos a faculdade de discursar como vítima de "golpismo", na oposição a um governo também obrigado a conduzir ações impopulares.

A renúncia da presidente, contudo, anularia até mesmo esse prêmio de consolação ao petismo. Como posar de injustiçado se a criatura voluntariamente desistir de governar? Como opor-se de corpo e alma a algo que terá sobrevindo diante da assunção incontestável de incapacidade?

Lula despenhou-se para Brasília quando começou a cair a ficha de que a renúncia poderia ser uma atitude de rebelião de Dilma contra o progressivo isolamento imposto pelo seu criador. O ex-presidente engoliu tudo o que dissera –como de hábito– e cerrou fileiras com o esfolamento tributário da população, proposto por um palácio atarantado.

Para o enredo de saída do PT, Dilma precisa ser a mártir do impeachment. A presidente decifrou o jogo e chacoalhou a seu favor a bandeira da renúncia, embora ainda não tenha chegado ao ponto em que abandonar o cargo passa a ser uma cogitação diária do governante acuado.

Quando essa fase começa, o verbo renunciar deixa de ser conjugado apenas na voz ativa. O mandatário, mais ou menos como o paciente terminal diante do suicídio assistido, pondera se é melhor "ser renunciado" e evitar humilhação maior.

Marcos Nobre - Dilma Rousseff está acuada e só

• A presidente pode não ter tropa para ir à guerra

- Valor Econômico

Na multidão de informações contraditórias e desencontradas que vem de Brasília, uma se destaca de maneira insistente: a de uma possível renúncia de Dilma Rousseff. Nesse cenário, a presidente teria sido destituída do comando por suas próprias tropas, que teriam preferido entregar o governo a ir à guerra do impeachment. Sem exército, Dilma Rousseff não teria outra opção senão a rendição. Essa explicação depende de ter se dado um alinhamento das principais forças políticas. Não em favor do desejável acordo provisório para atravessar o período de desorganização do sistema que veio com a Operação Lava-Jato, mas pela renúncia da presidente.

A se confirmar essa configuração, mal se pode imaginar o grau de espanto da presidente diante do ultimato. Mas é possível imaginar que o espanto é proporcional à dificuldade da tarefa de convencê-la a renunciar. Afinal, ela pode perfeitamente apostar que o PT e alguma parte da base não têm outra opção senão defendê-la se a guerra do impeachment for declarada. Como general treinada na guerrilha, a presidente pode enumerar de cabeça todos os dispositivos de defesa a seu favor: as fraturas e inconsistências dos exércitos inimigos, as tropas que a caneta presidencial pode arregimentar, as estratégias de batalha que só quem conhece muito bem o terreno do Estado e de sua ocupação pode desenhar.

Tudo isso parece exato e verdadeiro. O momento seria ainda de preparação para guerra e ambos os fronts padecem de falta de organização e de ausência de discurso crível de mobilização de tropas. Não haveria por que decretar desde já a derrota de um dos lados. Mas, se essa armação dos fatos e das informações se confirmar, as conferências de cúpula do sistema político ocorridas nos últimos dias teriam decidido por um armistício sem guerra. O artífice e o garante dessa desmobilização geral teria sido ninguém menos do que o próprio Lula.

Nessa explicação, a renúncia da presidente serviria a ambos os lados. Lula teria se reaproximado de Dilma Rousseff na última semana não para compor o front contra o impeachment e ajudar na organização do exército, mas para convencê-la a se render. O cálculo teria envolvido algumas variáveis fundamentais. A primeira seria a incerteza de uma guerra com alto grau de desorganização de lado a lado. O tempo passa e não aumenta a coesão em ambas as trincheiras, pelo contrário. Seria o primeiro processo de impeachment com dois exércitos efetivos. Mas nenhum deles disporia de real unidade, seja de comando, seja de discurso. Lula não enxergou como poderia continuar tentando compatibilizar ajuste fiscal, movimentos sociais, PT, Mercadante, Joaquim Levy e Dilma sem rapidamente destruir seu próprio campo.

O segundo elemento que teria pesado em favor dessa linha de ação teria sido o futuro eleitoral do ex-presidente e de seu partido. É opinião unânime que o PT será duramente castigado nas eleições dos próximos anos. O risco de debandada desorganizada é real e iminente. Boa parte desse movimento é inevitável e já foi computado pela direção partidária. Mas é preciso manter uma estrutura e uma unidade de base que permitam resistir ao desmantelamento. A continuidade do governo Dilma Rousseff se tornou uma ameaça à sobrevivência do PT.

Daí a opção por uma retirada o quanto possível organizada. Em paralelo a isso, o horizonte econômico continua tétrico e não deve melhorar em menos de um ano. É claro que Michel Temer será muito bem sucedido em colocar a culpa por todo o sofrimento em Dilma Rousseff. Mas o PT poderá voltar a um lugar que lhe permita reorganizar as tropas que restaram. Fora do governo, deverá começar imediatamente um movimento de "volta às raízes".

Outro importante elemento na opção pela rendição seria o risco do confronto se generalizar e de atingir níveis de violência incontroláveis. A desproporcionalidade entre as forças de lado a lado não significa dizer que as batalhas seriam menos sangrentas. Pelo contrário, um pequeno, mas aguerrido contingente de tropas pode produzir grandes estragos. Especialmente quando o recurso às mobilizações de rua se faz necessário, como seria o caso em um processo de impeachment. Especialmente quando a situação econômica e política produz um grau de raiva e de frustração social que pode servir de combustível para confrontos de consequências imprevisíveis.

No front do impeachment, o acordo representaria o alívio de ganhar a guerra sem precisar guerrear. Mas há ainda muito mais em jogo. Quem quer que tenha vivido a ditadura e a redemocratização sabe o trabalho que dá construir um Estado Democrático de Direito. A estultice corrente de que o impeachment é um "processo político" - senha para utilizar pretextos em lugar de crimes efetivamente cometidos - não serve nem pode servir para um político treinado e experiente. Levado adiante um processo de impeachment em que não há um único fato que incrimine a presidente perante a lei, estaria aberto o flanco institucional para que qualquer ocupante da presidência, sob qualquer pretexto, pudesse ser afastado quando as pesquisas de opinião indicassem estar abaixo de 10% de aprovação. A renúncia faria sumir como que por encanto todas essas enormes dificuldades.

Qualquer que seja o desfecho dessa agonia, não pode passar sem registro a irresponsabilidade de quem insuflou mobilizações de rua contra o legítimo resultado das eleições do ano passado e depois se mostrou incapaz de explicar para a população como e por que, afinal, pretendia retirar do poder uma presidente que não violou qualquer dispositivo legal que justifique um impeachment. Figuras como o candidato Aécio Neves mostraram desprezo inaceitável pela instituição eleitoral e assumiram com isso o risco de provocar confrontos sociais de consequências imprevisíveis. A vantagem da democracia é permitir que ataques feitos contra ela encontrem nas urnas uma resposta. A vantagem da história, quando chega a devida hora de suas batalhas, é poder reservar para esse tipo de figura um lugar de destaque no salão da pequenez política.
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Marcos Nobre é professor de filosofia política da Unicamp e pesquisador do Cebrap.

Valdo Cruz - Timing errado

- Folha de S. Paulo

Dilma Rousseff vai chegando ao final do nono mês do seu segundo mandato gestando dois ajustes fiscais e uma reforma administrativa e ministerial que deveriam ter sido obras para os primeiros meses do seu governo.

Não por outro motivo a petista está presa, praticamente desde que foi reeleita, a uma agenda negativa da qual não consegue se desvencilhar.

Para quem dizia que ajuste é coisa de tucano, deve ser terrível ter de bancar não só um, mas dois pacotes fiscais em menos de um ano –e sem que o primeiro ainda tenha tido o efeito esperado e necessário.

Pior, talvez, seja curvar-se às pressões de aliados e prometer um corte de ministérios, defendido pela oposição na campanha eleitoral, exatamente no momento em que não pode nem pensar em desagradar sua frágil base aliada no Congresso.

Um erro de cálculo e lá se vai a segunda fase do ajuste fiscal antes mesmo de ela chegar ao Legislativo. Isto mesmo, anunciadas na segunda-feira passada, talvez as medidas cheguem hoje ao Congresso com uma semana de atraso.

Sem falar no pior dos mundos. Deixar aliados insatisfeitos pode ser fatal quando o fantasma do impeachment assombra o governo nos corredores da Câmara dos Deputados.

Para ajudar sua criatura a sair desta enrascada, Lula circulou por Brasília dizendo não que aguenta mais falar de ajuste fiscal e voltou a aconselhar a presidente a criar urgentemente uma agenda positiva para levantar o astral do país.

Questionado por petistas que agenda seria essa, citou a redução da taxa de juros neste momento de recessão. Ato contínuo, porém, ele mesmo reconheceu que, hoje, isso é impossível diante da falta de confiança nos rumos da economia.

Enfim, o timing do governo está todo errado. Fruto de decisões tomadas sem muita convicção pela presidente, que agravam os problemas e obrigam a petista a aprofundar medidas que só lhe trazem desgaste.

Marcus Pestana - Reforma política e crise fiscal

- O Tempo (MG)

A Câmara dos Deputados esteve às voltas com dois temas essenciais para o futuro do país: reforma política e ajuste fiscal. Essas pautas, que num primeiro olhar parecem distantes e independentes, estão absolutamente interligadas.

Há anos o Congresso Nacional tenta promover uma verdadeira reforma política para qualificar a democracia brasileira. Em 2015, a decisão das lideranças políticas na Câmara e no Senado foi levar a voto o assunto. Não custa lembrar aqui os quatro objetivos centrais: aproximar sociedade e representação política, diminuir o peso do poder econômico e baratear as campanhas, fortalecer os partidos políticos e melhorar o ambiente para a governabilidade.

Após a tramitação na Câmara e no Senado, o texto da nova legislação se encontra na Presidência da República para a sanção e possíveis vetos. Infelizmente, o texto produzido nem sequer merece o nome de “reforma política”. A pulverização excessiva de partidos, a deterioração da densidade ideológica do quadro político, a falta de canais eficientes de diálogo entre os maiores partidos produziram uma microrreforma eleitoral. Como eu disse no plenário: “A montanha pariu um rato”.

Nenhum dos objetivos estratégicos foi alcançado. Não houve a mudança tão necessária do sistema eleitoral, as regras de financiamento ficaram imprecisas e frouxas, as coligações proporcionais não foram extintas, a cláusula de desempenho não foi aprovada. As mudanças são periféricas. Por fim, o Supremo acabou por proibir a doação de empresas a partidos e candidatos.

Na verdade, somos vítima de um círculo vicioso: precisamos de uma reforma para obter um quadro partidário autêntico e representativo, que não é alcançada porque não temos partidos autênticos e representativos. Não há como reformar o sistema com 28 legendas na Câmara.

Mas o que isso tem a ver com a crise fiscal? O Brasil vive um quadro dramático nas finanças públicas. Municípios e Estados estão estrangulados. O maior endividamento entre os países emergentes, com custo de rolagem crescente, desequilíbrio grave mesmo com a alta carga tributária, a rigidez orçamentária e o baixo nível de investimento. Em 2015, o déficit nominal, que considera todas as despesas operacionais e financeiras, será de mais de 8% do PIB. Ou seja, o governo gasta mais do que tem e terá que buscar na poupança privada mais de R$ 500 bilhões a juros astronômicos para fechar suas contas.

E onde entra o sistema político, partidário e eleitoral? Na incapacidade de gerar respostas efetivas para os graves problemas do país. A fragilidade de nosso sistema político impede a realização das reformas estruturais (tributária, previdenciária, trabalhista, do mercado de trabalho, do Estado).

A crise é gravíssima. O Brasil está imbicado no rumo errado. E, para agravar tudo isso, temos um sistema decisório atrasado capturado pelo patrimonialismo, pelo clientelismo, pelo corporativismo e pela corrupção. Ou tomamos consciência disso rapidamente, ou poderemos perder o “bonde da história”.

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Marcus Pestana é deputado federal (PSDB-MG)

Denis Lerrer Rosenfield - Pérolas

- O Estado de S. Paulo

O governo esmera-se, cada vez mais, em maquiar tudo o que faz, como se todo o desastre produzido por ele mesmo não tivesse existido. Afinal, tudo se deve, evidentemente, a causas externas, à seca e a alguma outra desculpa inepta que encontre pelo caminho. Reconhecer seus erros, jogar no lixo a tal da “nova matriz econômica”, que pôs o Brasil neste buraco, não consta de suas prioridades. Ao contrário, pretende repetir mais do mesmo, em nome de supostos “direitos sociais”, que, na verdade, são simplesmente o seu próprio desejo de se manter no poder.

A encenação tem um único propósito: aumentar impostos. Seu pacote não fez nenhum esforço real de corte dos próprios gastos, estabelecendo prioridades, formulando reformas estruturais, como a previdenciária e a trabalhista. Nada disso, só estabeleceu supostas preliminares para reintroduzir a CPMF.

É sobejamente conhecido tratar-se de um mau tributo, que impregna toda a cadeia produtiva, além de incidir sobre impostos já pagos. É um imposto em cima de impostos, um despropósito, ademais, já rejeitado por parlamentares e pelo vice-presidente semanas atrás. É a crônica de uma derrota anunciada. O argumento de que se trata de uma contribuição “pequenininha”, apresentado pelo ministro da Fazenda, é uma afronta à inteligência dos brasileiros. Melhor teria sido o silêncio e a preservação de sua própria reputação.

A proposta da CPMF apresenta ainda uma artimanha política de monta. Embora o nome inclua o caráter de provisória, os ministros não estabeleceram o tempo de sua duração. Instados por uma jornalista a esclarecer esse ponto, a resposta foi uma pérola: quatro anos. Ou seja, querem com essa contribuição garantir o governo Dilma em sua própria política econômica até o fim, dando-lhe condições financeiras de perseverar em seus erros.

Trata-se de um cheque em branco dado à sua incompetência. Na verdade, seria uma espécie de garantia para a presidente terminar o seu mandato, sem nada alterar de seus fundamentos. Para cobrir tal (des)propósito, tivemos direito a outra pérola, a de que o próximo governo teria um ano da contribuição, podendo, então, renová-la ou não. Fomos tratados como tolos.

Aliás, os dois ministros em suas apresentações aparentaram cansaço e atenderam àquela obrigação com fastio. No caso de Joaquim Levy, que ficou com o maior ônus, era evidente a sua falta de convencimento, como se pressionado pelas circunstâncias. Se não seguisse o ritual, provavelmente teria de deixar o cargo. Já Nelson Barbosa concordava com o que estava fazendo, pois é um dos responsáveis pela tal “nova matriz econômica”, que praticamente quebrou o Brasil.

Ora, o fastio é dos brasileiros, obrigados a seguir essas “orientações” como se fossem naturais, quando, de fato, são fruto de escolhas do atual governo. Os contribuintes estão cansados de tanto engodo.

Outra pérola da apresentação foi a justificativa do ministro Barbosa de que há estudos para uma reforma da Previdência, com grupos de trabalho já constituídos - bem conhecido subterfúgio dos governantes para nada fazerem e nada decidirem, simplesmente transferindo responsabilidades. O rombo da Previdência é conhecido de longa data e está se tornando explosivo. Os 13 anos de governo petista não teriam sido suficientes para tomar uma decisão! No governo Dilma, a bomba foi acionada. O que fez? Nada, ou melhor, criou “comissões para discussão”.

Nesse meio tempo, óbvio, a nova CPMF seria usada para cobrir o rombo da Previdência, que tem como único responsável o governo, que nada fez. Terá o ministro Barbosa descoberto o problema agora? Nada fizeram e agora chamam os contribuintes a arcar com mais esse ônus, causado por sua irresponsabilidade? Os brasileiros estão sendo tratados como idiotas.

O corte dos recursos do Sistema S é mais uma amostra de irresponsabilidade. Trata-se de uma contribuição empresarial que financia seus sindicatos, voltados para o aprimoramento funcional, profissional e técnico de agricultores, trabalhadores e empresários. Seus instrumentos são o Senar, o Sesc e o Senai, além do Sebrae. Essas instituições cumprem muito bem o seu papel e se lhes sobram recursos é porque são bem administradas, ao contrário das governamentais, sempre deficitárias.

E o que faz o governo? Quer transferir esses recursos para si, com o arbítrio que o caracteriza. Em nome de uma suposta “reforma”, o governo procura se apropriar do que não lhe pertence. Tira de quem emprega responsavelmente para tapar seus próprios buracos. Uma irresponsabilidade.

Nesse festival de pérolas, o governo propõe postergar o reajuste do funcionalismo público de janeiro para agosto, além de não realizar concursos no próximo ano. Isso significa que o governo está “cortando” recursos futuros, ou seja, inexistentes. Não se trata de um corte feito na sua atual utilização de recursos, para ele intocável, tal como seguem intocáveis todos os seus “programas”. Um governo que não tem mais recursos não tem como oferecer reajustes nem aumentar seus quadros, por mais justas que possam ser as demandas de recuperação de perdas causadas pela inflação, pela qual, aliás, ele é o único responsável.

Como se não fosse suficiente, a proposta ainda mexe com as emendas parlamentares, produzindo mais conflitos. É como se tivesse uma compulsão incontrolável a criar problemas. Note-se que essas emendas seriam canalizadas para o PAC, isto é, para seus próprios projetos, que ficariam ao abrigo de cortes. Deveriam, portanto, os parlamentares apoiar obrigatoriamente o governo, que procuraria safar-se de suas enrascadas.

Sinceramente, os brasileiros não merecem essas pérolas e esse descaso.

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Professor de filosofia na UFRGS.