O governo está atuando nitidamente em duas frentes para transitar com o mínimo de danos possíveis pelo pantanoso terreno da trajetória financeira da empresa de consultoria do ministro Antônio Palocci: Congresso e imprensa.
É onde identifica que pode haver confusão. Na verdade, mais na imprensa que no Congresso.
Junto ao Legislativo faz o jogo bruto da manipulação dos instrumentos de poder: cobra fidelidade dos aliados, ameaça os infiéis e insinua a todos, correligionários e adversários, aquele tipo de retaliação contida na nota alegadamente involuntária sobre os negócios paralelos de quase 300 parlamentares.
Junto à imprensa faz operação mais sutil nos veículos que lhe parecem ameaçadores, valendo-se das boas amizades, não só do ministro, mas também dos envolvidos no suporte de comunicações que monitora a crise e de pontes anteriormente construídas e solidificadas no trânsito de informações.
Nenhuma ilegalidade ou amoralidade. Apenas um jogo de convencimento.
Antonio Carlos Magalhães dizia que há jornalistas que gostam de dinheiro e jornalistas que gostam de informação. O segredo de uma proveitosa relação, segundo ACM, seria saber distingui-los e principalmente nunca confundi-los.
É uma lição que o poder nunca esquece.
Com o Parlamento controlado e a sociedade anódina, o governo é sensível à evidência de que denúncias hoje só prosperam por meio do trabalho da imprensa, que, no entanto, não pode se substituir a tudo o mais.
Há novas notícias a dar, novos assuntos a serem tratados. Numa situação normal, isso não deveria fazer com que outros setores se mantivessem paralisados, indiferentes a ocorrências ainda não esclarecidas.
Mas, como se esperam sempre "fatos novos", se não há novidades sobre o episódio revelado a tendência é que seja dado como superado por obra e graça da passagem do tempo.
É com isso que Palocci e o Planalto contam: à exceção das que renderam processos, há inúmeros exemplos de denúncias cujo destino foi o esquecimento mediante o arrefecimento do noticiário. Quando não há "fatos novos" nem eleições, o governo faz como aquele notório deputado: se lixa para a opinião pública.
Não havendo agravamento apontado pelos meios de comunicação fica consignada a inexistência de gravidade. Por mais grave que continue sendo o fato original. No momento, a recusa de esclarecimento sobre o cada vez mais suspeito enriquecimento do ministro da Casa Civil.
A deformação não está na ofensiva de defesa do governo. Esta por si só dá nitidez ao quadro: Palocci não pode se defender sozinho pelo método mais simples da comprovação de que não usou de sua condição pública para patrocinar favorecimentos privados. Dele mesmo e de seus clientes.
A distorção reside no conformismo geral diante de uma manifestação de arrogante indiferença por parte do governo e da infantilizada expectativa de que a imprensa assuma o papel de palmatória e faça frente a questões que são da responsabilidade de todos.
Dura Lex. Por mais que haja algumas incongruências no caso do ataque do ex-diretor do FMI Dominique Strauss-Kahn à camareira do hotel em Nova York, há o histórico de comportamento abusivo agora relatado por alguns dos "alvos" ao longo dos anos.
Do ponto de vista da política não é isso que chama atenção no caso e sim o sentido de igualdade presente no cotidiano do tão criticado público americano. A gerência do hotel não hesitou em chamar a polícia diante do relato da funcionária nem se intimidou com a estatura profissional da excelência envolvida.
O que por muita gente é tido como excesso decorrente de mentalidade puritana pode também ser visto como obediência ao preceito de que a lei é igual para todos. Nesses casos os poderosos acabam pagando mais caro porque despertam interesse e seus infortúnios viram notícia.
A tese da conspiração peca entre outros por um detalhe: a polícia só localizou DSK no avião pouco antes da decolagem para Paris porque ele telefonou atrás do celular que havia esquecido no hotel, e informou onde estava.
FONTE O ESTADO DE S. PAULO
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