domingo, 31 de julho de 2011

Nova agenda desafia os velhos partidos - Entrevista

Para antropóloga, debate sobre direitos civis estão "chacoalhando" a ideia de que 56 se faz política dentro das legendas.

Ha algo de novo na política brasileira - e não são os políticos nem os partidos. E uma lenta mas persistente invasão do cenário por assuntos ditos menos votados. Homofobia, racismo, aborto, casamento gay e direitos civis, em geral, "estão obrigando o mundo político a se acostumar com novas demandas do eleitorado", afirma a antropóloga Lilia Schwarcz.

Atenta ao fervilhar desses debates, principal mente em grandes cidades, e ao divorcio entre a rotina dos partidos e o Brasil real, ela adverte: "A ideia de que o único lugar de fazer política é dentro dos partidos esta sendo chacoalhada". E o próprio mundo acadêmico esta consciente disso, como ela constatou ao lançar, com o sociólogo André Botelho, da PUC-Rio, Agenda Brasileira - uma coleção de cerca de SO ensaios, assinados por grandes nomes das universidades, sobre tudo o que vale a pena discutir no Pais.

Como sinal das mudanças, Lilia observa: "Se no passado as ONGs iam atrás dos partidos, em busca de apoio, hoje são estes que vão atrás delas, para falar a públicos influentes". Nesta entrevista, a antropóloga faz uma advertência sobre o autoritarismo nos debates. "Não poder falar das diferenças e uma forma de fascismo."

Por que os direitos civis e temas sociais tem hoje mais espaço nos debates?

Vejo como um ciclo. A ditadura já passou há tempos. Hoje os brasileiros podem votar e exercer seus direitos. Os anos 90 foram para arrumar a casa. Enfim, a agenda "mais seria" foi cumprida e agora outra agenda vem à tona. E isso coincide com um ambiente em que as comunicações ficaram mais fáceis. Cada dia mais, a sociedade civil esta exigindo espaço para demandas que lhe interessam mais diretamente.

Para onde isso aponta?


Assuntos como aborto, casamento gay, racismo e violência sempre foram temas políticos, mas nos os tratamos de forma subalterna. Ultimamente, eles ganharam força e dão a cara desse Brasil real. 0 barulho em torno do kit-homofobia é um exemplo, a questão do racismo e outro, e este tem como pano de fundo questões mais amplas, como exclusão e desigualdade social. Na questão de gênero, os homossexuais, o movimento LGBT, o que quiserem chamar, muitos políticos já entenderam: terão de prestar atenção e tomar posição, pois cada vez mais serão cobrados pelos seus eleitores.

Já se viu um pouco disso na campanha de 2010, não?

Sim, mas foi uma coisa odiosa aquele debate na TV entre Dilma Rousseff e José Serra sobre aborto. Podiam ter aproveitado para discutir uma questão substantiva. O que cada um fez? Tentou garantir seu eleitorado. Vestiram a carapuça tradicional.

Os partidos não dão sinal de que vão mudar para se adaptar a isso. Como vai ficar?

Na Europa, principalmente nos países nórdicos, já existe um modelo mais fluido de relações entre partidos e organizações sociais. Por aqui, a ideia de que o único lugar de fazer política e dentro dos partidos já está sendo chacoalhada. A política vai se deparar cada vez mais com a explicitação dos conflitos. E evidente que os movimentos por direitos civis tem tido mais espaço e isso não tem volta. Hoje, os partidos e que correm atrás das ONGs, para se associar a causas que estão crescendo.

Esse debate social não lhe parece prejudicado pelo politicamente correto?

Essa ideologia do politicamente correto e uma das piores cegueiras que se abateram sobre nos. Ela não permite expor as diferenças em um dialogo normal. Por exemplo, neste Pais ninguém e de direita ... Como ensinava Claude Levi-Strauss, e preciso diferenciar sem hierarquizar. 0 fato e que o empenho de alguns em combater pré conceitos os leva a criar outro, que e dizer "somos todos iguais". Não somos. E ainda bem que não somos. Você não poder falar das diferenças e uma forma de fascismo. Agindo dessa forma, você não produz conhecimento, não produz conscientização, não produz cidadania.

Quem é?

Doutora em Antropologia Social e professora da USP e da Universidade de Princeton (EUA). Especializada em relações raciais, e autora de Raça e Diversidade e As Barbas do Imperador - D. Pedro II, um Monarca nos Trópicos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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