O Supremo Tribunal Federal (STF) vai decidir amanhã se cabe à própria Corte, e não à Câmara, decretar a perda de mandato dos três deputados condenados no julgamento do mensalão. Com o placar em quatro votos a quatro, Celso de Mello vai desempatar e já indicou que votará pela cassação.
Ontem, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), afirmou que a Casa poderá não cumprir a ordem do STF: "Pode não se cumprir a medida tomada pelo STF. Isso não é desobedecer ao STF. É obedecer à Constituição."
A caminho da cassação
Com empate em 4 a 4, Celso de Mello decidirá se parlamentares devem perder o mandato
André de Souza, Carolina Brígido
Supremo. Os ministros Lewandowski, revisor do mensalão, e Toffoli conversam durante o julgamento: os dois entendem que a cassação de mandato caberia à Câmara
UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA
BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) caminha para decidir amanhã que cabe à própria Corte, e não à Câmara, decretar a perda de mandato dos três deputados condenados pelo mensalão. Após dois dias de discussão, o placar ficou em quatro votos a quatro. Celso de Mello vai desempatar a votação. Ao longo dos debates, já indicou que a última palavra é do STF, como defendeu o relator do processo e presidente do tribunal, Joaquim Barbosa. Estão com o mandato ameaçado João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT). O entendimento do Supremo será oposto ao do presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), para quem a Constituição determina que a palavra final é do Poder Legislativo.
Para o revisor do processo, Ricardo Lewandowski, Maia está correto. O revisor entende que a cassação de mandato é um assunto político e, por isso, a decisão caberia à Câmara. Relator e revisor votaram na semana passada.
Ontem, o julgamento foi retomado com o voto da ministra Rosa Weber, que acompanhou Lewandowski. Segundo ela, emenda feita em 1996 ao Código Penal estabelece que a perda de mandato é um efeito automático da condenação. A Constituição, por outro lado, estipula que a cassação precisa passar pela Câmara. Assim, entre os dois textos, deve prevalecer a Constituição, a lei maior do país. Rosa destacou que a primazia de decidir sobre o mandato é do povo, por meio de seus representantes eleitos.
- Tratando-se de cassação de mandato, a competência é do mandante, daquele que o investiu. Não cabe, na minha compreensão, ao Poder Judiciário fazê-lo, porque a disposição do mandato é exclusiva dos eleitores, que se manifestam, decidem por meio de seus representantes eleitos - afirmou Rosa Weber.
Em seguida, votou o ministro Luiz Fux, que seguiu Joaquim. Ele citou a Lei da Ficha Limpa, que surgiu a partir de um projeto de iniciativa popular, para rebater os argumentos contrários.
- Será que esse movimento popular que fez surgir a Lei da Ficha Limpa entende que é legítima a concessão de uma autorização para que os parlamentares possam praticar os seus atos contrários à lei e, ainda assim, manter a higidez da representatividade popular? Eu entendo que absolutamente não é possível - disse Fux.
Dias Toffoli votou com o revisor. Ele também destacou a representatividade popular do parlamentar para justificar sua posição.
Após o voto de Toffoli, ocorreu intensa discussão. Foi quando Celso de Mello, já deixando seu voto à mostra, defendeu o poder do Supremo para determinar a perda do mandato.
- O Congresso Nacional não pode interferir nos efeitos que resultam de uma condenação penal transitada em julgado proferida no Supremo Tribunal Federal. Mas também não pode intrometer nas consequências dos efeitos extrapenais. E os efeitos extrapenais, nos termos da própria Constituição, é a privação da cidadania, é a suspensão dos direitos políticos - destacou o ministro, em resposta aos argumentos do revisor.
Joaquim também se manifestou:
- Causa-me espécie e desconforto a perspectiva de dizermos ao Congresso Nacional que uma pessoa condenada à privação de liberdade por dez, 14 anos possa exercer o mandato - acrescentou o relator.
A ministra Cármen Lúcia acompanhou Lewandowski. Ela afirmou que todos concordam que a condenação é incongruente com o exercício parlamentar, mas frisou que a cabe ao Congresso decidir pela perda do mandato. Ela também disse que o STF deve esperar responsabilidade da Câmara para que haja a cassação.
- Nem acho nem me parece que vá deixar de acontecer (a cassação), em que pese teoricamente até poder (ocorrer). Mas acho que, num sistema de uma República na qual um de seus esteios é a legalidade e outro é a responsabilidade, há de se esperar responsabilidade de todos os Poderes, como esperam de nós e nós estamos cumprindo - avaliou Cármen Lúcia.
Para Gilmar Mendes, que concordou com o relator, seria uma incongruência a Lei da Ficha Limpa impedir a candidatura de políticos condenados mesmo sem sentença definitiva; e o STF permitir que condenados definitivamente em ação penal continuem a exercer o mandato.
- A Lei da Ficha Limpa impede que o sujeito excluído da OAB, ou que teve contas rejeitadas, ou que teve sentença condenatória proferida por colegiado possa ser candidato; mas condenado em processo penal no Supremo manteria o mandato - argumentou.
Ele ainda ressaltou a incompatibilidade de um preso exercer atividade parlamentar.
- Se há algo que se pressupõe no exercício do mandato é a ideia de liberdade. Nós temos um deputado preso com trânsito em julgado. Veja tamanha incongruência em casos desse tipo - completou Gilmar Mendes.
Fonte: O Globo
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