Clima eleitoral pode envenenar a política econômica, que opera com remendos e fogos de artifício
Em 2013, a economia brasileira teve mais um ano decepcionante em termos de crescimento, pressagiando que os quatro anos da administração Dilma Rousseff (2011-2014) deverão se caracterizar como um período de estagnação econômica. Várias são as causas para esse mau desempenho da nossa economia, mas a inépcia da própria política econômica sobressai-se como uma das principais responsáveis pelo marasmo que atingiu o Brasil a partir de 2011.
Os desafios impostos pela conjuntura econômica internacional serão maiores no ano que se inicia. A mudança de sinal da política monetária americana continuará afetando os fluxos internacionais de capitais e tornando os investidores mais cautelosos em relação às economias emergentes. Num contexto como esse, a qualidade das políticas domésticas se mostra mais fundamental ainda para condicionar a trajetória de crescimento no curto e no médio prazo.
O ano novo pode trazer uma correção de rumos na política econômica doméstica, mas também pode ser um ano de redobradas apostas nas políticas equivocadas que estão contribuindo para o baixo crescimento da economia e ameaçando as conquistas obtidas a partir da estabilização monetária e das reformas macroeconômicas dos anos 1990. Desse modo, estamos diante de uma encruzilhada em que a escolha do caminho será definidora das chances do crescimento do país nos próximos anos.
Nas urnas, em 2014, os brasileiros terão a oportunidade de escolher seus governantes pelos próximos quatro anos. A disputa eleitoral representa uma boa oportunidade para discussão das opções de política econômica que se encontram diante de nós. Ocorre que o baixo crescimento econômico dos últimos anos parece ainda não sensibilizar os eleitores, já que as condições do mercado de trabalho se mantêm relativamente favoráveis, embora o ritmo de criação de empregos tenha declinado no ano passado. No entanto, a continuidade do marasmo na economia, agravado por uma inflação teimosamente acima da meta de inflação, fatalmente trará prejuízos mais sérios ao emprego ao longo do tempo.
Numa situação como essa, existe o risco de considerações eleitoreiras nortearem as decisões do governo em 2014. Infelizmente há sinais preocupantes apontando nessa direção, como a política adotada para as tarifas públicas no ano passado e o afrouxamento do controle do endividamento dos Estados e municípios. A julgar pelo que se viu até agora, parece pouco provável que o governo se dedique em 2014 à correção dos equívocos cometidos na política econômica, o que pode levar a uma estratégia de transferir os ônus do ajuste todos para 2015, quando teríamos que "pagar a conta", apresentada sob forma de juros e impostos mais elevados e, possivelmente, inflação também mais alta, pela necessidade de recomposição dos preços administrados.
Entretanto, o agravamento das condições de mercado pode forçar o governo a iniciar a correção de rumos na política econômica ainda em 2014. Na área fiscal, o risco iminente de rebaixamento da classificação de risco do país pode induzir ao abandono de práticas contábeis heterodoxas para fechar as contas públicas e à volta das boas práticas de gestão fiscal responsável, a fim de elevar o superávit primário para patamares mais condizentes com a manutenção da solvabilidade da dívida pública nos próximos anos. Por sua vez, na área monetária, as expectativas de inflação próximas a 6% clamam por uma ação mais decisiva do Banco Central que poderia optar por uma instância mais conservadora na política monetária em 2014, com vistas a buscar a convergência das expectativas de inflação para 4,5% num prazo razoável.
Tais mudanças, se realizadas, representariam o abandono da visão dominante nos últimos anos de que o crescimento econômico seria fundamentalmente resultado dos estímulos ao crescimento da demanda agregada. Com isso, abrir-se-ia espaço para maior ênfase em políticas direcionadas para o crescimento sustentável da economia que exige elevação da taxa de investimentos e a aceleração do crescimento da produtividade dos fatores de produção. A condução recente do programa de concessões parece indicar o reconhecimento por parte do governo da necessidade de atacar o problema dos gargalos na oferta, mas ainda é muito pouco diante das dificuldades do ambiente de negócios no Brasil.
Parece óbvio o esgotamento do modelo de crescimento baseado no indiscriminado uso de estímulos à demanda agregada e no intervencionismo excessivo do governo da economia. O ano novo traz uma oportunidade para uma mudança qualitativa na política econômica, que deveria voltar a se basear nos pilares da responsabilidade fiscal e monetária e na consecução de reformas macro e microeconômicas que substituiriam, com enormes vantagens, o ativo e imprevisível intervencionismo setorial que vem caracterizando até aqui a gestão da presidente Dilma. Contudo, o clima eleitoral de 2014 pode envenenar a política econômica que continuaria a operar através de remendos e fogos de artifício até o próximo réveillon. A correção, então, custaria muito mais caro ao país.
Gustavo Loyola, doutor em economia pela EPGE/FGV, foi presidente do Banco Central
Fonte: Valor Econômico
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