• Na primeira manifestação pública após os protestos de domingo, a presidente defendeu a política econômica de seu primeiro mandato ao relacioná-la à proteção do emprego e da renda e diz estar disposta a conversar ‘com todas as matizes’
Tânia Monteiro, Rafael Moraes Moura e Ricardo Della Coletta - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - Um dia após os protestos contra o governo pelo País, a presidente Dilma Rousseff procurou nesta segunda-feira, 16, desfazer a imagem de isolamento e se disse disposta ao diálogo “com quem quer abrir diálogo”. Ao defender a aprovação do ajuste fiscal e reconhecer “algum erro de dosagem” da política econômica, Dilma justificou as medidas tomadas no primeiro mandato e rebateu quem tenta colar a corrupção a seu governo. “Ela não só é uma senhora bastante idosa neste País como ela não poupa ninguém.”
O governo aposta no pacote contra a corrupção para amenizar a crise política. Antes da entrevista, ao sancionar o Código de Processo Civil, Dilma havia destacado o caráter “democrático” e “pacífico” dos protestos e afirmou que o País está “impermeável ao golpismo e ao retrocesso”.
A ênfase no “diálogo” – palavra repetida 12 vezes nesta segunda – tem base em pesquisas de opinião. Mas é preciso mais: voltou a ocorrer panelaço em bairros nobres de São Paulo, Rio, Brasília e Belo Horizonte quando o Jornal Nacional, da TV Globo, exibiu as declarações de Dilma.
Manifestações. Tenho certeza que o que queremos é um lugar em que todos possam exercer seus direitos pacificamente, sem ameaças, desrespeitos às liberdades civis e às liberdades políticas. Um País que, amparado na separação, independência e harmonia dos poderes, na democracia representativa, na livre manifestação popular nas ruas e nas urnas, se torna mais impermeável ao preconceito, à intolerância, à violência, ao golpismo e ao retrocesso. A credibilidade das instituições e a preservação das regras da democracia são os melhores antídotos contra a corrupção, a intolerância e a violência. É com a democracia que se vencerá o ódio, que se combaterá corruptores e corrompidos. Nós respeitamos as ruas, um dos legítimos espaços de manifestação popular, pacífica e sem violência. Respeitamos e ouvimos com atenção todas as vozes, de todos os matizes, de todas as tendências. Por isso o governo sempre irá dialogar com as manifestações. Ouvir é a palavra, dialogar é a ação. O sentimento tem de ser de humildade e firmeza.
Erros. Se cometemos algum erro de dosagem (da política econômica), é possível que a gente possa até ter cometido algum. Agora, qual foi o erro de dosagem que cometemos? Gostaríamos muito que houvesse uma melhora econômica de emprego e renda. Tem gente que acha que a gente tinha de ter deixado algumas empresas quebrarem e os trabalhadores se desempregarem. Eu tendo a achar que isso era um custo muito grande para o País. É possível discutir se podia ser um pouco mais ou um pouco menos. Mas isso não explica por que estamos nessa situação. O que explica é um fato constatado: a economia não reagiu. Ninguém pode negar que fizemos de tudo para a economia reagir.
Podem falar: era melhor deixar quebrar. Eu não acredito nisso. Em qualquer atividade humana se cometem erros. Longe do meu governo achar que não cometeu erro nenhum. Agora, o que eu não posso concordar é aceitar ser responsabilizada por algo que seria pior se deixássemos. Nós seguramos – comparando com o resto do mundo – os 20 milhões a mais de emprego.
Humildade. Atitude de humildade é pelo seguinte: você só pode abrir diálogo com quem quer abrir diálogo. Com quem não quer não tem como. Procurarei ter diálogo com seja quem for, é uma atitude de abertura. Eu não estou aqui fazendo nenhuma confissão, isso aqui não é um palco de confissão, é uma entrevista. Se alguém achar que eu não fui humilde em algum diálogo, me diz qual e vou tomar providência para mudar.
Corrupção. A corrupção não nasceu hoje, ela não só é uma senhora bastante idosa neste País, como ela não poupa ninguém, pode estar em tudo quanto é área, inclusive no setor privado. Vamos lembrar o que ocorreu em 2008-2009, quando pelo menos uma das questões foi fraude bancária. O dinheiro tem esse poder corruptor, temos de ter vigilância, instituições, legislação pra impedir que ocorra. Não vamos achar que tem qualquer segmento acima de qualquer suspeita. Isso não existe. E acho mais: o combate a corrupção começa através de um processo educacional. O fato de você não querer ganhar vantagem em tudo, de você valorizar o trabalho, a pessoa que conquistou as coisas com seu próprio valor.
Ajuste fiscal. O ajuste é essencial para o País. O governo vai lutar pelas correções e pelos ajustes. Vamos fazer esse esforço ao longo deste ano. Mas o Brasil tem todas as condições de sair em menos tempo do que em qualquer outra circunstância. O quanto pior melhor é algo que não se pode aceitar. Vamos brigar depois. Agora vamos fazer para o bem do Brasil tudo aquilo que deve ser feito.
PMDB. Longe de nós querer isolar o PMDB. Pelo contrário, o vice-presidente é o companheiro Michel Temer, extremamente solidário. Temos uma parceria com o PMDB, o PMDB participa do governo. Agora, nós temos uma situação que temos de construir também. Ninguém aqui pode achar que as instituições políticas do País estão à altura das necessidades do País. Não estão. E aí vale para todos os partidos. Estou falando de governabilidade, da forma pela qual se relaciona um partido na presidência da República com outros partidos. Em qualquer democracia, o diálogo é essencial. Se você instabiliza um país sempre que lhe interessa, uma hora essa instabilidade passa a ser algo que ameaça a todos, é a pior situação que tem.
Congresso. O Congresso não tem sido adverso para o governo. Sempre que compreenderam, sempre que foi debatido antes, o Congresso foi bastante sensível. Não vejo um embate. O que é mais atraente é a crise do que a não crise. Então muitas vezes se coloca crise onde não tem. Agora, tem dificuldades, e vai ter. (Mas) Não acredito que no caso do pacote anti-impunidade vai ter dificuldade.
Denúncia contra Vaccari. Esses acontecimentos mostram que são infundadas todas as teorias de que o governo interferiu sobre o Ministério Público, ou sobre quem quer que seja, para investigar ou fazer qualquer coisa com quem quer que seja. Tanto é assim que, isso acontece, o governo continua. Se querem investigar, vão investigar; quem for responsável pagará pelo que fez.
Reforma política. Reitero minha convicção de que a conjuntura aponta para uma necessidade urgente de uma ampla reforma política. Sei que o protagonista desta reforma é toda a população brasileira, mas também sei que o espaço adequado para ela é o Congresso.
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