Márcio Falcão, Gabriel Mascarenhas, Isabel Fleck, Ranier Bragon, Marina Dias, Debora Álvares e Rubens Valente – Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - Com os partidos abandonando a base aliada e a pressão cada vez maior pelo impeachment, o governo decidiu recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal) para barrar o avanço do processo na Câmara, mas acabou derrotado na tentativa de adiar a sessão ealterar o rito de votação.
Por 8 votos, o STF rejeitou o pedido da AGU (Advocacia-Geral da União) e de deputados do PT para suspender a votação do processo, marcada para domingo (17).
O governo alegava que a sessão não deveria ser realizada porque o relatório da comissão especial da Câmara que discutiu o afastamento da petista e recomenda o recebimento da denúncia por crime de responsabilidade teria ultrapassada o teor das acusações, citando questões estranhas, como delação da Lava Jato, e, portanto, ferindo o amplo direito de defesa.
Os ministros entenderam, no entanto, que cabe plenário da Câmara analisar adenúncia original e não o relatório da comissão. Portanto, os deputados devem avaliar suspeitas de crime de responsabilidade, relacionados às chamadas pedaladas fiscais e aos decretos que ampliaram os gastos federais em R$ 3 bilhões, sem considerar Lava Jato.
Outro argumento é que o Supremo conferiu maior poder ao Senado, que decidirá se abre ou não o processo e se a presidente será afastada, quando poderá ser feita a ampla defesa de Dilma.
Para os ministros, não houve irregularidade na fase inicial do processo. Votaram para negar a liminar (decisão provisória) para cancelar a sessão: os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber, Teori Zavascki, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes.
Relator do caso, Fachin defendeu que a denúncia original é que vai ser analisada pelo plenário da Câmara e não exatamente o relatório da comissão especial, que é questionado pelo Supremo.
"No que diz respeito a imputações do teor da denúncia como originalmente chegou é o mesmo teor inicial. Não se sustenta inviabilização da defesa inadequada. Tendo como baliza o voto majoritário [na fixação do rito do impeachment em dezembro], não constato vícios alegados e não há que se falar em nulidade do parecer",
"Para não se transformar alegações de nulidade em fetichismo, que se demonstre o efetivo prejuízo no cerceamento de defesa. Não vi demonstração de prejuízo efeitvo por eventuais inconsistências", afirmou Teori Zavascki.
Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo, divergiram da maioria. Marco Aurélio propôs a concessão de uma liminar para estabelecer que a Câmara só possa analisar a denúncia original sobre as questões fiscais.
O presidente do STF afirmou que houve claro cerceamento de defesa e votou por uma liminar para retirar do parecer temas estranhos à denúncia original.
Ordem da votação
Numa sessão longa de mais de seis horas e marcada às pressas, o STF também validou uma norma do regimento interno da Câmara utilizada por Cunha que prevê a votação do processo de impeachment de Dilma começando por deputados do Norte para o Sul, de forma intercalada.
Ficou estabelecido ainda que a chamada dos parlamentares será feita pela bancada de cada Estado, alternando uma do Norte e uma do Sul.
A metodologia de votação que foi decidida por Cunha num primeiro momento acabou alterada, após a questão chegar ao Supremo.
A ordem da votação importa porque o placar parcial no domingo pode representar uma pressão de última hora sobre os ainda indecisos.
Para os governistas, o modelo adotado por Cunha tem por objetivo criar uma "onda" favorável ao impeachment durante o início da votação, já que, pelo sistema proposto pelo peemedebista, a maioria dos parlamentares que votarão primeiro tendem a ser contrários ao governo. O governo preferia ordem alfabética ou chamada individual, sendo um do Norte e um do Sul.
Ações
A discussão sobre o impeachment chegou ao STF por ações apresentadas pela AGU e deputados governistas, sendo que a principal delas pede a suspensão do processo de impeachment.
Horas após receber os processos, o Supremo cancelou a sessão da tarde, quando os ministros foram para os gabinetes estudar o caso, e decidiu-se realizar uma sessão extra para analisar cinco recursos.
O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, argumenta que a Comissão Especial que aprovou a abertura do processo levou em consideração temas que não têm relação com a denúncia, como delação do senador Delcídio Amaral (ex-PT-MS) na Lava Jato.
"A ampliação do objeto (da denúncia) fere de morte esse processo. De quais os fatos está sendo acusada a presidente? Só os da denúncia? Nós defendemos. Se são outros, está se discutindo fatos para os quais não fui chamado a defender", explicou Cardozo.
A AGU sustenta que o colegiado formado pelos deputados tinha de se debruçar apenas sobre as suspeitas de crime de responsabilidade, relacionados às chamadas pedaladas fiscais e aos decretos que ampliaram os gastos federais em R$ 3 bilhões. Essa questão não havia sido analisada pelo tribunal até a conclusão desta edição.
Entre os auxiliares da presidente Dilma havia uma dúvida se valeria a pena entrar com as ações antes da votação do impeachment já que uma resposta negativa do STF aos pedidos pode ter influência no domingo.
Ao rejeitar dois mandados de segurança e um pedido de liminar que tratavam da votação do impeachment, parte dos ministros atacou a judicialização e a interferência no Legislativo.
"Não vamos agora ditar regras como deve se comportar o parlamentar. Como deve ser a norma regimental. Isso representa antítese à cláusula pétrea dos Poderes", disse o ministro Luiz Fux.
Para Gilmar Mendes, "a titular do cargo não tem mais condições de ser presidente. (...) Para jogador ruim, até as pernas atrapalham".
Outros ministros defenderam que, devido à gravidade do caso, o STF tem que interferir. O presidente do Supremo fez um discurso duro sobre o papel da corte no impeachment. Ele frisou que, apesar de não serem eleitos, os integrantes da STF têm legitimidade para "rever" atos dos outros poderes da República.
Ele acrescentou ainda mesmo atos políticos, como um processo de impeachment, pode ser revisado pelo Judiciário.
"Embora não tenham sido eleitos pelo povo, juízes têm legitimidade nacional. Como juiz da Suprema Corte, tenho legitimidade, sim para rever atos do Poder Legislativo e do Poder Judiciário", afirmou o presidente do STF.
Ao longo do julgamento, Lewandowski fez várias interferências nos votos dos colegas e também defendeu espaço para que Cardozo pudesse se manifestar na sessão, o que acabou rejeitado pelo plenário.
Mudança
Cunha definiu que a votação do impeachment seguiria a ordem Norte-Sul, alternada por Estados, mas deixou a região Nordeste, onde Dilma Rousseff tem mais apoio, por último.
Pela nova ordem, o primeiro Estado a votar será Roraima, seguido do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Dentro dos Estados, a ordem de votação dos deputados será a alfabética.
Quando se esgotarem os três Estados do Sul, Cunha pretende seguir alternando os Estados do Norte com os do Centro-Oeste, e depois com os do Sudeste. Os Estados do Nordeste entrariam por último.
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