“Diante desse cenário, embora a composição dos quadros governamentais revele opções erráticas que prometem ser fontes de problemas futuros, além das óbvias dificuldades para um governo que pretende realizar reformas dependentes de uma sólida base congressual com que não conta, o horizonte que agora se entrevê é de céu de brigadeiro para o início do seu mandato. No mais, as forças sociais e políticas que já se opõem a ele, esfaceladas e desarvoradas como se encontram, não devem, ao menos de imediato, significar obstáculos efetivos para a realização dos seus propósitos, e com todas as devidas vênias, não será um centro radical, esse espécime que não se vê desde a Revolução Francesa sob o consulado de Napoleão Bonaparte, que fará as vezes de uma oposição robusta.
Uma imagem trazida dos atletas do surf que praticam sua modalidade em ondas grandes talvez seja inspiradora para a oposição. Ondas grandes em geral vêm em série, um desequilíbrio do atleta que nelas se aventura pode ser-lhe fatal, em caldos sucessivos que não lhe permitam a respiração, mantendo-o preso ao remoinho das águas que o impeçam de voltar à superfície. Em cuidado com esses riscos, seus praticantes fazem exercícios de apneia, com que se preparam para o pior em suas evoluções.
Isso que aí está, aqui e alhures, é, sem dúvida, uma Praia da Nazaré com suas medonhas ondas grandes. Não se vai enfrentá-las sem treinamento adequado e sem lideranças de tirocínio comprovado, senão o caldo é certo, como o do AI-5, de infausta memória, há 50 anos. As lideranças se farão no caminho. E o caminho, adverte o poeta, se faz ao andar.”
*Sociólogo, PUC-Rio. ‘As ondas grandes e a oposição’, O Estado de S. Paulo, 6/1/2019
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